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Veredicto contra 'El Chapo' muda pouco a geografia do narcotráfico no México

14:24 | Fev. 13, 2019
Autor AFP
Tipo Notícia

A possibilidade de prisão perpétua para Joaquín "Chapo" Guzmán nos Estados Unidos parece o final da maior e mais temida figura do narcotráfico mexicano, mas o cartel de Sinaloa que fundou mantém o seu poder, asseguram especialistas.

O cartel que leva o nome do estado de Sinaloa, onde nasceu Guzmán e uma estirpe de chefes que dominaram a quadrilha mexicana por quatro décadas, mantém incólume territórios e mercados, o que assegura a continuidade do seu império.

Para além de abonar sua lenda obscura e o imaginário do crime organizado, a queda de "El Chapo" não debilita o cartel que segue operando como um negócio transnacional bem estruturado, referem especialistas à AFP.

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"A ausência de um de seus líderes não diminui a sua atividade, eles continuam sendo o (cartel) mais importante do México e, é claro, um dos principais do mundo", diz José Reveles, jornalista e pesquisador de crime organizado no México.

O autor de diferentes livros sobre narcotráfico explica essa predominância por sua antiguidade e estrutura, construída por clãs familiares que teceram relações e lealdades pelo menos desde os anos 1980, quando o extinto cartel de Guadalajara se constituiu como a primeira grande organização de narcotráfico mexicano.

Figuras desse cartel, como Rafael Caro Quintero, Amado Carrillo e Miguel Ángel Arellano Félix, convertidos hoje em famosos anti-heróis da cultura popular, nasceram em Sinaloa e foram referências para Guzmán e sua organização, ressalta Reveles.

"É por isso que Sinaloa é forte, de lá saem os chefes mais relevantes (...) nunca se falou de uma terrível derrota do cartel de Sinaloa", afirma.

Com "El Chapo" já dentro deste sinistro "hall da fama" e sem desmerecer a "grande vitória moral" que representa a sua prisão, o ex-agente da DEA Mike Vigil assinala que o próximo objetivo para realmente enfraquecer o cartel deve ser a captura de Ismael "Mayo" Zambada, sócio-fundador junto com Guzmán.

"Esteve administrando o cartel de Sinaloa enquanto 'El Chapo' foi preso e extraditado (...) Zambada goza de um tremendo respeito entre a tropa do cartel", assegura.

Capturar ou eliminar Zambada diminuiria e, inclusive, fragmentaria o cartel, realidade da qual o chefe parece estar consciente e isso explicaria a sua discrição, em contraste com a fraqueza de Guzmán por a fama, as mulheres e os excessos.

Acredita-se que Zambada permaneça entrincheirado entre as montanhas de Sinaloa, rodeado por uma forte segurança e relutante em sair da região apesar do seu estado de saúde, debilitado pela diabetes e seus mais de 70 anos.

A defesa de Guzmán no julgamento centrou a sua alegação no fato de Zambada ser o verdadeiro líder do cartel, embora o México sempre tenha visto-o como o segundo no comando.

Pero Vigil assinala que apenas a captura dos chefes não deu os frutos esperados, que também é necessário ir atrás de sua fortuna e seus bens.

"Precisamos ir atrás de suas fontes de renda, estejam em Colômbia, Peru, Bolívia. É necessário desmantelar de cima para baixo essas organizações porque vimos que a captura de seus líderes provoca que se fragmentem em outros pequenos cartéis ou grupos criminosos (...) que disputam o controle de territórios. Isto levou a assassinatos, a massacres", destaca Vigil.

Especialistas estimam que no México atuem por volta de 100 células criminosas, muitas formadas por pistoleiros outrora a serviço de cartéis e que sem um chefe dominam territórios semeando violência.

Estas células, assinala Reveles, também sequestram, roubam, extorquem, traficam combustível e cobram direito de passagem. "Por isso há tanta violência", resume.

A cifra de homicídios no México quebra recordes ano a ano. Em 2018 disparou a 33.341, a mais alta desde o início do registro, em 1997.

Desde dezembro de 2006, quando foi lançada uma polêmica operação militar antidrogas, foram registrados mais de 200.000 assassinatos, de acordo com cifras oficiais, que não detalham quantos casos estariam ligados ao crime organizado.

O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, busca enfrentar a escalada violenta com a criação de uma guarda nacional, composta por elementos de forças federais.

Nesta quarta-feira, López Obrador disse que seu governo respeita o processo judicial contra Guzmán e pediu aos que estiverem em atividades ilícitas que reconsiderem.

"Somos respeitosos com esses processos legais. Não desejamos mal a ninguém, gostaria que aqueles que adotassem esses caminhos reconsiderassem e pensassem que a liberdade é um presente precioso", disse em entrevista coletiva.

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