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Universitários cearenses sentem receio de voltar às aulas presenciais, aponta pesquisa

Estudo realizado pela UVA, em parceria com UFC, Uece e IFCE, analisou os impactos da pandemia de coronavírus na saúde mental de estudantes do ensino superior no Ceará
15:53 | Nov. 20, 2020
Autor Davi César
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Tipo Notícia

A pandemia do novo coronavírus alterou drasticamente a rotina de milhares de estudantes universitários no Ceará. Para avaliar os impactos psicológicos desse novo contexto na saúde mental da comunidade acadêmica, um grupo de pesquisadores de universidades cearenses realizou estudo, com informações coletadas entre 6 de julho e 10 de setembro, para determinar as principais mudanças na qualidade de vida dos alunos.

A pesquisa foi realizada por meio de um formulário disponibilizado pela internet, divulgado por professores e unidades acadêmicas, e contou com a participação de 3.691 discentes, acima de 18 anos, de instituições de ensino superior públicas e privadas do Estado. O projeto teve a coordenação da professora do Grupo de Estudo e Pesquisa Saúde Mental e Cuidado da Universidade Vale do Acaraú (UVA), Eliany Oliveira, e ainda contou com o apoio institucional da Universidade Estadual do Ceará (Uece), da Universidade Federal do Ceará (UFC) e do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE).

O objetivo principal foi observar como está a saúde mental dos estudantes universitários durante a pandemia e quais os principais problemas enfrentados por estes estudantes durante o isolamento social. Dentre os principais resultados, a pesquisa constatou que a grande maioria dos estudantes sente receio de voltar às aulas presenciais, sobretudo, por medo de ser infectada pelo vírus. De acordo com uma parcela significativa dos respondentes, o temor é diretamente relacionado com o modo de condução da Saúde do País, por parte do Governo Federal, afirma Eliany Oliveira.

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"A preocupação com a pandemia do Brasil tem relação direta com o atual governo federal, que desestimula as medidas de proteção e não valoriza a vacina. A preocupação dos estudantes com o contexto tem a ver com a vulnerabilidade dessa gestão com o comando da Saúde", afirmou a professora.

As respostas ao questionário foram colhidas em uma escala de 0 a 10, sendo 0 referente à "nenhuma preocupação" e 10 referente a "máxima preocupação". No levantamento realizado, 1.803 estudantes (48,8%) demonstraram "muita preocupação" com o retorno dos cursos de forma presencial. Quando questionados se sentiam medo de uma infecção, 2.832 alunos (76,7%) afirmaram possuir este sentimento.

A pesquisa ainda indagou a origem da preocupação, em escala municipal, estadual, nacional e global: 1.877 (50,9%) alunos demonstram preocupação com a gravidade da doença no Ceará, 2.057 (55,7%) à gravidade da doença no município em que residem, 2.326 (63,0%) à gravidade da doença no Brasil, e 2.084 (56,5%) à gravidade da doença no mundo. Ainda, 2.849 (77,2%) relatam temor de perderem alguém próximo pela Covid-19.

"Esse receio tem a ver com a incerteza dos alunos em encontrar plano de contingenciamento e medidas de segurança adequadas no retorno à universidade, além da indisponibilidade de vacinas. Então, tudo isso gera um medo aos estudantes, de estar ali [no ambiente universitário] e contaminar familiares", complementa Eliany.

O relatório final com os principais resultados da investigação será encaminhado aos participantes da pesquisa e para as universidades participantes a fim de gerar conhecimento sobre a situação de saúde mental deles, além de ser divulgado nos sites das universidades.

+ Confira o levantamento completo do estudo "Repercussões da pandemia do novo coronavírus na saúde mental de estudantes do ensino superior"

Resultados sociodemográficos

Com base nos insumos fornecidos pelos estudantes que responderam ao questionário, os pesquisadores cruzaram dados e apresentaram conclusões com os resultados obtidos. Dentre os apontamentos mais importantes, a pesquisa destaca que o estado de saúde mental demonstra índices superiores para estudantes do sexo masculino, para alunos de instituições privadas e para indivíduos com maior poder aquisitivo.

O estudo avaliou que, embora as universidades particulares não tenham interrompido as atividades por muito tempo durante o período mais crítico da pandemia, os estudantes indicaram qualidade de vida superior, em relação a discentes de instituições públicas, principalmente, pela maior facilidade no acesso a dispositivos tecnológicos e à internet, além de diagnósticos reduzidos de ansiedade por terem ficado menos tempo em ócio.

Responderam 1.409 estudantes do gênero masculino (38,2%), 2.265 do gênero feminino (61,4%) e 17 estudantes (0,5%) marcaram "outro". A faixa etária média de alunos ficou entre 18 e 25 anos. Fortaleza (28,1%) e Sobral (20,4%) concentram o maior número de respostas. A maioria dos alunos que participaram da pesquisa é de universidade pública, 3.186 (86,3%), sendo 505 de universidades privadas (13,7%). Pardos (54,1%) responderam em maior número, seguidos por brancos (30,6%), pretos (10,4%), amarelos (2%) e indígenas (0,5%); 2,4% não preencheram o campo "raça/cor".

