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Quem são e o que pensam os caminhoneiros que pararam o Ceará

Uma palavra em comum entre os caminhoneiros é o desejo de tirar Michel Temer da presidência
20:58 | Mai. 28, 2018
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Há mais de uma semana em greve, os caminhoneiros concentram as atenções no País. No Ceará, diversos pontos registraram manifestações e bloqueios, como na BR-116, em Fortaleza, e BR-220, em Caucaia. Confusos, muitos caminhoneiros não conhecem nem mesmo as lideranças que os representam, mas os objetivos se conversam e variam da mudança de política de preços da Petrobras a saída do presidente Michel Temer.

Procurar uma liderança nas paralisações é tarefa difícil. Nem mesmo os comandos nacionais, como a Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam) e o Sindicato dos Caminhoneiros, são reconhecidos pela categoria. "Líder, aqui, só Deus", dizem.
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Conhecido como "Bem-te-vi", Francisco Helder, 41 anos, é quem atende a imprensa e dá respostas sobre a mobilização no KM 18 da BR-116. Caminhoneiro há 22 anos, diz que não é mais tempo de receber "esmolas do Governo", mas soluções para a sociedade. As notícias de Brasília vêm por WhatsApp, redes sociais e até pela própria imprensa, diz.

"Nós somos a base da história, o País todo é levado no lombo dos caminhões", afirma o cearense. "Ser caminhoneiro foi um sonho de criança que virou pesadelo de adulto, pela dificuldade da profissão. Mas hoje, nesse movimento, me sinto orgulhoso".
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"Bem-te-vi" diz que passou a ser visto como a voz do grupo após montar sua "base na própria carreta", onde serve café, água gelada e lanche. Muita coisa é doada pela população que, segundo ele, apoia a categoria. "É o que nos mantém aqui. Quero poder cuidar da minha família com a dignidade da minha profissão, que é o que todo trabalhador sonha".

Sem esperança

Uma palavra em comum entre os caminhoneiros é o desejo de tirar Michel Temer da presidência. Faixas pedindo intervenção militar ficam espalhadas na via, apoiadas entre os caminhões. Em veículos menores estacionados, adesivos expressando a mesma aspiração.

"Pessoas se infiltraram no nosso movimento e espalharam as faixas. Houve resistência nos três primeiros dias, mas depois ficou incontrolável", conta o porta-voz. "A intervenção militar não faz parte do movimento. Se instalou, mas não faz parte". O discurso dos infiltrados se repetiu na fala de vários caminhoneiros ouvidos pela reportagem.

"A realidade é que a gente tá à mercê, sem saber a quem recorrer", conta o cearense Amadeu Ferreira, 36. "Existe um pensamento de que o regime militar pode amparar o Brasil, não só nós caminhoneiros. A gente não vê nenhuma representação na política. Nosso intuito é a melhora pro Brasil, mas sem saber de onde sai".

Airton Freire, 52, viveu a ditadura militar. Lembra que "não podia protestar" como faz hoje, nem ficar na rua fora de hora. "Mas naquela época não tinha vagabundagem. Tinha moral. Quem era cidadão, era cidadão", pondera. "Foi uma época em que a gente vivia muito preso, por isso foi boa a chegada da democracia. Mas hoje é tanta desesperança que a democracia pode até desaparecer de novo, a gente só quer ver no que vai dar. A intervenção militar é o plano b".
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Do grito ao churrasco

Nem só de grito é feito o protesto. Para manter a paralisação é preciso também se alimentar. Isso o sergipano Josivan Alves, 45, entende bem. Morador de Fortaleza há 18 anos, montou um espaço para fazer churrasco e alimentar os grevistas e apoiadores do movimento. Não-simpatizante de nenhum partido político, Josivan não vota há 15 anos, e enxerga como farsa a movimentação pró-regime militar.

"Estou aqui desde terça (22). Aqui todo mundo é caminhoneiro, familiar ou amigo. A gente se reúne, um dá R$ 10, outro dá R$ 5. Há quatro dias a gente se junta, compra carne, assa", diz. "A maioria aqui já se conhece. Mesmo quem não é daqui, se conhece na estrada e vai formando essa corrente de amizade". Cerca de 50 pessoas ajudam a manter o churrasco dia e noite, com linguiça, bisteca de porco, carne de boi e frango.

"Intervenção militar não é reivindicação nossa. Pessoal tá pegando carona em um vácuo na nossa manifestação", denuncia o mineiro Wesley Simplício, 42. "A verdade é que não estamos paralisados aqui porque a gente quer. É que não tinha mais condição de trabalhar. É melhor a gente parar antes de quebrar do que quebrar trabalhando".
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