Governo paga R$23 mil para influenciadores defenderem "atendimento precoce" contra a Covid-19

Segundo reportagem da Agência Pública, de jornalismo investigativo, nenhuma das campanhas pagas com dinheiro público mencionava isolamento social Entre janeiro de 2019 e dezembro de 2020, foram investidos mais de R$10 milhões em marketing de influência pelo Ministério da Saúde.

Em janeiro de 2021, a Secretaria de Comunicação (Secom) do governo do presidente Jair Bolsonaro contratou quatro influenciadores, que receberam um montante de R$23 mil para falar sobre “atendimento precoce”. De acordo com levantamento da Agência Pública material, a verba saiu de um investimento total de R$19,9 milhões da campanha publicitária denominada ‘Cuidados Precoce COVID-19’.

De acordo com o levantamento, mais de R$1,3 milhões em verbas federais foram usados para custear ações de marketing com influenciadores sobre a pandemia. O valor foi investido pelo Ministério da Saúde e Secom e inclui R$85,9 mil destinados ao cachê de 19 “famosos” contratados para divulgar estas campanhas em suas redes sociais.

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Uma delas era a ex-BBB Flávia Viana. Ela recebeu, sozinha, R$11,5 mil, segundo os documentos obtidos. Confira trecho da reportagem:

No roteiro da ação, obtido pela Agência Pública através de um pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI), a Secom orientava a ex-BBB Viana e os influenciadores João Zoli (747 mil seguidores), Jéssika Taynara (309 mil seguidores) e Pam Puertas (151 mil seguidores) a fazer um post no feed e seis stories – todos no Instagram – dizendo para os seguidores que, caso sentissem sintomas da Covid, era “importante que você procure imediatamente um médico e solicite um atendimento precoce”.

Viana, que fez o seu post em 14 de janeiro, enquanto Manaus vivia o auge do colapso na rede hospitalar, recebeu quase 33 mil likes. Pam Puertas e Jessika Taynara fizeram seus posts nos dias 12 e 13 de janeiro, respectivamente, e a reportagem não encontrou no feed de João Zoli a postagem publicitária. A Agência Pública entrou em contato com os quatro influenciadores, porém não recebeu resposta até o fechamento desta reportagem.

De acordo com os documentos obtidos pelo jornal Agência Pública, a ex-BBB Flávia Viana recebeu R,5 mil para ação de marketing ‘Cuidados Precoce COVID-19’
De acordo com os documentos obtidos pelo jornal Agência Pública, a ex-BBB Flávia Viana recebeu R,5 mil para ação de marketing ‘Cuidados Precoce COVID-19’ (Foto: Reprodução/Instagram)

 

O jornal afirma que, no texto-guia da ação, os quatro influenciadores receberam informações de como deveriam se manifestar e a pose que deveriam fazer. No documento havia a orientação da utilização de máscara no rosto e álcool gel na mão. O texto pelo qual os influenciadores deveriam se guiar para fazer seus posts dizia:

“Hoje quero falar de um assunto importante, quero reforçar algumas formas de se prevenir do coronavírus. Vamos nos informar e buscar orientações em fontes confiáveis. Não vamos dar espaços para fake news. Com saúde não se brinca. Fiquem atentos! E se identificar algum sintoma como dor de cabeça, febre, tosse, cansaço, perda de olfato ou paladar, #NãoEspere, procure um médico e solicite um atendimento precoce”. O texto trazia ainda a recomendação do uso da máscara e higienização das mãos com água e sabão ou álcool gel.

No documento que acompanha a LAI, a Secom explica que, de todo o montante, R$987,2 mil foram destinados à produção das peças, o que inclui filmes para TV, spot para rádio, vídeos e banners para internet e peças para mídia exterior. Enquanto isso, o valor restante (R$ 18,9 milhões) foi destinado à veiculação e divulgação do material produzido. A pasta não detalha sobre os gastos com ações de marketing de influência.

Apesar do briefing e das postagens dos influenciadores contratados não mencionarem o “tratamento precoce” para Covid-19 com uso de medicamentos como cloroquina e ivermectina, a reportagem lembra que a própria campanha oficial sobre “atendimento precoce” veiculada nos sites do governo, os termos “atendimento” e “tratamento” se confundiam.

O ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello também confundiu os termos No dia 18 de janeiro deste ano, o material jornalístico lembra que ele negou ter recomendado “tratamento precoce” à população, afirmando que o que era recomendado pelo Ministério era o “atendimento precoce” – o que não é verdade.

