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Bar em Fortaleza com 28 anos de história luta contra despejo e resiste a demolição

Vendido há cinco anos, o imóvel agora é o único em um terreno vazio. Outros três imóveis da vizinhança foram demolidos após a venda
20:30 | Jul. 12, 2018
Autor Rubens Rodrigues
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Rubens Rodrigues Repórter do OPOVO
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Tipo Notícia
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Há quase 30 anos em um imóvel localizado na esquina da avenida Antônio Sales com a rua Carlos Vasconcelos, no bairro Joaquim Távora, em Fortaleza, o comerciante Antônio Asinair Ribeiro, 57 anos, agora luta pela sua permanência. Há cinco anos, ele foi avisado que deveria desocupar o imóvel, chamado de Esquina do Galeto, travando conflito judicial ainda em trâmite.

Em agosto próximo, ele completa 28 anos no bar onde trabalha com a esposa e mais duas pessoas. É de lá que tira o sustento da família. Cauteloso e com evidente receio em relatar a briga judicial, Asinair recebeu a reportagem do O POVO Online na tarde dessa quarta-feira, 11.

"O antigo proprietário me deu três meses para desocupar porque estava vendendo. Eu falei: "Rapaz, não é assim". Aqui é meu pontinho. Meu ganha pão. A pessoa vende pro cara ficar na mão, sem nada?", questiona. "Eu não tinha nem filho quando cheguei aqui". Hoje, ele tem três filhos - um de 27 e outros dois de 20 anos. 

Asinair conta que o atual proprietário comprou o imóvel há cerca de cinco anos. "Não foi ele quem pediu pra eu sair. Foi o antigo dono. Quando ele comprou, disse que eu teria que passar a pagar a ele o aluguel. Aí eu disse: "Eu não fiz negócio com você, meu contrato era com outro". 
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Ao ser confrontado pelo comprador, Asinair acionou o advogado Nasareno Saraiva, que conseguiu em liminar o direito de depositar o aluguel em juízo. "Aqui, trabalho com bebida e tudo. Vendo galeto. Inclusive, já tá na hora de colocar pra assar", diz enquanto prepara o alimento. "Aqui é movimentado no fim de semana. Na semana é mais pinga pinga". Antes de alugar o ponto em uma das mais movimentadas avenidas de Fortaleza, Asinair era barman em um restaurante no bairro Varjota.

"Passaram por cima do direito dele de comprar. Eles não reconhecem que têm que pagar indenização. No tribunal, tentaram derrubar a liminar que mantém ele no empreendimento, mas não conseguiram", disse o advogado. "O tempo que ele exerceu no local beneficiou aquele ponto e poderá vir a ter prejuízo se sair, que é o que o juiz vai analisar".

"Do ponto de vista social, é terrível o que poderá acontecer se ele sair de lá. Mesmo indenizado. Porque ele tem aquele lugar como parte da vida dele, o lugar que ele trabalhou quase 30 anos", pondera Nasareno Saraiva. O advogado destaca que o norte da ação é a lei No 8.245, de 1991. O texto dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes.

De acordo com o art. 33, "o locatário preterido no seu direito de preferência poderá reclamar do alienante as perdas e danos ou, depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o imóvel locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato no cartório de imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado pelo menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do imóvel".
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O outro lado

O proprietário João Américo diz que, antes de comprar o terreno, foi dado ao inquilino a preferência na compra. "Ele disse que não tinha condições de comprar e assinou os papéis confirmando que iria desocupar. Eu não compraria um imóvel sem falar antes com o inquilino", afirma. "Há tempos a gente vem pelejando com ele. O   que não posso fazer é indenizar uma pessoa que não quis comprar o imóvel".

Ao todo, João Américo diz ter comprado "três ou quatro" imóveis na vizinhança. Todos foram derrubados. O empreendedor afirma não ter planos para nenhuma grande construção no local e que deverá alugar os terrenos para pontos comerciais, "como um grande supermercado". "Se eu tivesse que depender daquele prédio, já teria morrido de fome. Segui a lei. O direito dele é entregar".

Advogado do proprietário, José Humberto Bezerra destaca que o imóvel foi adquirido com a "estrita observância a todos os preceitos, requisitos e precauções legais, tendo sido devidamente escriturado e averbado no cartório de imóveis competente". Ele diz ainda que o então proprietário concedeu o direito de preferência a todos os inquilinos que se encontravam ocupando uma parcela do imóvel. 

"Além do direito de preferência, o inquilino, em momento posterior, também via cartório, foi devidamente notificado de que o locador não tinha interesse na renovação da locação, cujo contrato previa termo em 30/04/2013. Todos os atos foram exercidos dentro das previsões legais (Art. 56, 57 e seguintes da Lei 8.245/91)", diz em nota enviada ao O POVO Online.

Ele levanta que os processos movidos pelo inquilino são de "manutenção irregular, injusta e abusiva". Ele também acusa o inquilino usar de "meios escusos e de má fé" para permanecer no local.

"O inquilino e seu patrono foram diversas vezes procurados para uma tentativa de entendimento amigável. No entanto as tentativas foram frustradas por pedidos de indenização a valores abusivos e astronômicos", continua o advogado. "Enquanto o atual proprietário é tolhido no seu direito de propriedade e posse há cinco anos, tendo pago integralmente o valor do imóvel adquirido, o atual inquilino insiste em caminhar de mãos dadas com a má fé, promovendo todas as medidas protelatórias que lhe são possível". 

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