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Anotações nas marmitas avisavam sobre números das contas compradas

Promotores descobriram esquema ao apreender anotações com senhas e números de contas e cartões, durante vistoria em cadeias locais. Detentos pagavam entre R$ 100 e R$ 200 para "comprar" ou "alugar" contas bancárias de terceiros
09:04 | Jun. 14, 2019
Autor O POVO
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Durante a vistoria das celas, os promotores, agentes penitenciários e policiais se preocupavam com o que pudesse estar debaixo de colchões, entre as roupas, pertences ou em locais mais comuns para os presos esconderem objetos. Procuravam celulares, drogas, armas e indícios de ilícitos. De repente, passaram a notar numerações anotadas nas tampas das marmitas distribuídas aos detentos. Não souberam identificar de início, até surgir a pista do que seriam. Eram os dados de agência, conta e senha dos cadastros bancários vendidos do lado de fora da cadeia.

Com aqueles números, indicavam às vítimas dos golpes onde poderiam ser feitos os depósitos. “Achamos um monte dessas contas nas tampas das marmitas”, confirma o promotor Humberto Ibiapina, do Núcleo de Investigação Criminal do Ministério Público Estadual (Nuinc/MPCE). Segundo o depoimento de um dos presos, colhido pelos promotores após as apreensões, a orientação dada a quem venderia a conta era ir até uma agência lotérica e pedir a “operação 013”.

Este é o código do sistema da Caixa Econômica usado para a abertura de conta mais simples, bastando apresentar CPF, documento de identidade com foto e comprovante de endereço. Geralmente são contas limitadas a R$ 3 mil de saque. Por elas, os presos pagam R$ 100. Contas compradas com valores ilimitados, abertas numa agência bancária, valiam mais para o preso - até R$ 200. Porque permitiam movimentações maiores. Os promotores já identificaram que o esquema de venda das contas é dividido por bairros/áreas da cidade. Para facilitar o controle dos que participam.

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Outra curiosidade encontrada numa das celas foi uma lista de nomes (apelidos) escrita na parede. É um outro braço da investigação. Os promotores do Nuinc também rastreiam o caminho do dinheiro das mensalidades dos membros das facções. Os nomes na parede eram dos devedores do pagamento mensal, monitorado de dentro das celas pelos gerentes e chefes da organização. O valor por faccionado, em média, é de R$ 50/mês.

No sistema penitenciário cearense, as marmitas que chegavam aos detentos tinham tampa de isopor. Permitir a entrada das “quentinhas” com os dados era um dos vários momentos do esquema que dependiam da participação de agentes penitenciários. Em 2017, gestores e agentes de unidades prisionais do Estado foram presos ao ser deflagrada a operação Masmorras Abertas, que revelou esquema de corrupção para facilitar a entrada de material proibido aos que cumpriam pena. 

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