Procuradoria-geral age para limitar poderes das defensorias públicas
Uma ação apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, ameaça limitar os poderes das defensorias públicas no exercício da função de garantir acesso à Justiça aos mais pobres. O pedido da PGR para retirar da alçada desses defensores o poder de requisitar a autoridades públicas e agentes do Estado documentos que julguem úteis para municiar processos, como certidões e perícias, começa a ser julgado pelo Supremo nesta sexta-feira, 12.
O caso será analisado no plenário virtual da Corte, plataforma na qual os votos dos ministros são apresentados sem discussões. Na petição inicial encaminhada ao Supremo, Aras argumenta que a prerrogativa dos defensores públicos de requerer às autoridades exames, vistorias, diligências e demais informações fere os princípios da isonomia, do contraditório e do devido processo legal.
Para o procurador-geral, os dispositivos garantidos pela Constituição às defensorias "desequilibram a relação processual" porque conferem "poderes exacerbados a apenas uma das partes". As declarações de Aras provocaram reações de defensores públicos, advogados e personalidades ligadas ao tema sob análise.
Seja assinante O POVO+
Tenha acesso a todos os conteúdos exclusivos, colunistas, acessos ilimitados e descontos em lojas, farmácias e muito mais.
AssineA advogada Juliette Freire, vencedora da edição 2021 do Big Brother Brasil, manifestou nesta quarta, 9, no Twitter, sua contrariedade. "O fim do poder de requisição vai atingir drasticamente o direito de milhares de brasileiros e brasileiras vulneráveis a terem acesso à justiça de forma igualitária", escreveu a influenciadora, que tem 4,1 milhões de seguidores na rede social.
O acesso aos serviços da Defensoria Pública da União (DPU) é garantido por lei complementar e pela Constituição à população com rendimento bruto familiar mensal de até R$ 2 mil. O benefício também é assegurado àqueles que, embora não se enquadrem no critério de renda, conseguem comprovar a incapacidade de pagamento dos honorários advocatícios.
ACESSO
Pesquisa divulgada em agosto pela Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Federais (Anadef) mostrou que 40,7% da população brasileira não consegue acesso ao serviços jurídicos oferecidos pela DPU. Mesmo assim, a entidade estima ter atendido aproximadamente 3 milhões de pessoas do início do ano passado até agora.
Na avaliação do presidente da Anadef, Eduardo Kassuga, a eventual derrubada do poder de requisição de documentos levará ao aumento instantâneo de casos na Justiça. "O Judiciário vai ser atolado por ações", disse Kassuga. "Não é um privilégio conferido às defensorias. Pelo contrário, é uma prerrogativa essencial para que a gente tenha a capacidade de defender direitos e garantias fundamentais", completou. A Anadef atua como parte interessada da ação.
DIREITOS NEGADOS
Morador de Viçosa (CE), Giovani Cesario Xavier recorreu à DPU após ter acesso negado ao auxílio emergencial. Com a falência de sua lanchonete, as parcelas do benefício eram bastante aguardadas porque representavam a única fonte de renda para sustentar a família durante a pandemia de covid-19.
A negativa só foi solucionada depois que a defensora pública da União Carolina Botelho requisitou os dados dos integrantes do núcleo familiar ao Ministério da Cidadania e identificou inconsistências no Cadastro Único do governo. A filha de Xavier havia sido inscrita dez anos antes como moradora da casa da avó materna, em outra cidade (Tianguá), e isso provocou a recusa da solicitação. "Se fosse por nós mesmos, não teríamos nem como correr atrás", afirmou Xavier.
Somente em Fortaleza foram atendidos, no ano passado, cerca de 7 mil casos semelhantes. "Não fosse o poder de requisição de informações conferido à Defensoria Pública, o cidadão jamais teria compreendido os reais motivos da negativa do seu auxilio emergencial e não teria conseguido provar na Justiça o erro e cadastro", disse Carolina.
O professor da Fundação Getúlio Vargas Oscar Vilhena, representante da Comissão Arns na ação, observou que a prerrogativa de solicitar informações é "essencial" em ações de natureza coletiva, que são de competência da Defensoria Pública. "O objetivo central dessas ações é restringir o acesso das pessoas mais pobres aos seus direitos. Não se pode tratar isso como uma briga corporativa. É uma questão de universalização de direitos."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente