Entenda a escalada de tensão entre EUA e Brasil

Entenda a escalada de tensão entre EUA e Brasil

Ofensiva de Trump passa a incluir revogação do visto do ministro Alexandre de Moraes e "aliados", ameaça de tarifaço e investigação contra Pix. Entre as exigências da Casa Branca está o fim do julgamento de Bolsonaro
Autor DW Tipo Notícia

Horas depois de o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinar o uso de tornozeleira eletrônica e outras medidas cautelares ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o governo dos Estados Unidos proibiu a entrada do magistrado, de seus "aliados" e familiares ao país.

O anúncio da revogação "imediata dos vistos" veio do secretário de Estado americano, Marco Rubio. Na sexta-feira (18/07) à noite, ele publicou no X que a sanção vem em resposta à "caça às bruxas" contra Bolsonaro – expressão que foi usada anteriormente por Trump para criticar a atuação do Judiário brasileiro em relação ao ex-presidente, acusado de idealizar e tentar executar um plano de golpe de Estado.

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"A caça às bruxas promovida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil, Alexandre de Moraes, contra Jair Bolsonaro criou um aparato de perseguição e censura tão amplo que não apenas viola os direitos fundamentais dos brasileiros, como também ultrapassa as fronteiras do Brasil para atingir cidadãos americanos", publicou Rubio.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou a medida, no X: "Minha solidariedade e apoio aos ministros do Supremo Tribunal Federal atingidos por mais uma medida arbitrária e completamente sem fundamento do governo dos Estados Unidos. A interferência de um país no sistema de Justiça de outro é inaceitável e fere os princípios básicos do respeito e da soberania entre as nações".

Esse é o mais recente embate entre os governos dos dois países, parte de uma dinâmica que ganhou fôlego com a ida aos EUA do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro, filho de Bolsonaro, em fevereiro. Desde então, ele tem intensificado sua ofensiva para conseguir apoio de organizações conservadoras e setores do governo americano para conseguir apoio para livrar seu pai de sanções legais e políticas no Brasil.

Recentemente, a administração Trump ameaçou o país com tarifas de 50% sobre seus produtos e acusou o Brasil de "práticas desleais" com operações como o Pix, abrindo uma investigação comercial.

O governo brasileiro, por sua vez, convocou o encarregado de negócios da Embaixada dos EUA e acusou Washington de chantagem política. O presidente Lula classificou as tarifas como "inaceitável interferência" e afirmou que o Brasil não abre mão de sua soberania.

Veja o que está em jogo com o crescimento das hostilidades entre os dois países.

Proibição de entrada nos EUA

Alexandre de Moraes foi a única pessoa citada por Rubio em seu anúncio de revogar vistos dessa sexta, e não ficou claro que outros ministros do STF serão impactados pela medida.

Ao jornal Valor Econômico, em condição de anonimato, um dos ministros da Corte ironizou a ameaça dizendo "Sempre teremos Paris", frase imortalizada no filme Casablanca, de 1942.

O Departamento de Estado americano, comandado por Rubio, já havia dado sinais do que viria ao anunciar a restrição de entrada aos EUA de autoridades estrangeiras inimigas da "liberdade de expressão".

O Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental, que integra o departamento, publicou à época, em português: "Que fique claro: nenhum inimigo da liberdade de expressão dos americanos será perdoado".

Eduardo Bolsonaro agradeceu a Trump e a Rubio em suas redes pela revogação do visto de Moraes e falou ainda que "queremos a Magnitsky ", em referência à lei que permite punições unilaterais a estrangeiros acusados de corrupção grave ou violações de direitos humanos.

O anúncio mais recente de Rubio não trata de sanções financeiras, como congelamento de eventuais bens e ativos nos EUA, previstas nos casos definidos pela lei – o que não foi descartado por Trump.

Na quinta, o mandatário enviou uma carta a Bolsonaro na qual reforçou seu apoio e ressaltou o desejo de que a ação penal contra o ex-presidente acabe "imediatamente", assim como o "ridículo regime de censura" no Brasil.

"Vi o terrível tratamento que você está recebendo nas mãos de um sistema injusto voltado contra você. Este julgamento deve terminar imediatamente! Não estou surpreso em vê-lo liderando nas pesquisas; você foi um líder altamente respeitado e forte que serviu bem ao seu país", disse Trump na carta.

Tarifas de 50%

As críticas do governo americano ao Brasil tem se intensificado desde 9 de julho, quando Trump anunciou tarifas de 50% sobre as importações vindas do Brasil a partir de agosto.

O presidente Lula disse que iria buscar o diálogo para tentar reverter a tarifa, mas que vai retaliar na mesma medida se não houver negociação com os Estados Unidos.

"Podemos recorrer à OMC [Organização Mundial do Comércio], propor investigações internacionais, cobrar explicações. Mas o principal é a Lei da Reciprocidade, aprovada no Congresso. Se ele cobrar 50% da gente, a gente vai cobrar 50% dele", afirmou Lula em entrevista à Rede TV, em 10 de julho.

Durante um pronunciamento veiculado em rede nacional de TV, Lula acusou o presidente americano de estar fazendo uma "chantagem inaceitável" ao ameaçar as tarifas, disse que tentar interferir na Justiça do Brasil é "um grave atentado à soberania nacional".

Ação contra Pix

Em 15 de julho, o governo de Donald Trump abriu uma investigação contra diversas práticas que a Casa Branca descreveu como potencialmente "desleais": obrigações e multas contra redes sociais americanas, acordos comerciais brasileiros com o México e a Índia e tarifas aplicadas sobre o etanol, entre outras.

Entre as supostas práticas "injustas" citadas, está o Pix, sistema de pagamento eletrônico instantâneo criado em 2020 pelo Banco Central que facilitou e barateou as transferências bancárias no país – e desagradou grandes empresas de cartão de crédito americanas.

A investigação foi aberta com base na legislação de comércio norte-americana, que prevê reação a "atos, políticas ou práticas de um país estrangeiro que são desarrazoadas ou discriminatórias e prejudicam ou restringem o comércio dos EUA".

De acordo com o governo americano, esses meios de pagamento poderiam prejudicar "a competitividade de empresas americanas que atuam no comércio digital e em serviços de pagamento eletrônico".

O tema do Pix voltou a incomodar Trump durante a reunião do Brics no início de julho, realizada no Rio de Janeiro. Os membros do bloco discutem a criação de uma infraestrutura financeira própria, com a interligação de seus sistemas de pagamento instantâneos – medida vista como uma possível ameaça à hegemonia do dólar americano.

Pressão das big techs

A pressão das gigantes da tecnologia tem sido apontada como um dos principais fatores por trás do tom e das ações de Trump contra o Brasil.

Empresas como Google, Meta (Facebook/Instagram), X e Telegram têm travado um embate direto com o STF, que determinou regras mais rígidas de remoção de conteúdo e bloqueio de contas.

Trump, ele próprio dono de uma rede social, acusa o Supremo de censurar as redes sociais. A pressão das empresas, combinada com o lobby de políticos conservadores e o próprio interesse de Trump em atacar inimigos da sua base ideológica, tem pesado fortemente nas medidas contra o Brasil.

Sobre o tema, Lula retrucou: "Ele [Trump] disse: 'Eu não quero que as empresas americanas, empresas de plataforma, sejam cobradas no Brasil'. Vou dizer uma coisa, o mundo tem que saber que este país só é soberano. Eu queria dizer para vocês que a gente vai julgar e cobrar imposto das empresas americanas digitais", afirmou, durante congresso da União Nacional dos Estudantes, em julho.

sf (Agência Brasil, ots)

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