Mães e pais reúnem-se para compartilhar vivências de saudade e amor
Com velas acesas para homenagear os filhos que não chegaram a nascer ou que se foram cedo, o "Wave of Light" — ou "Onda de Luz" — marca o Dia Internacional da Conscientização à Perda Gestacional e Neonatal
Na noite desse sábado, 15, um grupo de mães e pais, alguns com filhos pequenos nos braços ou ainda na barriga, reuniu-se para falar sobre amor e saudade. Na praça Luiza Távora, próximo à Central de Artesanato do Ceará (Ceart), acenderam velas em homenagem aos filhos que não chegaram a nascer ou que se foram cedo. Chamado "Wave of Light" — ou "Onda de Luz" —, o evento marca o Dia Internacional da Conscientização à Perda Gestacional e Neonatal.
Após fazer um momento de silêncio, seguido de palmas, em memória "dos pequeninos", o grupo realizou uma dinâmica. Cada participante que se sentiu à vontade para compartilhar as próprias vivências foi ao centro do grupo e recebeu uma rosa.
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Dentre os relatos, diversos agradecimentos pelo espaço para falar sobre os filhos. A perda gestacional é a complicação mais comum da gestação, com cerca de 20% das gravidezes clinicamente diagnosticadas evoluindo para interrupção espontânea, segundo a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa).
Mesmo assim, é como se fora daquele ambiente outras pessoas não estivessem preparadas para lidar com alguém falando sobre um bebê que não está mais aqui. Dessa forma, os pais acabam guardando memórias para si.
"Falar dos nossos filhos é mantê-los vivos dentro de nós", agradeceu uma das participantes. "A vida deles continua reverberando através das chamas", comentou outra mãe.
E é por essa dificuldade de se falar sobre o tema que o Dia Internacional da Conscientização à Perda Gestacional e Neonatal é importante, aponta Lucas Ramalho, 34. Após a perda da filha Beatriz durante a gestação, em 2019, ele e a esposa Tatiana Viana, 34, criaram o coletivo Da Dor ao Amor, que organizou o evento de sábado.
"Esse luto é difícil de ser tratado no nosso dia a dia. Às vezes, na melhor das intenções, as pessoas evitam falar (sobre ele) para evitar a dor, o sofrimento. Sendo que o momento de saber que vai ser que é pai, que o filho vai nascer, é o momento mais feliz da sua vida. Então acabam deixando de proporcionar momentos em que as pessoas falem sobre a parte mais importante e cheia de amor da vida delas", afirma Ramalho
A psicóloga Sabrina Leite, 42, passou por duas perdas gestacionais e destaca a importância de se falar sobre o assunto. Ela conta que, na gestação do primeiro filho, Heitor, em 2016, soube de duas "perdas silenciosas" na família. Já em 2019, acompanhou de perto a criação do coletivo e a formação de uma "teia" de apoio mútuo.
"Acho que esse movimento é dar visibilidade, é ter essa conscientização mesmo de fazer essas mães, esses pais, essas famílias falarem dessas vidas que existiram, independente do tempo", afirma. Além disso, Sabrina aponta a importância de se discutir temas como o tratamento recebido no próprio hospital nesses casos.
Protocolo de acolhimento na Saúde do Ceará
Na próxima quarta-feira, 19, a Sesa, por meio do do Comitê Estadual de Prevenção do Óbito Materno, Infantil e Fetal, vai realizar um fórum com profissionais da rede estadual de saúde para a implementação de um protocolo para o acolhimento dessas famílias.
Com a rotatividade de profissionais, a coordenadora técnica do Comitê Estadual de Prevenção da Mortalidade materna, infantil e fetal da Sesa, Marley Carvalho, destaca a importância de uma padronização do atendimento e de boas práticas.
"Às vezes, os profissionais são o único apoio dessas famílias, desde o momento de diagnóstico", afirma. Marley destaca ainda a necessidade de se pensar o atendimento à mãe no puerpério após a perda gestacional.
Um dos aspectos citados por ela é a saúde mental da mãe, que também pode passar por depressão pós-parto ou baby blues — tristeza materna.
"Ou então apenas por conta dos hormônios, por conta de todos conflito que essas mulheres passam no pós-parto, imagina aquela que está sem o bebê. Então precisamos realmente olhar para esse puerpério sem o bebê no braço", destaca.
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