"Medicina não se faz só com técnica": a importância do vínculo entre paciente, médico e hospital

Da medicina integrativa ao atendimento humanizado, alternativas tornam o tratamento de pacientes uma mistura de técnica com sensibilidade

Em 13 de maio de 1992, o papa São João Paulo II instituiu a data da celebração da memória de Nossa Senhora de Lourdes como o Dia Mundial do Enfermo (11 de fevereiro), uma data que traz à tona discussões sobre saúde e tratamento de pessoas. O Brasil também possui uma data semelhante: o Dia Nacional do Enfermo—que é comemorado no dia 12 de janeiro. Ambas as datas lançam um convite aos profissionais e familiares para a construção de um olhar sensível para quem está doente e para a oferta de um tipo de ajuda que vai além da procedimental.

Com o início da pandemia de Covid-19, a reflexão sobre doenças, métodos e curas abriu um leque de possibilidades para que mais pessoas pudessem falar sobre enfermidades, sobretudo nas redes sociais. "Nesse momento de pandemia é muito importante nós percebermos a necessidade de nos cuidarmos e de cuidarmos uns dos outros. Do ponto de vista de você usar máscara e se vacinar, isso é algo que vale para o individual e para o coletivo", diz Paola Tôrres, médica onco-hematologista, professora e presidente do Instituto Roda da Vida.

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Paola trabalha com um tipo de medicina chamada integrativa, que une práticas médicas a outros tipos de abordagem terapêutica em tratamentos, como meditação, técnicas de respiração, yoga e outros. Além disso, a medicina integrativa vê o paciente em sua completude e subjetividade, fazendo com que os profissionais que o acompanham o entendam e sugiram atividades que vão de encontro as suas necessidades.

"Como professora de medicina e médica, dediquei toda a minha carreira à tentativa de contribuir para que o atendimento médico seja cada vez melhor. O meu trabalho, em contato com os estudantes de medicina, é oferecer a eles uma visão mais ampla do ser humano, algo transdisciplinar. Não só do ser humano, mas também do sistema de saúde como um todo", narra a profissional.

Apesar das boas intenções e da alta demanda, a medicina integrativa ainda não é amplamente difundida no Brasil. Em São Paulo, a escola de medicina integrativa, formação do hospital Albert Einstein, é uma das poucas referências da especialidade.

No Ceará, existem apenas iniciativas isoladas. O próprio Instituto Roda da Vida, do qual Paola é presidente, já tenta por em prática—em parceria com a Universidade Federal do Ceará (UFC) e com a Universidade de Fortaleza (Unifor)— uma formação para profissionais de saúde em medicina integrativa. "É muito raro o paciente que quer apenas um atendimento pontual, a maioria das pessoas necessita ser cuidada como seres humanos. Ter profissionais que saibam abordar esse viés dessa forma é urgente", argumenta Tôrres.

Atendimento Humanizado em hospitais estaduais

 

No Ceará, hospitais como o São José de Doenças Infecciosas (HSJ) é uma das unidades públicas que trabalha de forma mais focada o atendimento humanizado aos seus pacientes. Edson Buhamra, médico infectologista e diretor geral da unidade, comenta que incentiva esse tipo de tratamento aos colaboradores por meio de atos amigáveis. "É uma parceria, um vínculo que se cria entre a instituição, o médico e o paciente. O nosso público sempre foi um público muito carente, então nós tentamos assimilar a dinâmica da complexidade do doente que nos procura", explica.

Com o surgimento do vírus HIV—que causa a Aids—explica o médico, o perfil das pessoas que começaram a procurar a unidade foi alterado. Indivíduos em situação de rua, dependentes químicos e outras pessoas que vivenciavam problemas sociais graves alteraram a dinâmica do hospital. Algo que, conforme o diretor-geral, fez com que os funcionários tentassem entender as realidades diversas. "Medicina não se faz só com técnica, medicina se faz com com várias coisas: uma boa cama, um bom lençol, um bom alimento, um serviço social que tenha um ouvido atento ou mesmo um documento que o paciente não tem e que a gente resolve ajudar ele a tirar", diz Edson.

"Essas datas que funcionam como um chamamento para que nós falemos de doenças são sempre boas porque as pessoas precisam entender que, durante a vida, nós adoecemos. A doença faz parte da vida. Quando isso acontece, ninguém pode ser excluído porque está doente" Edson Buhamra, médico infectologista e diretor-geral do Hospital São José

E o atendimento humanizado do hospital vem dando bons frutos, algo que pode ser atestado pelo ator e escritor Rhamon Matarazzo, 34. Usuário do hospital desde 2009, ele conta como o atendimento do local consegue ir além do básico. "O hospital abraça as pessoas de uma forma que você consegue até mesmo manifestar a sua indignação caso algum serviço não seja prestado da forma que deveria estar sendo prestado. Eles possuem uma lista de valores éticos que fica colada na porta do hospital, e todos esses valores são muito bem cumpridos", conta.


Estigma sob status de saúde

 

Rhamon fala sobre o estigma que as pessoas possuem com certas doenças e sobre como isso afeta negativamente a vida de indivíduos que convivem com certas enfermidades. Por meio de seu livro "Rhamon com H", ele fala sobre seu status sorológico e sobre o momento em que ele resolveu o expor. "Algumas pessoas têm vergonha de se tratar com remédios, parece que é vexatório. Eu não, eu já me abri sobre a minha condição sorológica. Passei 8 anos sem conseguir falar sobre isso e agora estou tranquilo, mas entendo que tem muita gente que ainda não está no seu tempo", diz.

"Eu acredito que o atendimento humanizado do Hospital São José nos ajude a nos libertar dessa morte social que o HIV legou desde os anos 80. A partir dali, surgiu um espectro de preconceito em cima da comunidade LGBT+, em que as pessoas associam o HIV a ser gay. É muito bom você criar uma força a partir de profissionais de saúde que fazem parte de um hospital que se considera uma comunidade." Rhamon Matarazzo, ator, escritor e produtor teatral

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