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Fósseis da Chapada do Araripe revestem muros de residências em Recife

Veterinário que mora em Pernambuco achou 15 peças pré-históricas em apenas um prédio. Os registros datam de aproximadamente 120 milhões de anos
09:40 | Fev. 18, 2016
Autor Amanda Araújo
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Tipo Notícia

Fósseis de peixes, folhas e insetos são encontrados em muros de prédios e casas na zona norte de Recife, em Pernambuco. Em apenas um quarteirão, o veterinário e diretor do Instituto Baobá, Alberto Campos, conseguiu achar os materiais em nove residências da avenida Malaquias. Os registros pré-históricos são extraídos do sertão do Ceará, Pernambuco e Piauí.

As rochas, chamadas de pedra Cariri, datam de aproximadamente 120 milhões, segundo o mestrando de Paleontologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Rudah Duque. “Essas pedras são comuns em cidades de interior, o pessoal usa muito nas calçadas. Os peixes, por exemplo, são da espécie Dastilbe e vêm da Chapada do Araripe. Em construções é mais fácil encontrar esses animais menores, com esqueletos conservados".

A procura de Alberto pelos fósseis começou com uma brincadeira com os três filhos e, após encontrar 15 peixes e uma asa de inseto em apenas um prédio, ele resolveu publicar o relato no Facebook. A postagem viralizou na rede social e deu visibilidade à extração desenfreada de fósseis. "Não existe comoção social para acabar com esse comércio. Em Recife, todas as casas que vendem materiais de construção comercializam abertamente essas pedras", disse ao O POVO Online.

O veterinário, que é neto do contista cearense Moreira Campos, lembra a primeira vez que viu um dos fósseis. "Há uns 25 anos vi os fósseis do Ceará e não fazia ideia da proporção daquilo. São materiais que a gente pode encontrar facilmente não só em Fortaleza e Recife, mas no Brasil todo. A fiscalização faz vista grossa. É a nossa história decorando muros”, lamenta.
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[SAIBAMAIS 2] A venda de fósseis é proibida no Brasil e, segundo Decreto-Lei 4.146 de 1942, a extração de espécimes fósseis depende de autorização prévia e fiscalização do Departamento Nacional da Produção Mineral, do Ministério da Agricultura (DNPM). O POVO Online procurou o departamento na última terça-feira, 16, mas ainda não obteve resposta.

A Polícia Federal do Ceará foi procurada na terça, mas até o momento também não respondeu as informações sobre a saída irregular de fósseis do Estado.

Patrimônio da humanidade
O paleontólogo e professor da Universidade Regional do Cariri (Urca), Álamo Feitosa Saraiva, calcula 92 frentes de exploração do calcário laminado somente entre Nova Olinda e Crato. "A grande maioria tem licença do DNPM, mas não há obrigatoriedade de um paleontólogo para acompanhar essa exploração, o que é um problema gravíssimo. E o órgão não tem capacidade para fazer a fiscalização de 12 km² entre os estados do Ceará, Pernambuco e Piauí".

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Segundo ele, há uma preocupação do órgão quanto à fiscalização de ouro, diamante, estanho, ferro e esmeralda, que geram retorno financeiro. "Essa visão faz com que o patrimônio científico e cultural vá parar no estrangeiro, porque lá tem valor, os fósseis podem ser comprados, as pessoas pagam para entrar nos museus, que são muito visitados", afirma.

As rochas calcárias são retiradas em grande escala da Chapada da Araripe, que possui uma série de fatores especiais para a perfeita preservação dos fósseis. "É um tesouro nacional, aqui foi criado o primeiro Geopark das Américas. Desde o século passado é conhecido como um patrimônio da humanidade de excelência".

Além da baixa energia da água, que evitava a destruição dos cadáveres, as rochas da área não sofreram transformações . "Pela quantidade e diversidade de preservação, é como se a Medusa [personagem mitológico] tivesse vindo para cá", diz o pesquisador.

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