"Desafio do Desodorante": saiba como pais podem proteger filhos de brincadeiras perigosas
O POVO Online procurou profissionais para falar sobre o assunto e formas de prevenir as crianças dos riscos que práticas promovidas como brincadeiras podem gerar
Brincadeiras de autodesafio têm se disseminado pela Internet, sobretudo no YouTube. Pesquisa de autoria da doutora Juliana Guilheri revela que, em 2010, existiam 500 vídeos relacionados a jogos de asfixia, por exemplo, no site. Agora, em 2018, são 24 mil conteúdos somente sobre "jogos" de não oxigenação.
O mais recente desafio envolve um desodorante. A atividade consiste no inalo do produto pelo maior tempo que a pessoa conseguir suportar. A brincadeira vitimou Adrielly, uma menina de 7 anos, moraradora de São Bernardo do Campo, em São Paulo. Ela espirrou o spray na boca, segurou o ar e passou mal na mesma hora. O caso aconteceu no último sábado, 3.O POVO Online procurou profissionais para falar sobre o assunto e formas de prevenir as crianças dos riscos que práticas promovidas como brincadeiras podem gerar. O psicólogo e membro da Liga de Neurologia e Psiquiatria Infantil da Universidade Federal (UFC), Daniel Franco, afirma que proibir o acesso das crianças à Internet não é o caminho.
Proibições não
Conforme o psicólogo, qualquer atitude proibicionista relacionada à Internet não é saudável, uma vez que inibe a possibilidade de a criança entrar em contato com conteúdos positivos para a sua educação. "A Internet tem muita coisa boa, mas assim como qualquer atividade que a criança vai desenvolver, ela precisa ser supervisionada e mediada", afirma Franco, lembrando que o conselho vale para todos os âmbitos da vida infantil.
Controle dos pais
Uma alternativa dada por ele é a de que os pais façam do uso monitorado da Internet um momento lúdico entre pais e filhos, o que não precisa acontecer sempre, mas eventualmente. "É a oportunidade que os pais têm de orientar. É uma oportunidade de educar", afirma o profissional.
Visita ao histórico
Nos momentos em que os pais não estiverem presentes, Franco aconselha uma visita ao histórico, a fim de saber que tipo de conteúdo foi consumido naquele instante. Por mais invasiva que a prática possa ser, "são crianças e é preciso olhar o que elas estão fazendo". Em caso de a criança ter apagado o histórico, ele avalia que uma conversa sobre o assunto é necessária.
Aplicativos
A tecnologia é considerada uma ferramente útil no combate aos perigos que a própria tecnologia é capaz de oferecer. Franco aconselha aplicativos de monitoramento dos filhos. Um citado por ele é o Watchover. "São ferramentas que auxiliam os pais". Ele informa que em lojas de aplicativo tem vários destes.
Papel da escola
"A escola também tem que orientar, até porque a própria sugere o uso da internet para fins de pesquisa". Além da pesquisa, o psicólogo entende que a criança usa a internet para outros dois fins: jogar e se comunicar. Por isso, ele afirma que a escola deve, mais uma vez, fazer a sua função educativa.
Diferenças entre as brincadeiras
Franco explica que a atual brincadeira do desodorante, bem como o desafio da asfixia em nada têm a ver com o jogo da Baleia Azul. Ao passo que um jogo necessita de um jogador disposto a morrer, outro pretende testar os limites do corpo, como se fosse uma prova de que o jogador, quando bem sucedido, é "superior a morte".
Instituto Dimi Cuida
Em Fortaleza, o Instituto Dimi Cuida, localizado na Avenida Santos Dumont, no bairro Aldeota, trabalha especificamente com a prevenção à brincadeiras perigosas. Foi criado em 2014 para a prevenção de brincadeiras perigosas. É o primeiro do País.
O instituto nasceu a partir do "jogo do desmaio", onde o jovem Dimitri Jereissati, de 16 anos, teve uma experiência fatal. Ele foi encontrado enforcado em cima de sua cama pelo irmão mais velho após ter uma experiência mal sucedida com o desafio. "Fizeram toda uma investigação e chegaram à conclusão de que não foi suicídio. Estava provocando o enforcamento para curtir a sensação de não morrer", explica Franco.
Ao O POVO Online, a psicóloga e membro do Instituto, Fabiana Vasconcelos, informa que nos anos subsequentes ao da morte de Dimitri, tiveram outros casos no Brasil. Foram mais dois casos em Fortaleza e um Recife. No Brasil, ela precisa 21 casos.
O trabalho do Dimi Cuida é centrado em três pilares: conhecimento, compreensão e prevenção das brincadeiras perigosas. "O 'conhecer' é porque a maioria dos adultos que trabalham com crianças e adolescentes estão sem saber da prática".
Já sobre o "compreender", ela cita a importância de todas as pessoas envolvidas, pais, responsáveis e professores, estarem cientes do fênomeno das brincadeiras perigosas. Para reforçar seu argumento, ela menciona uma pesquisa científica de autoria Juliana Guilheri, que revela que 40% dos entrevistados pelo trabalho já tinham praticado brincadeiras de não oxigenação.
A prevenção vem com a Oficina do Brincar. "A Oficina é um convite das instituições quando a escolar percebe que existe uma necessidade de esclarecer brincadeiras. A gente conversa sobre todos tipos de brincadeiras, off e online, para que a criança chegue numa conclusão, ela mesma, de que não deveria brincar com aquilo", explica Fabiana. "Estamos numa era onde a socialização online, sobretudo nas plataformas de vídeo, são consideradas muito importantes por crianças e adolescentes. Essa disseminação só tem aumentado", alerta Fabiana.
CARLOS HOLANDA