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Pitt Hopkins: saiba o que é a doença rara com mil casos descritos no mundo e lembrada hoje

No Brasil, são 27 casos. Segundo a geneticista Denise Carvalho, o Estado do Ceará tem alta incidência de doenças raras por dois motivos principais: pelo perfil deste tipo de doença que acomete vários sistemas e pelo alto índice de consanguinidade (casamento entre parentes)
13:29 | Set. 18, 2020
Autor Gabriela Feitosa
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Gabriela Feitosa Estagiária do O POVO Online
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Tipo Notícia

Dentes espaçados, um palato (céu da boca) largo e raso, lábios grossos, olhos encovados, narinas largas e orelhas com hélices alargadas. Esses são os principais sintomas da síndrome de Pitt-Hopkins (PHS), doença rara que tem o dia 18 de setembro como data de conscientização. Ela integra um grupo maior denominado como doenças raras, caracterizadas por serem crônicas, progressivas e incapacitantes, podendo ser degenerativas e também levar à morte, afetando a qualidade de vida das pessoas e de suas famílias - segundo Ministério da Saúde.

É considerada rara a doença que afeta até 65 pessoas em cada 100 milindivíduos ou 1,3 pessoas para cada dois mil indivíduos. Ainda conforme Ministério da Saúde, o número exato de doenças raras não é conhecido, mas se estima que existam de 6 mil a 8 mil tipos diferentes de doenças raras em todo o mundo. Segundo a geneticista Denise Carvalho de Andrade, que trabalha no Hospital Universitário Walter Cantidio (HUWC), um dos centros de tratamento de Doenças Raras no Estado, o Ceará tem uma alta incidência das condições. "Isso acontece por dois motivos principais: 1) pelo perfil deste tipo de doença que acomete vários sistemas e 2) pelo alto índice de consanguinidade, ou seja, casamento entre parentes", explica Carvalho.

Pitt Hopkins

Existem cerca de mil casos de Pitt Hopkins descritos no mundo, segundo o site Pitt Hopikins Brasil. No Brasil, são 27. Segundo Denise, essa doença rara se diferencia das outras por ser caracterizada pela deficiência intelectual, dismorfismos faciais e alterações respiratórias. Os principais sintomas se manifestam no rosto, como dentes espaçados, céu da boca largo e raso, lábios grossos, olhos encovados, narinas largas e orelhas com hélices alargadas. Os distúrbios psicomotores são precoces e graves. Uma pessoa com a síndrome pode apresentar andar instável e adquirir tardiamente ausência de linguagem. Refluxo gastro-esofágico são comuns; Microcefalia, atraso do crescimento pós-natal e convulsões graves também são frequentes. Os problemas respiratórios podem aparecer durante a infância ou adolescência e ocorrem apenas quando o doente está acordado. São caracterizadas por crises de hiperventilação, muitas vezes seguidas de apnéia e cianose.

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Em Fortaleza, o acompanhamento é feito em Centros de Referência em Doenças Raras como no Hospital Universitário Walter Cantidio (HUWC) e Hospital Geral de Fortaleza (HGF). Sobre a gravidade da doença, a geneticista Denise afirmou que há uma certa variedade na apresentação dos casos, mas a gravidade estará relacionada às complicações de base da síndrome apresentada em cada paciente, como por exemplo as convulsões graves, "que quando de difícil controle podem comprometer mais ainda o desenvolvimento cognitivo".

"Temos muita esperança agora com o advento dos Centros de Referência de Doenças Raras, onde estas doenças agora podem ser reconhecidas e diagnosticadas devidamente e acompanhadas por equipe multidisciplinar compostas de geneticista, neuropediatra, endocrinologista, fisioterapeuta, psicólogo", relata Denise. A médica ainda disse que com uma grande equipe multidisciplinar, a perspectiva terapêutica de tratamentos gênicos está virando realidade.

Um desses casos é o da jovem Alice, de 19 anos. A mãe da menina, Fabiana Farah, que é membro da comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Doenças Raras, contou ao O POVO que começou a desconfiar da saúde da filha quando ela ainda tinha cinco meses. Ela percebeu que Alice estava com atraso no seu desenvolvimento. À época, as duas moravam em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. "Eu procurei médicos no Sul, em São Paulo, no Ceará, e ninguém me deu um diagnóstico fechado", conta Farah.

