STF declara inconstitucional norma que dispensa licenciamento ambiental para atividades poluidoras no Ceará

Ministra Rosa Weber considerou que a resolução do Coema é uma afronta a obrigatoriedade da intervenção do Poder Público na questão ambiental. Decisão do STF foi unânime

O Supremo Tribunal Federal (STF) invalidou a norma que dispensa licenciamento ambiental para atividades potencialmente poluidoras no Ceará. Para a relatora, ministra Rosa Weber, a norma estadual flexibilizou comando constitucional. Resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente do Ceará (Coema/CE), de 2019, chegou a ser questionada por advogados e teve ação ajuizada no STF. Sessão virtual que julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6288, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol), declarou a inconstitucionalidade de dispositivo da Resolução 2/2019.

Conforme avaliação do Plenário, o artigo 8º da norma "viola a Constituição Federal (artigo 225) ao criar hipóteses de dispensa de licenciamento ambiental para a realização de atividades impactantes e degradadoras do meio ambiente". Exemplo disso está o plantio com uso de agrotóxicos em imóveis com até 30 hectares.

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Presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB, o ex-parlamentar João Alfredo (Psol/CE) reconhece a importância da decisão não só para o setor no Ceará, mas para o Brasil, já que o voto da ministra Rosa Weber afirma jurisprudência e indica que outras normas semelhantes podem não ser consideradas constitucionais. O voto da relatora foi seguido pelos outros 10 ministros do STF.

"Há um processo no Brasil todo de tentar flexibilizar a legislação ambiental, em especial o licenciamento ambiental. O plantio com agrotóxico não ter licenciamento ambiental é chocante", pondera o advogado e professor. "No Brasil, às vezes é preciso dizer o óbvio. No Brasil da terra plana é preciso dizer que a terra é redonda, que o agrotóxico é poluente".

Ele continua dizendo que a própria legislação já deveria prever licenciamentos simplificados. Ação foi construída a partir da Comissão de Direito Ambiental da OAB. Foi construído um grupo de trabalho, elaborado parecer e enviado ao Ministério Público do Ceará e ao Psol estadual. "É uma vitória da luta ambiental, da luta contra os agrotóxicos. É também uma vitória da saúde e do direito ambiental", afirma João Alfredo, que assina a ação junto com o escritório do Psol em Brasília.

O voto da relatora

A ministra Rosa Weber, relatora da ação no STF, afirmou em sua decisão que "empreendimentos e atividades econômicas apenas serão considerados lícitos e constitucionais quando subordinados à regra de proteção ambiental". Ela considerou que a resolução cearense é uma afronta à obrigatoriedade da intervenção do Poder Público na questão ambiental.

Sustentabilidade

Consultor de negócios de Sustentabilidade, o educador Adalberto de Alencar considera a decisão do STF marco regulatório para o resto do País. "O STF deixa claro que a decisão tomada pelo Coema estava equivocada do ponto de vista da legislação. É uma falsa dicotomia acreditar que não é possível fazer bons negócios no setor agrícola de forma sustentável. Pelo contrário, o que mais avança no mundo são os produtos saudáveis", afirma o consultor.

Ele destaca a importância da biodiversidade local para os seres humanos e da agua, que é contaminada pelos agrotóxicos por meio das afluentes e pelo mar. "É uma química muito pesada para toda a cadeia de vida no planeta. Esse tipo de agricultura é a do passado, que não imputa novas tecnologias sustentáveis que já existem no mercado", explica.

Ele defende que o Estado precisa de uma política pública de fortalecimento de agricultura orgânica menos tímida, com investimento massivo de inovação tecnológica. "É uma delimitação legal forte, mas precisamos inovar e fazer bons negócios sem agrotóxicos. É possível e saudável para o ser humano, para os trabalhadores, para os negócios e para o planeta", conclui.

