Opinião: Gauck foi longe demais na crítica a Moscou
Nos 75 anos do início da Segunda Guerra, na Polônia, presidente alemão censurou duramente o procedimento de Putin na Ucrânia. E assim extrapolou sua função de "pai de família", opina o articulista da DW Volker Wagener.
Ser presidente da Alemanha significa moderar, ser capaz de mediar, significa também sempre incitar dinâmicas e discussões, mas não julgar de forma definitiva. O papel do presidente federal é a de um bom pai de família: ele deve sempre estar acima dos fatos. Ele deve representar e, até onde for possível, deixar a prática da política para o chefe de governo, o gabinete e o parlamento.
Joachim Gauck ativista político desde os seus tempos de pastor luterano na Alemanha Oriental extrapola ocasionalmente as constrições do cargo impostas pela Lei Fundamental. Sua fulminante crítica ao presidente russo, Vladimir Putin, aliada a uma quase apodíctica reivindicação de uma nova prontidão da Alemanha à defesa, é uma bomba política cujo estrondo e fumaça não se dissiparão tão rapidamente assim.
O primeiro deslize de Gauck foi a escolha do local e da ocasião para sua reprimenda à Rússia. Setenta e cinco anos atrás, o 1º de setembro foi o início da Segunda Guerra Mundial, ao fim da qual, calcula-se, entre 20 e 30 milhões de russos haviam perdido a vida. Mesmo que o ataque do presidente tenha ecoado os sentimentos mais íntimos de muitos poloneses, isso não é desculpa para tal falta de sensibilidade político-psicológica.
Sem dúvida, o procedimento militar da Rússia no leste da Ucrânia é tão ultrajante quanto contrário ao direito internacional. Contudo, numa fase tão politicamente dramática e humanamente trágica, a chamada às falas do presidente em Gdansk é pouco útil e muito menos diplomática. Que diabo terá mordido o pastor?
Há anos a política externa alemã se encontra numa espécie de renovação radical. Entre os numerosos oradores proeminentes e indicados que, no mínimo desde 2011, apelam por uma "nova política externa alemã", tem-se ouvido também o presidente reivindicar repetidamente, em declarações inequívocas, um papel mais ativo do país no mundo.
Foi o caso na Conferência de Segurança de Munique de 2014. Também no Dia da Unidade Alemã em 2013, Gauck firmou seu nome como primeiro representante da política externa do país com a mensagem: "Menos responsabilidade não é mais sustentável."
Isso não é mero acaso. É sempre em ocasiões extraordinárias como agora, no 75º aniversário do início da Segunda Guerra que o chefe de Estado conclama a mais força, mais presença da política externa alemã. E assim defende uma dissolução, de fato, de décadas de "cultura de abstinência militar".
Joachim Gauck não é, seguramente, um belicista. Mas, com sua demonstração em Gdansk, insinua-se a impressão de que, através dessa linha dura com a Rússia e com Putin, o número um do Estado alemão esteja querendo se desforrar de suas experiências com a ex-grande irmã, a União Soviética, na socialista Alemanha Oriental. Quem nos fala é, antes, Gauck, o alemão oriental, do que o presidente federal de todos os alemães. Isso é um certo excesso de liberdade pessoal para o primeiro servidor do Estado!
Outro aspecto leva a pensar: diante das relações de força em jogo, pouco conta a medalha de valentia para quem ruge mais alto, no que tange às demonstrações de poder de Moscou. O que é que Gauck quer dizer, por favor, com "adequar a prontidão para a defesa às novas circunstâncias"? É para tirarmos a poeira das centenas de tanques Leopard 2 desativados há anos, reintroduzirmos o serviço militar compulsório? Quem semeia vento tem que estar pronto a colher tempestade. Estamos prontos para isso?
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