Morre Cabo Anselmo, agente "duplo" na ditadura militar
Ele combateu o regime militar e delatou colegas da esquerda que se opunham à ditadura militar
Morreu nesta quarta-feira, 16, o ex-militar conhecido como Cabo Anselmo. Ele foi agente "duplo" da Ditadura Militar (1964-1985). Delatava militantes da esquerda para, segundo ele, não ser morto pelos governantes de ocasião. José Anselmo dos Santos foi sepultado em Jundiaí, São Paulo, aos 80 anos.
Em maio de 2021, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça negou indenização a Anselmo. Ele argumentou que antes de colaborar com o regime houvera sido perseguido, preso e exilado, na década de 1960. Assim, pediu reparação de R$ 100 mil. Na época, era o único agente que colaborou com os dois lados, regime e resistência.
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Entretanto, Nilmário Miranda, relator do caso e ex-ministro da Secretaria dos Direitos Humanos, afirmou não caber ao "Estado, em nenhuma hipótese, reconhecer anistia a pessoa que participou em atos de repressão ilícita e, portanto, não cabe discutir sobre eventuais reparações”.
No início da ditadura, conforme o Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Anselmo entrou para a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Como membro do grupo, recebeu treinamento de guerrilha em Cuba.
Anselmo voltou ao Brasil em 1970 para trabalhar em São Paulo. Nos meses seguintes, prisões e mortes de militantes que tiveram contato com ele fizeram despertar nos sobreviventes a desconfiança de que fosse um policial infiltrado. Ele seria alvo da mesma acusação por membros da Aliança Nacional Libertadora (ALN), outro grupo de oposição ao Regime, fundado, entre outros, por Carlos Marighella.
Em 1971, ele amargaria a segunda prisão - foi preso no início do regime. Com isso, viraria informante do Departamento de Ordem Política e Social (Dops).
No programa Roda Viva, da TV Cultura, em 2011, diante da pergunta sobre se se arrepende mais de ter combatido ou servido à ditadura, ele respondeu: "Nem um, nem outro. Eu me arrependo de ter traído meu compromisso para com a Pátria quando deixei a Marinha e passei para o lado da insubordinação."
Perguntado sobre algum arrependimento por ter traído companheiros de oposição aos militares, Anselmo disse que "naquele momento, o que houve, no meu entender, foi a consciência de que eu estava errado e eles estavam errados. Eu tomei a consciência, mas não do ponto de vista de que estariam certos aqueles que torturavam gente nos calabouços da polícia política."
Ele disse que seu modus operandi poderia estar contribuindo para acabar com aquele momento que se propunha a levar o povo a uma guerra civil. "Quando eu retornei de Cuba, já havia companheiros que haviam sido mortos em tiroteios."