STJ discute se herdeiros podem acessar arquivos de quem já morreu

Herança digital: Justiça discute se herdeiros podem acessar celular e arquivos de quem já morreu

Discussão inédita busca alternativas para garantir acesso de herdeiros a determinados conteúdos ao passo em que mantém protegida a privacidade de falecidos

A herança digital e a decisão de quem pode acessar celulares, computadores e arquivos após a morte do proprietário foram tema de discussão no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), no último dia 12. A discussão inédita debate alternativas para garantir acesso a herdeiros a determinados conteúdos, ao passo em que mantém protegida a privacidade de falecidos. Eventual decisão pode definir os rumos da herança digital no Brasil.

Uma opção levantada durante a discussão visa a criação da figura de um “inventariante digital”, profissional responsável pela avaliação do conteúdo de dispositivos e bens digitais que manteria em sigilo o teor dos arquivos e que repassaria relatório a um magistrado para decisão do que poderia ou não ser repassado aos herdeiros.

A regulamentação desse patrimônio digital, por meio de inventário, foi proposta pela ministra e relatora do processo, Nancy Andrighi, da 3ª Turma do STJ.  A ministra categorizou a causa como um “vácuo legislativo” e defendeu que não existem escritos aprofundados sobre o tema.

Para a relatora, o acesso vai além do pedido de ofício para plataformas de contas pessoais, pois a abertura indiscriminada pode configurar crimes contra o direito de personalidade do proprietário do dispositivo. "Vamos imaginar que fosse aberto esse computador, revelando um relacionamento afetivo que nunca ninguém soube. Esse é um direito à intimidade que não pode ser objeto de divulgação", argumentou a ministra.

Segundo Andrighi, é necessário o estabelecimento legal de um incidente processual de identificação de bens digitais, que permita a organização dos conteúdos encontrados em uma lista por um segundo agente (inventariante) e o profissional preservaria o sigilo sobre a pesquisa. 

A relação dos bens, como e-mails, fotos, vídeos, senhas, dados bancários, páginas em redes sociais, plataformas de streaming, contratos, criptomoedas e milhas, poderá ser analisada pelo juiz responsável e categorizadas como bens transmissíveis e intransmissíveis. Sendo considerados intransmissíveis aqueles que, se transferidos, violariam a privacidade do falecido ou de terceiros.

A discussão foi iniciada com a recordação do caso de um acidente aéreo que matou o empresário Roger Agnelli, ex-presidente da Vale, sua esposa e seus dois filhos em 2016. Após a morte, a mãe da filha de Agnelli pediu autorização judicial para acessar o conteúdo do computador da filha falecida, com conteúdos afetivos e possíveis patrimônios econômicos.

Regulamentação

A relatora do processo defende que a causa é muito recente no Brasil, mas ressalta que é uma situação que “acontece todos os dias” e permanece sem base legal. O cenário jurídico abrangeu apenas neste ano discussões sobre o tema e também a definição específica do que são bens digitais.

Um Projeto de Lei (PL) número 4/2024, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD/MG), propõe a criação de um Livro autônomo de Direito Civil Digital e, entre outros temas, expande as orientações legais para patrimônios digitais. O projeto foi apresentado em janeiro, mas segue sem tramitação no Senado.

Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente

Tags

Os cookies nos ajudam a administrar este site. Ao usar nosso site, você concorda com nosso uso de cookies. Política de privacidade

Aceitar