Mesmo assim, como Fabiana é fisioterapeuta, Alice continuou fazendo tratamentos de estimulação, a pedido de profissionais - um "tratamento às cegas", como a mãe descreve. "Se buscava o diagnóstico de diversas formas, como erro inato no metabolismo, algum distúrbio hormonal ou de enzima", relata Fabiana. No processo, cogitou-se que a menina podia ter outras síndromes, mas foram descartadas.

Após o diagnóstico, Alice passou a fazer um tratamento voltado para análise comportamental, que inclui fisioterapia, fonoaudiologia e cicloterapia. O Pitt Hokins da jovem é associado ao autismo, o que pode acontecer em alguns casos de Doenças Raras.

A situação da filha levou Fabiana a fazer faculdade de Direito em 2005. A mãe enfrentava constantemente problemas com vagas em escolas, planos de saúde e outras particularidades. "Para evitar o tempo inteiro buscar um advogado para resolver os problemas, eu e meu marido resolvemos fazer Direito", conta Farah. O marido não chegou a concluir o curso, apenas Fabiana, que ficou grávida novamente nesse período.

A advogada ficou receosa que a nova criança também apresentasse alguma síndrome - o que não aconteceu. Logo que concluiu o curso, Fabiana logo buscou na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ingressar em comissões voltadas para os direitos de Pessoas com Deficiências (PCD). "De lá para cá, eu percebi que outras pessoas com outras deficiências, inclusive síndromes raras, também passam pelas mesmas situações e problemas. São lutas diárias", aponta Farah.

Ainda conforme a advogada, a judicialização da saúde no Brasil ainda é um grande obstáculo nessa luta. Há ainda muitas negativas de medicamentos, tratamentos. A busca por esses direitos acaba sendo incessante, descreve Fabiana. Até mesmo matrícula na escola pode ser uma tarefa frustrante, pois poucas estão preparadas para acolher pessoas com deficiências. "É necessário a gente divulgar, chamar atenção das pessoas, para que tenham consciência que pessoas com deficiência precisam de maior atenção", desabafa a mãe.

Felizmente, o tratamento de Alice tem evoluído bem. Hoje, a jovem já tem mais palavras no seu vocabulário, por exemplo. Isso só foi possível após a menina realizar um novo exame com um médico aqui de Fortaleza - um exame chamado Sequenciamento do Hexoma, que detectou uma alteração em um gene específico de Alice. No Brasil, são diagnosticados 17 casos da síndrome. Fabiana também faz parte da associação nacional que trata a temática, a Pitt Hopkins Brasil.

A entidade preparou conteúdo especial para a semana:

 

> Confira aqui site e Facebook da associação.

Tira-dúvidas sobre Pitt Hopkins

A médica geneticista Ellaine Carvalho, da rede HapVida, respondeu algumas dúvidas gerais sobre a síndrome. Veja:

OP: O que é a Síndrome de Pitt Hopkins?

Ellaine Carvalho: A síndrome de Pitt-Hopkins (PTHS) é uma síndrome genética caracterizada por atraso significativo no desenvolvimento neuropsicomotor, deficiência intelectual moderada a grave, alterações comportamentais, alterações faciais características e possíveis episódios intermitentes de hiperventilação seguidos de apnéia. A fala é significativamente atrasada e a maioria dos indivíduos não apresenta comunicação verbal, com uma linguagem receptiva, muitas vezes mais forte do que a expressiva. Outros achados comuns são sintomas de transtorno do espectro do autismo, distúrbios do sono, movimentos estereotipados das mãos, convulsões, constipação e miopia grave.

OP: Há cura? Como é o tratamento?

Ellaine Carvalho: Não há cura para síndrome, porém o pacientes devem ser acompanhados e tratados por uma equipe multidisciplinar, incluindo pediatra, neuropediatra, geneticista, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo. Deve-se ter um plano de educação individualizado para crianças mais velhas com forte consideração pelo treinamento precoce em meios alternativos de comunicação e estratégias de gestão comportamental. Avaliações de desenvolvimento contínuas para adaptar os serviços educacionais às necessidades individuais; acompanhamento regular com um oftalmologista para monitorar a alta miopia e estrabismo; reavaliação periódica com um profissional de genética clínica sobre informações e recomendações atuais.

OP: Como é o diagnóstico?

Ellaine Carvalho: Geralmente o diagnóstico é realizado por médico geneticista. É causada por uma mutação no gene TCF4 que está localizado no cromossomo 18. A maioria dos indivíduos afetados tem sido de ocorrência única em uma família. É imprescindível a realização de um adequado aconselhamento genético visando informar à família todo o possível quadro clínico, complicações que podem estar associadas, prognóstico, tratamentos disponíveis, e risco de recorrência familiar.

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