No dia 16 de janeiro, o Twitter colocou um aviso em publicação do Ministério da Saúde alertando para "informações enganosas e potencialmente prejudiciais relacionadas à Covid-19". Na rede social, o Ministério compartilhou um texto com a hashtag #NãoEspere, orientando as pessoas a procurarem uma unidade de saúde para iniciar tratamento precoce contra o coronavírus logo após os primeiros sintomas da doença. Contudo, segundo cientistas, tal método ainda não tem eficácia comprovada contra a doença.

A Pública afirma que no dia 15 de janeiro de 2021, a Secom realizou uma reunião cujo tópico era ‘Influenciadores’. A informação está na agenda do Coordenador-geral de Mídia, Luiz Antônio Oliveira Alves. O jornal afirma que solicitou, por meio da LAI, a ata da reunião, porém, a Secom afirmou que não é de praxe manter ata ou gravação de reuniões, por se tratar de assuntos internos e rotineiros. A pasta informou que a reunião discutiu “questões envolvidas no emprego de influenciadores digitais como complemento aos esforços de mídia das ações de divulgação desta Secretaria.”

Ainda segundo documento obtido pela reportagem via LAI, o Ministério da Saúde realizou o pagamento de influenciadores digitais para campanhas sobre a pandemia desde março de 2020. A primeira ação custou R$400 mil, para o pagamento de cinco influenciadores digitais, pela organização Fiquem Sabendo.

As personalidades de Instagram Vovó de Seis (68 mil seguidores) e Vovó Janete (13 mil seguidores), que publicam conteúdos sobre família e bem-estar, receberam cachês de R$3 mil e R$1 mil, respectivamente, assim como os youtubers NerdShow e Professor Paulo Jubilut, que juntos somam mais de 1,8 milhão de inscritos em seus canais, revela o jornal.

O material divulgado pelo jornal afirma que Janete Stapf, a Vovó Janete, contou ter sido procurada pela agência TubeLab, a qual mediou seu contato com o MS. Ela afirma ter sido orientada a publicar três vídeos curtos em seus stories, além de um post no seu feed do Instagram, que custou o valor de R$1 mil. “Tudo que publico é visualizado muito rapidamente. E eu sempre respondo, nem que seja só com um coração”, disse.

Segundo a influenciadora, todos os passos para a publicação foram orientados via WhatsApp pela representante da agência responsável que a contatou. “Na época, me pediram para focar no ato de lavar as mãos. Não falaram de máscaras, por exemplo”, lembra. A agência explica que os resultados dos posts e o engajamento gerado foram enviados por Janete.

Ao jornal, a Secom disse que não mantém ata de reunião sobre influenciadores.No dia 15 de janeiro de 2021, a Secom realizou uma reunião cujo tópico era ‘Influenciadores’, segundo agenda do Coordenador-geral de Mídia, Luiz Antônio Oliveira Alves. A Agência Pública solicitou, por meio da LAI, a ata da reunião.

Na resposta, a secretaria afirmou que não é de praxe manter ata ou gravação de reuniões, por se tratar de assuntos internos e rotineiros, mas esclareceu que nesta reunião discutiu-se “questões envolvidas no emprego de influenciadores digitais como complemento aos esforços de mídia das ações de divulgação desta Secretaria.”

Em maio de 2020, uma campanha propagandeava o TeleSUS, plataforma de medicina remota do Ministério da Saúde. A campanha custou R$500 mil e pagou cinco influenciadores digitais, entre eles a ex-BBB Flávia Viana e a dupla sertaneja Henrique e Diego. Viana recebeu R$10 mil, Henrique e Diego receberam R$3 mil, o youtuber Igão recebeu R$6 mil e Nanda Caroll e Camila Loures receberam R$5 mil e R$7,5 mil, respectivamente.

Em maio de 2020, o youtuber Igão foi um dos contratados pela Secom para campanha sobre o TeleSUS
Em maio de 2020, o youtuber Igão foi um dos contratados pela Secom para campanha sobre o TeleSUS (Foto: Imagem: Reprodução/YouTube )



Após evidenciar outros casos, o material informa que as agências licitadas pelo Executivo, como Artplan, Calia e NBS, estão envolvidas no processo de contratação de influenciadores e fazem a intermediação. Elas seguem ganhando licitações anuais do governo desde, pelo menos, 2017. A licitação das empresas foram renovadas por mais 12 meses em agosto do ano passado

Fonte: Agência Pública

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