"Retorno não é viável no momento"

Alan Kevin, 20, é estudante do terceiro semestre do curso de Marketing da Universidade de Fortaleza (Unifor) e relata que sente falta do "calor humano" que encontrava no convívio diário com amigos da faculdade. Entretanto, mesmo preferindo aulas presenciais, o jovem não se sente à vontade para retornar ao espaço acadêmico.

"Vai sempre rolar aquele medo de ir para a faculdade. Eu não tenho o privilégio de me deslocar de carro, preciso do 'busão', e tenho medo de me contaminar e contaminar as pessoas que me cercam. Isso me causa um desconforto muito grande. O retorno às aulas seria melhor para nossa educação, mas não seria tão viável para o momento", afirma Alan. "A mudança mais drástica foi em adaptar o meu local de estudo e ter que ficar em casa, com barulho de mãe, de pai, de cachorro, de vizinho", comenta.

Situação semelhante a de Victória Alves, 22, estudante de Ciências Biológicas na UFC, que se preocupa com as aglomerações que o retorno às aulas traria e afirma ser necessário manter a modalidade remota no ensino superior, por mais que tenha mais facilidade de aprender presencialmente.

"Deixei totalmente de ver meus amigos e de sair para qualquer lugar. Meu sono ficou bastante desregulado, sempre dormindo e acordando tarde. A ansiedade aumentou muito, e acabei descontando muito na alimentação, por exemplo. Isso juntamente com a falta de exercícios foi bem problemático", conta Victória, que, para manter o equilíbrio da saúde mental, passou a se dedicar a clubes de leitura, e voltou a praticar exercícios e dançar.

Os sentimentos de Alan e Victória representam em parte os resultados colhidos pela pesquisa. Ainda de acordo com o estudo, metade dos estudantes indicou satisfação em relação às atividades pedagógicas estabelecidas pela respectiva instituição durante o período de isolamento social, enquanto a outra metade indicou insatisfação. O período demandou soluções complexas por parte de professores e gestores universitários.

"Foi necessário reinventar as aulas. Eu trabalho muito com dinâmicas de grupo e me vi sem saber fazer as dinâmicas online. Adaptei a atividade e funcionou bem para os propósitos da turma. A grande lição desse momento é que não é a mesma coisa, mas a maioria das pessoas está comprometida em colher o melhor desta situação", descreveu Liana Esmeraldo, psicóloga e professora da Universidade Federal do Cariri (UFCA).

Além de ministrar aulas, Liana também fez parte de grupo que realizou encontros para debate no projeto Trilhas do Aprendizado Remoto, que ficou ativo até o mês de agosto na instituição federal, ajudou na produção de cartilhas de orientações psicopedagógicas para discentes e prestou atendimentos psicológicos para a comunidade acadêmica, junto ao departamento de Psicologia da UFCA.

Segundo a psicóloga, os sintomas mais recorrentes nos estudantes eram relativos a ansiedade, depressão e problemas de relacionamentos com familiares, amigos e namorados. A ansiedade teve grande impacto também ao corpo docente, que, de acordo com Liana, se deu por dificuldades tecnológicas e pelo aumento da carga de trabalho para adaptar o ensino presencial à realidade online, de modo a equiparar a qualidade pedagógica.

"Não é o ideal. Existe uma grande diferença entre o ideal e o real. Foi um trabalho muito intenso, inclusive, trabalhamos muito mais na pandemia do que no desenvolvimento de atividades presenciais. Nenhum serviço da universidade parou. No que foi possível, tentou-se oferecer o necessário para que o ensino remoto acontecesse", finaliza.

Estudo propositivo

A pesquisa conclui o relatório apresentando propostas para as instituições de ensino superior melhorarem a qualidade de vida dos alunos.

a) Criação de uma força tarefa para mediar e facilitar a construção de uma política de saúde (integral e integrada) para o enfrentamento da crise e em sequência;
b) Criação de uma Câmara Técnica de Saúde Mental;
c) Pesquisa-ação (pesquisa baseada em metodologia participativa) de avaliação da situação de saúde de discentes e servidores;
d) Pesquisa longitudinal Prospectiva de avaliação do estado de saúde mental dos estudantes da IES;
e) Criação de Projeto de Extensão Universitária que tenha como objetivo o acolhimento na pós-pandemia;
f) Aprimorar o Comitê de Enfrentamento à Pandemia do Novo Coronavírus;
g) Criação de um Serviço de Apoio psicológico permanente para os estudantes, que funcione pelo menos um turno de segunda e sexta, durante 2 anos.

Retorno presencial sem previsão

O Governo do Estado do Ceará ainda não trabalha com a possibilidade de retorno presencial integral para instituições de ensino superior. Conforme o decreto de isolamento social vigente, publicado em 26 de outubro e prorrogado em 13 de novembro, estão liberadas somente aulas práticas, aulas laboratoriais e estágios para concludentes e não-concludentes de cursos de graduação e pós-graduação para as Regiões de Saúde de Fortaleza, Norte (Sobral), Sertão Central e Litoral Leste/Jaguaribe e Cariri.

Onde encontrar atendimento psicológico universitário

Clínica de Psicologia UFC

Rua Waldery Uchôa, 3A, Benfica.
Telefone: (85) 3366 7690

Clínica de Psicologia UECE

Centro de Humanidades da Uece - Av. Dr. Silas Munguba, 1700, Campus do Itaperi
Telefone: (85) 3101 9981

Clínica de Psicologia Estácio do Ceará

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Psicologia Uninassau Fortaleza

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