O POVO contatou o presidente da Coema, o secretário do Meio Ambiente (Sema) Artur Bruno por meio da assessoria de imprensa. O órgão informou que o intuito da resolução do Coema "foi de simplificar o fluxo de licenciamento para determinadas tipologias de atividades, em sua grande maioria com baixo potencial de causar impacto ambiental, que, apesar da denominação 'dispensa de licenciamento ambiental', assim como as demais atividades passíveis de licença ambiental, passam por um cadastramento no sistema da Semace".  E finalizou: "Diante de tal decisão, a Semace está avaliando seus impactos internamente, visando desenvolver nova sistemática de licenciamento para submissão do Conselho Estadual do Meio Ambiente – Coema, com vistas a substituir a sistemática ora criada no artigo cujos efeitos foram derrocados".

 

Segue a nota na íntegra:

"NOTA PÚBLICA SOBRE A DECLARAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 8º DA RESOLUÇÃO COEMA 02/2019 E INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO FEDERAL AO SEU ARTIGO 1º, CAPUT, A FIM DE RESGUARDAR A COMPETÊNCIA MUNICIPAL PARA O LICENCIAMENTO AMBIENTAL DE ATIVIDADES E EMPREENDIMENTOS DE IMPACTO LOCAL

Em cumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal – STF transitada em julgado em 20 de novembro de 2020, que declarou a inconstitucionalidade material do artigo 8º da Resolução do Coema/CE nº 02/2019 e conferir interpretação conforme a Constituição Federal ao seu artigo 1º, caput, a fim de resguardar a competência municipal para o licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos de impacto local, determinando a extinção da Declaração de Dispensa de Licenciamento Ambiental – DDLA para atividade que tivessem pontos de corte, ou seja, que apenas fossem licenciadas a partir de um determinado referencial, abaixo do qual seria emitido o referido documento.

O objetivo da votação da Resolução Coema 02/2019, especialmente o art. 8º, foi de simplificar o fluxo de licenciamento para determinadas tipologias de atividades, em sua grande maioria com baixo potencial de causar impacto ambiental, que, apesar da denominação “dispensa de licenciamento ambiental”, assim como as demais atividades passíveis de licença ambiental, passam por um cadastramento no sistema da Semace, conforme obriga o artigo 39, que impôs à Semace a criação de um banco de dados contendo informações sobre licenças concedidas para as obras, planos e atividades sujeitas a LAC e dispensa de licenciamento, passando por fiscalizações ambientais periódicas, assim como as demais atividades constantes da resolução.

Além disso, o fato de o empreendimento emitir uma declaração de dispensa de licenciamento, não o dispensa da solicitação de autorizações, alvarás e anuências de outros órgãos e/ou de outras licenças/autorizações previstas na legislação ambiental, quando se fizerem necessárias. Assim, fica claro que a declaração de dispensa não se tratava de um retrocesso em matéria ambiental, já que tornava mais fluido o processo de licenciamento, sem perda da qualidade da análise e mantendo o controle sobre os tipos, quantidade e características desses empreendimentos, submetendo-os, inclusive, à análise quanto à possibilidade de modificação da tipologia de licenciamento.

O que se teme com a decisão tomada é que haja uma oneração aos pequenos agricultores, produtores rurais e pequenos empresários, assentamentos, etc, que deverão arcar com os custos do licenciamento ambiental junto à Semace.

Quanto à interpretação conforme a constituição federal dada ao artigo 1º, caput, da Resolução, a fim de resguardar a competência municipal para o licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos de impacto local, a própria ementa já definia que a Resolução Coema 02/2019 “dispõe sobre os procedimentos, critérios, parâmetros e custos aplicados aos processos de licenciamento e autorização ambiental no âmbito da Superintendência Estadual do Meio Ambiente – SEMACE”. Assim, desde a sua publicação, a Coema 02/2019 não impunha aos municípios os procedimentos por ela trazidos, apesar de servir como referencial no processo de implementação das estruturas de gestão ambiental municipal.

Diante de tal decisão, a Semace está avaliando seus impactos internamente, visando desenvolver nova sistemática de licenciamento para submissão do Conselho Estadual do Meio Ambiente – Coema, com vistas a substituir a sistemática ora criada no artigo cujos efeitos foram derrocados".

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