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Estátuas de pró-escravagistas caem com ventos de mudança que sopram nos EUA

As manifestações sobre a morte de Floyd - que se espalharam por vários países - levaram muitos americanos a questionarem o passado racista de seu País
15:30 | Jun. 19, 2020
Autor AFP
Tipo Notícia

Armada com uma escova, Carolyn McCrea esfrega agressivamente o mármore cinza. Alguém escreveu "A vida dos brancos importa" na única estátua de um homem negro nesta avenida em Richmond, no estado americano da Virgínia, e ela tenta apagar a afronta.

Slogans semelhantes são um grito de guerra para os indignados pela explosão de apoio que o movimento antirracismo e contra a brutalidade policial Black Lives Matter tem recebido desde 25 de maio, quando George Floyd se tornou o último de uma longa lista de afro-americanos mortos dessa forma.

As manifestações sobre a morte de Floyd - que se espalharam por vários países - levaram muitos americanos a questionarem o passado racista de seu País, tendo como alvo estátuas de homens brancos que defendiam a escravidão, especialmente em cidades como Richmond.

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A cidade foi capital da Confederação, os 11 estados do sul que lutaram contra o norte, principalmente, para defender a escravidão. Com mais de 600 mil mortos, a Guerra Civil (1861-1865) foi, "provavelmente, a experiência mais traumática da nação", diz Ryan K. Smith, professor de História da Virginia Commonwealth University.

"Foi um evento cataclísmico que acabou abolindo a escravidão, que havia sido um elemento fundamental na economia e nas relações sociais deste país", completou. Muitos sulistas brancos foram ensinados a valorizar a Confederação e até a celebrá-la como parte de sua identidade, observa o especialista.

Há muito tempo, outros questionam, porém, por que uma sociedade que busca oprimir uma raça deve ser reverenciada, e o assassinato de Floyd parece ter levado a um ponto de inflexão. Somente em Richmond, três estátuas de figuras confederadas foram derrubadas pelos manifestantes desde 25 de maio.

Uma estátua do explorador italiano Cristóvão Colombo, considerada pelos grupos indígenas como um símbolo da violenta colonização dos europeus na América, também foi derrubada e jogada em um lago. Na manhã chuvosa em que McCrea encontrou o grafite, houve um momento de tensão, ao pé da estátua em homenagem ao lendário tenista negro Arthur Ashe, originalmente de Richmond. Um homem com o rosto escondido por um lenço nas cores da bandeira americana parou o carro.

Aqueles que estavam próximos suspeitam de que ele tenha sido a pessoa que vandalizou a estátua. "Ele ficava dizendo 'toda a vida importa'. Ficou muito combativo, irritado", conta Fátima Pashaei, de 38 anos.

"Não podíamos ficar de braços cruzados e deixar [a estátua] desfigurada com algo que parece uma represália e divisivo", diz McCrea, 35, que levou de casa a escova, com o qual limpava o monumento.  McCrea enfatiza que a comunidade tem "muito respeito por Arhur Ashe e por tudo o que ele representava".

"É muito estranho ter estátuas de pessoas que eram a favor da escravidão e mantinham o povo oprimido", acrescenta.  Outros, como Rick, um superintendente de 58 anos, dizem que não entendem por que estátuas representando o que chamam de "herança do sul" devem desaparecer do espaço público. "Eu posso ser um caipira [de cidade pequena], mas não sou racista", garantiu.

"Todas as vidas importam, animais, cães, brancos, espanhóis ... Todos importamos", insistiu. Para além da resistência, a mudança pode ser sentida no ar. No início de junho, o governador da Virgínia, Ralph Northam, anunciou que havia ordenado a remoção da imponente estátua de Robert E. Lee, comandante-chefe do Exército Confederado. Sua decisão foi contestada em tribunal, mas os ativistas estão otimistas.

A Câmara da cidade de Richmond apoiou por unanimidade a remoção das demais estátuas. Nas últimas semanas, várias foram pintadas: uma explosão de cores entre as belas casas da cidade e suas magnólias brancas. Jay Lambert contempla a praça onde fica a estátua de Lee. Ativistas antirracismo transformaram o local em um memorial para Floyd e para outros afro-americanos mortos pela polícia, acrescentando cartazes, frases e flores.

"É um momento muito importante na história, então queríamos fazer parte disso. As coisas que desejávamos que acontecessem... Estamos começando a ver diante dos nossos olhos", diz o engenheiro de redes, de 47 anos. O fluxo de visitantes é contínuo. Muitos chegam com os filhos, como Jennifer Dyson, acompanhada de Lily e Clara, com nove e seis anos, respectivamente.

"Eu queria que meus filhos entendessem que nem todos são tratados da mesma maneira (...) para que, quando crescerem, defendam o que é certo", explica ela.

  

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