"É possível que Bolsonaro seja preso, mas não é provável", diz advogado

Após 30 anos tendo foro privilegiado por conta dos cargos públicos que ocupou, Bolsonaro perde o direito de ter seus processos conduzidos em última instância e teme ser preso quando voltar ao Brasil.

14:35 | Jan. 31, 2023

Jair Bolsonaro, ex-presidente da República (foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) iniciou o ano de 2023 perdendo o foro privilegiado, ao  mesmo tempo em que é alvo de investigações no Supremo Tribunal Federal (STF). Esta é a primeira vez em 30 anos que Bolsonaro não ocupa nenhum cargo público e deve ter seus processos conduzidos em primeira instância.

Alvo de inquéritos sobre as invasões em Brasília, os cartões corporativos e a crise humanitária dos Yanomami, o ex-presidente teme ser preso ao voltar para o Brasil, caso seja considerado culpado perante as acusações.

O advogado Igor Cesar Rodrigues, membro da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas, conselheiro regional da OAB/CE, afirma que é possível, sim, que o político possa ser preso, mas ele não acha que seja “provável”, ou seja, que irá realmente acontecer.

“Sim, é possível que ocorra a prisão dele, só não acho provável. (...) Como cidadão comum, ele está sujeito a tipos de prisões, mas não é provável que haja uma prisão no cenário atual que vivemos. É fruto da polarização que se instalou, a polarização política e social”, explicou o advogado.

“Por mais que tenha sido derrotado nas eleições, ele não deixa de ser um líder nacional e muitas pessoas o seguem, isso é um fato, então (a prisão de Bolsonaro) seria na verdade um atentado à ordem pública. Por isso que a prisão dele é pouco provável, mas que é possível de ocorrer, é possível, sim”, adicionou.

Com as polêmicas em volta do ex-presidente, o conselheiro regional da OAB/CE afirma que a acusação mais possível de ser usada para justificar a prisão de Bolsonaro é a de que ele incitou os acontecimentos violentos em Brasília.

“Tendo em vista que as consequências dos atos, considerados terroristas, ocorridos recentemente causaram um impacto muito grande na população brasileira e nas autoridades, inclusive nos juízes e ministros. É possível que o que faria ele ser preso o mais breve fosse, justamente, o ataque à democracia brasileira”, diz Igor Rodrigues.

O advogado afirma que, entre as três acusações, a suspeita de que ele incitou os ataques contra a democracia pode ser o que o torne réu mais rapidamente, pois pode agir nestes acontecimentos mesmo após sair do cargo de presidente.

“A prática de crimes relacionados aos atentados consegue prosseguir mesmo fora do cargo, pois é inerente à pessoa dele ser um líder político. Ele é líder político dentro ou fora da Presidência. Ele se enfraquece, óbvio, mas ele continua sendo um líder. O resultado disso é o que vem ocorrendo e também o que ocorreu no ataque aos Três Poderes”, afirma.

“Nos casos dos ataques aos Poderes e à democracia, aí sim ele mesmo, sem ser presidente, ele tem a condição de continuar incentivando, e aí, por isso, ele pode, sim, ser preso preventivamente em razão do que é previsto no código processo penal a todo cidadão”, conclui.

O foro por prerrogativa de função, conhecido usualmente como foro privilegiado, também serve para que uma autoridade, como o presidente da República, tenha mais dificuldade de exercer seu poder perante a Justiça. Sendo julgado diretamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente tem menos influência no resultado do julgamento do que se fosse julgado por um juiz de primeira instância.

No caso do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a perda do foro privilegiado não significa que ele poderia ser preso com mais facilidade, mas ele não terá o poder para se proteger e proteger sua família, como havia feito.

“Todos sabem o quanto Bolsonaro buscou proteger a si e a sua família, evitando investigações, trocando comandos das polícias, como a Polícia Federal, e tudo isso denota um interesse de se proteger contra eventuais investigações pelos crimes que cometia. Hoje, ele não detém mais esse poder, de forma que ficará certamente mais fácil processá-lo e julgá-lo até a sua condenação”, esclarece o advogado.

Além de ser acusado de incitar os ataques contra as sedes dos Três Poderes, Bolsonaro também acumula as acusações em relação aos cartões corporativos e de ser responsável pela crise humanitária do povo Yanomami.

Segundo Igor Rodrigues, é improvável que o ex-presidente seja preso por acusações sobre a crise humanitária do povo Yanomami, pois seria mais difícil medir suas ações sem ele estar no cargo de autoridade da República.

“Que ele poderá ser processado e preso por crimes envolvendo a situação dos Yanomami, não tenha dúvida. Mas por que eu acho que seria pouco provável? No caso da negativa aos pedidos de socorro do povo indígena (Yanomami), não há mais nada que ele possa fazer. Não há mais responsáveis por isso”, afirma.

“Óbvio, ele vai ser responsabilizado pelos atos que praticou lá enquanto era presidente da República. Mas, hoje, ele não está mais em condição de praticar qualquer ato relacionado a isso. Por isso que nesses outros dois casos (yanomami e cartões corporativos) eu considero que a prisão dele só deve ocorrer quando ele for processado e ao final condenado, acrescenta o advogado.

Em relação ao uso indevido dos cartões corporativos do Governo Federal, Igor diz que o ex-presidente pode, sim, ser condenado, porém é difícil saber qual das duas acusações, do povo Yanomami e dos cartões corporativos, estaria mais perto de ser formalizada e transformada em condenação.

“Quanto ao mal uso dos cartões corporativos, são situações que comprovam o crime praticado diretamente por ele. Ele poderá, sim, ser processado e preso, então são duas hipóteses (Yanomami e cartões corporativos) que não se excluem e é difícil dizer qual delas estaria mais perto de finalizar, até porque tudo isso ainda está em apuração. Tendo em vista o sigilo das investigações, não se sabe se um está mais avançado que o outro, mas certamente ele será punido pelos dois casos se ficar comprovado sua participação direta”, explica.