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Eleições 2020: desigualdade de gênero ainda reflete em candidaturas de prefeitas e vereadoras; entenda

Apenas uma mulher foi eleita como prefeita nas Capitais do País. Índices no Ceará também são permeados por desigualdade: o prefeito médio no Ceará é um homem de meia idade, branco, casado e com ensino superior

Com o fim das eleições de 2020, a definição política dos candidatos e candidatas no Ceará, em Fortaleza e em outras capitais brasileiras mais uma vez foi permeada pela desigualdade de gênero na política. Um breve exemplo reflete o assunto: das 26 capitais do País que participaram do processo eleitoral, 25 elegeram homens para o cargo de prefeito. A única mulher eleita foi definida ainda no primeiro turno: Cinthia Ribeiro, candidata reeleita pelo PSDB na cidade de Palmas (TO).

A representatividade da candidata vai de encontro ao índice de mulheres pela prefeitura no segundo turno: eram cinco na disputa pelo cargo executivo nas Capitais no último domingo, 29 - um número já considerado baixo. Entretanto, nenhuma foi eleita no segundo turno. Foi o caso de Marília Arraes (PT) em embate com o primo João Campos (PSB) em Recife; e de Manuela Dávila (PCdoB), derrotada por Sebastião Melo (MDB) em Porto Alegre.

Dados contabilizados pela organização Gênero e Número em todos os municípios brasileiros com eleições no primeiro e/ou segundo turno mostram que foram eleitas 658 prefeitas, uma porcentagem de 12,9%. Homens, entretanto, ocupam a prefeitura de 4.800 prefeitos pelo Brasil, um índice de 87,1%.

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No Ceará, são 32 candidatas ocupando os Paços Municipais cearenses em 2020. É um aumento quando comparado às 25 candidatas eleitas em 2016, último ano de eleições municipais. Porém, ainda são 152 prefeitos cearenses e o ciclo do perfil segue: o prefeito médio no Ceará é um homem de meia idade, branco, casado e com ensino superior.

Isso acontece não por acaso. Ao longo do tempo, vamos ensinando meninas a se portarem contra diversas condições que são exigidas no espaço governamental, como a de expressarem suas opiniões em público, terem diversas formas de articulação ou de serem totalmente dedicadas à família. Esse último ponto, inclusive, é destacado, conforme explica a professora do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisadora das relações entre gênero e política, Monalisa Soares.

"Quando falamos sobre mulheres nas políticas, vermos mulheres mais ligadas às esferas mais locais do que nas esferas estaduais e nacionais. Porque é mais difícil para as mulheres se deslocarem do cuidado da casa ou da família", pontua. "Ao contrário dos homens: eles não tem tanto esse dilema de desapegar ou sair de casa ou dos cuidados com os filhos. Tudo isso tem a ver com a socialização".

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Ainda temos entrelaçados a questão de raça e de gênero: na cidade de Bauru, interior de São Paulo, Suéllen Rosin (Patriota) foi eleita prefeita da cidade com 55,98% dos votos. Ela foi a única mulher negra eleita entre as prefeitas brasileiras que conseguiram chegar ao cargo municipal. O partido define-se como um "partido moralmente conservador, economicamente defensor do livre-mercado e confessionalmente cristão", defendendo "a valorização da pátria e o respeito à doutrina conservadora cristã".

"Também podemos pautar em nível de racialidade, etarismo ou sexualidade. A sociedade é diversa e porque as experiências desses segmentos não estarão contempladas na política?". Monalisa avalia que os votos ou as negações de candidatas "apenas por serem mulheres" é complexo. "Pode existir, sim, um segmento de pessoas que votam em mulheres por elas defenderem determinadas ideias", conversa. "É importante incentivá-las: temos que fazer isso em vários níveis sociais porque temos que romper com os estereótipos de gênero".

Por outro lado, as instituições políticas seguem reproduzindo essas desigualdades. Apesar de terem existido 173 mil mulheres aptas pela disputa de vereadoras, 6,3 mil mulheres vereadoras receberam um ou zero voto na eleição deste ano. Dentre os motivos, a ausência de votos ou o fato de nem a candidata ter votado nela mesma provocaram suspeitas de candidaturas "laranjas" apenas para cumprir a cota estipulada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sem importar pela representatividade. "Não há investimento na formação de lideranças dessas mulheres e também vemos muitos partidos não liderados por elas", cita a pesquisadora.

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Vereadoras em Fortaleza: de seis para nove candidatas eleitas em quatro anos

Quando falamos de candidaturas de vereadoras em Fortaleza, o número segue sob a perspectiva de desigualdade: em 2020, dos 43 cargos disponíveis, nove foram ocupados por mulheres (20,9%) em contraponto aos 34 homens eleitos (79,1%). O número representa um aumento de três mulheres na Câmara Municipal de Fortaleza em quatro anos.

Na visão de Monalisa, o crescimento deve a reeleição das candidatas e cita as inovações políticas que proporcionam diversas visões na câmara. "Temos a inovação do mandato coletivo de uma mulher negra [refere-se ao Nossa Cara, primeiro mandato coletivo da Capital], mas que traz consigo outras duas mulheres com experiências diferentes", destaca.

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Um dos destaques negativos da eleição municipal foram a eleição de dois homens para a candidatura de vereadores pelo Partido da Mulher Brasileira (PMB). Ambos os candidatos obtiveram mais de três mil votos cada. "Você espera que um partido fomente as lideranças femininas, mas tem como eleitos exclusivamente dois vereadores? É no mínimo inusitado", lamenta Monalisa.

O momento é de observar as candidaturas femininas e as representações expressas na Câmara por elas, além de incentivar a quebra de barreiras de gênero. Incentivando elas aos cargos públicos, haverá representações e elas poderão entender que participar da vida pública não as diminuem em outros aspectos. "É como se elas tivessem que chegar aos partidos prontas", exemplifica a pesquisadora. "Recentemente, tivemos um cenário destacado por homens e isso deve ser algo a ser observar entre os partidos: quais lideranças femininas podem emergir?", questiona.

 

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