Talibãs dizem que mudaram, mas países ocidentais querem julgar o grupo por suas ações

Três dias depois de o movimento islamita assumir o poder, a vida começa a ser retomada em Cabul, mas o medo está onipresente,

Os talibãs prometeram trabalhar em favor da reconciliação do Afeganistão, não procurar a vingança de seus opositores e respeitar as mulheres, mas os países ocidentais alertaram nesta quarta-feira (18) que o grupo será julgado por "suas ações, e não por suas palavras". 

Três dias depois de o movimento islamita assumir o poder, a vida começa a ser retomada em Cabul, mas o medo está onipresente, e multidões se reúnem diante das embaixadas de vários países com a esperança de obter um visto que permita a saída do país.

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Na terça-feira à noite, os líderes talibãs concederam em Cabul a primeira entrevista coletiva, durante a qual tentaram enviar uma mensagem de conciliação para o mundo. O histórico macabro do movimento em questões de direitos humanos não foi, no entanto, esquecido. 

"Todos aqueles na oposição são totalmente perdoados", disse o porta-voz dos talibãs, Zabihullah Mujahid.

"Não vamos buscar vingança", completou o homem, que mostrou o rosto pela primeira vez em muitos anos. 

Mujahid disse que o novo regime será "diferente de maneira positiva" do que o mundo conhece dos talibãs, mas que, em termos ideológicos, "não haverá diferenças".

A mensagem não tranquilizou, porém, os principais interessados. "Estou buscando desesperadamente uma forma de partir. Os talibãs odeiam os que trabalharam para organizações diferentes das suas", afirmou, um afegão de 30 anos que colaborou com uma ONG alemã.

Estrangeiros e afegãos continuam deixando o país em voos de retirada organizados por vários países.

O governo dos Estados Unidos, que já retirou mais de 3.000 pessoas, informou que encontrou "restos humanos" no trem de pouso de um avião. A aeronave foi cercada por afegãos desesperados na segunda-feira, pouco antes da decolagem, no aeroporto de Cabul.

Durante o governo talibã, entre 1996 e 2001, jogos, música, fotografia e televisão foram proibidos. Os ladrões tinham as mãos cortadas, os assassinos eram executados em público, e os homossexuais eram condenados à morte.

Este grupo islamista radical impedia que as meninas frequentassem a escola e que as mulheres trabalhassem, ou saíssem de casa, sem um acompanhante masculino. As que eram acusadas de adultério eram açoitadas e apedrejadas até a morte.

 

Mujahid afirmou que o grupo está "comprometido a permitir que as mulheres trabalhem de acordo com os princípios do islã", sem revelar detalhes.

Suhail Shaheen, porta-voz do movimento em Doha, disse ao canal britânico Sky News que as mulheres não serão obrigadas a usar a burca (véu integral com apenas uma pequena abertura na altura dos olhos) e que existem "diferentes tipos" de véu.

Nesta quarta-feira, União Europeia (UE), Estados Unidos e outros 18 países, entre eles Brasil, Canadá e Austrália, mostraram-se "profundamente preocupados" com a situação das mulheres no Afeganistão.

"As mulheres afegãs, como todos os afegãos, merecem viver com segurança e dignidade. As discriminações e os abusos devem ser evitados", afirma um comunicado.

"Vigiaremos de perto a forma como qualquer futuro governo garantirá os direitos e as liberdades que se tornaram uma parte inalienável da vida das mulheres e meninas do Afeganistão nos últimos 20 anos", completa a a nota.

Na terça-feira, o mulá Abdul Ghani Baradar, cofundador dos talibãs, retornou ao país procedente do Catar. Foi recebido por uma multidão em Kandahar (sul), a capital do movimento no período em que permaneceu no poder, até 2001, quando uma coalizão liderada pelos Estados Unidos derrubou os insurgentes.

O governo dos Emirados Árabes Unidos anunciou que o presidente afegão, Ashraf Ghani, que fugiu do país no domingo, está em Abu Dhabi.

Os Emiratos Árabes Unidos "receberam o presidente afegão, Ashraf Ghani, e sua família, por motivos humanitários", anunciou a agência oficial WAM, que citou o Ministério das Relações Exteriores.

Vinte anos depois, a chegada dos talibãs ao poder, após uma ofensiva relâmpago que coincidiu com a retirada das tropas estrangeiras do país, provoca reações diferentes.

A China se declarou disposta a manter "relações amistosas" com o grupo, e a Rússia considerou as garantias iniciadas apresentadas pelo movimento um "sinal positivo".

"Julgaremos este regime com base nas escolhas que faz e por suas ações, não por suas palavras, por suas atitudes em relação ao terrorismo, ao crime e às drogas, assim como a respeito do acesso humanitário e aos direitos das meninas a receber educação", disse o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson.

As autoridades dos Estados Unidos afirmaram que poderiam reconhecer um governo talibã, se este "preservar os direitos fundamentais de seu povo".

Nesta quarta-feira, a estátua de Abdul Ali Mazari, um político antitalibã morto na prisão em 1995, foi parcialmente destruída na cidade de Bamiyan, centro do Afeganistão.

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