Irã: o que acontece com o futuro do país após a morte do presidente

Escolher um presidente não é tarefa difícil para regime, mas morte de Ebrahim Raisi deixa em aberto a sucessão do aiatolá Ali Khamenei

Essa é uma das perguntas mais feitas por analistas de relações internacionais e diplomatas de todo mundo. Após a morte do presidente Ebrahim Raisi, conservador, mas considerado previsível e moderado, a nova eleição que deve acontecer em 50 dias, desperta temores e medo acerca de quem vai suceder o líder que gozava de grande popularidade em uma parcela conservadora da população do país.

O presidente morto em um acidente de helicóptero no domingo, 19, já tinha um longo histórico de acusações de desrespeito aos direitos humanos quando era integrante do poder judiciário. Apelidado de “carniceiro de Teerã”, Raisi esteve envolvido na morte de milhares de opositores do regime dos aiatolás no ano de 1988. Ele chegou a comandar o poder judiciário de 2019 até ser eleito presidente, em 2021.

Seja assinante O POVO+

Tenha acesso a todos os conteúdos exclusivos, colunistas, acessos ilimitados e descontos em lojas, farmácias e muito mais.

Assine

Desde a revolução islâmica que instituiu no país uma teocracia, o contexto geopolítico e regional do Oriente Médio mudou, e o Irã passou a colecionar e a cultivar inimigos. O Estado persa passou de aliado a inimigo dos Estado Unidos, e Israel passou a ser considerado um estado ilegítimo.

LEIA TAMBÉM | Entenda o regime político do Irã e o que pode mudar com morte de Raisi

Outro fator importante para entender as disputas regionais do Oriente Médio é a religião. A maioria da população iraniana segue a corrente xiita do Islã, seguida pelo regime teocrático do país.

Entender as consequências das disputas internas no Irã em decorrência da morte do presidente vai muito além de entender a sucessão do próprio cargo que ficou vago. Ebrahim Raisi não era um presidente qualquer, ele era o presidente que estava sendo preparado pelo aiatolá Ali Khamenei para sucedê-lo.

Como uma teocracia, o poder de fato no país é exercido pela autoridade religiosa. Só é candidato a presidente quem o conselho dos guardiões autoriza. Portanto, o mais provável é que o regime escolha um sucessor para o cargo de presidente de forma “fácil”, pois vem repetidas vezes demonstrando capacidade de reprimir e sufocar protestos internos. Fato que explica o boicote de eleitores nas últimas eleições legislativas, quando apenas 28 milhões de um total de 59 milhões de eleitores foram as urnas.

Entretanto, como já referido, Ebrahim Raisi estava sendo preparado para assumir o cargo de líder supremo, pois Ali Khamenei precisa de um sucessor claro para que se evite uma disputa interna após a sua morte que possa por em risco o próprio regime teocrático.

Um ponto importante a se recordar sobre a revolução islâmica que alçou ao poder o regime dos Aiatolás era a impopularidade do sistema monárquico de sucessão do xás baseado na hereditariedade do poder, algo que fez os líderes religiosos conseguirem apoio da população contra então família real.

Com a saída de Raisi da cena da sucessão, o filho dele, Mojtaba Khamenei, é o mais cotado para sucessão, o que gera desconforto dentro da estrutura de sustentação ao próprio regime, que considera que o cargo é dado por merecimento, não por herança paterna.

Irã x Arábia Saudita

Após a revolução de 1979, o regime criou a guarda revolucionária, que tem como objetivo proteger o regime e exportar o modelo de governo do país para seus vizinhos, mas diferentemente do Irã, a maioria segue o islamismo da corrente sunita.

É a partir deste ponto que entendemos a maior rivalidade dentro do mundo Islamico, a que o país tem com a Arábia Saudita, que se considera a legítima líder da comunidade muçulmana no mundo, principalmente pelo fato de abrigar os locais considerados mais sagrados desta religião.

Desde a ascensão do regime dos aiatolás, o Irã vem financiando e armando diversos grupos de orientação xiita, como o Hezbollah e os Houthis no Iêmen, além do Hamas, apesar deste ser de linha sunita. Todos estes grupos tem como objetivo lutar contra governos sunitas e pela destruição do Estado judeu.

Os posicionamentos agressivos do Irã se opõem aos interesses da Arábia Saudita, aliada tradicional dos Estados Unidos na região. O reino arábe trava guerras por procuração contra o Irã, na Síria e no Iêmen, o que faz alguns estudiosos classificarem o conflito entre ambos como “guerra fria do Oriente Medio”.

Irã x Israel

A relação do Irã com o país judeu também é uma das interrogações que qualquer evento no país persa logo é capaz de provocar. A principal dúvida para Israel, é saber qual nível de agressividade esperar de um próximo governo, seja pela mudança do presidente ou mesmo de seu líder supremo. O país hebreu continua a vigiar de perto o programa nuclear iraniano.

Além de pregar o fim do Estado judeu, é de interesse direto para Israel saber como vai continuar a ser o financiamento e o apoio do Irã a grupos que frenquentemente atacam o País. Sem suporte iraniano, o Hezbollah não conseguiria ter o arsenal de milhares de mísseis.

O programa nuclear iraniano

Essa é a “carta na manga” que o regime iraniano tem para política externa de dissuasão. Desde que Donald Trump retirou os Estados Unidos do acordo nuclear firmado entre a república islâmica e as potências mundiais, o Irã voltou a enriquecer urânio a níveis cada vez mais altos, chegando a 90%.
O país tem restringido inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea), embora continue a afirmar que o programa nuclear continue apenas a ter fins pacíficos. Apesar disso, o presidente da Aiea, Rafael Grossi vem fazendo reiterados avisos de que o país persa já tem sob sua posse entre três a seis bombas atômicas.

Fato porém, não admitido pelo Irã, pelo potencial de causar uma corrida nuclear na região. Israel poderia admitir a posse de arsenal nuclear, e a Arabia Saudita poderia dar início a um programa nuclear de fins militares, além da possibilidade de tal questão levar outra potência regional, a Turquia, a também embarcar em uma corrida nuclear. Países como a Jordânia ou o Qatar poderiam solicitar a instalação de armas nucleares americanas em seus territórios como tentativa de dissuasão.

Todas essas questões continuam a ser, e devem continuar sendo pontos de interrogação e também de ebulição para o Irã e toda região do Oriente Médio que historicamente já é uma das mais instáveis do mundo.

Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente

Os cookies nos ajudam a administrar este site. Ao usar nosso site, você concorda com nosso uso de cookies. Política de privacidade

Aceitar