Primeira Infância

A dívida do ensino remoto e o papel dos pais no pós-pandemia

A escola impulsiona o desenvolvimento das crianças. É lá que os pequenos exercitam habilidades cognitivas, físicas e socioemocionais. Portanto, pais precisam estar presentes e trabalhar junto aos professores

Foram dias, meses e anos de convívio modificados pela Covid-19. Algumas das crianças da primeira infância, de 0 a 6 anos, inclusive, nasceram no contexto da pandemia. Colocaram os pés nas escolas pela primeira vez há pouco tempo - isto é, de forma presencial. Até lá, aprenderam cores, letras e objetos de forma online, ou nem isso.

Restrições sociais afetaram todas as crianças e suas famílias, independentemente de onde vivem. "A saúde mental e o bem estar de crianças e jovens foram muito ameaçados e de maneiras que podem ter repercussões duradouras. Sabemos que o estresse vivenciado pelas famílias, questões de saúde mental e sobrecarga de trabalho também modificaram a forma como os pais se relacionam com os seus filhos. Inclusive aumentando práticas parentais negativas que envolvem o uso da violência, como tapas e palmadas", explica Elisa Altafim, psicóloga e doutora em Saúde Mental.

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Embora tenha cumprido um importante papel de ensino em um contexto extremo, no qual foi necessário o isolamento por motivos de saúde, o ensino remoto deixou a desejar no quesito socialização e autonomia da criança. "Criança é movimento", cita a professora Jeannette F. P. Ramos. Assim, a falta de contato físico com os professores, colegas e espaços públicos deixou sequelas.

"Algumas dificuldades emergiram neste contexto, como a socialização e o sentido da linguagem e da fala. Além do ensino remoto, bem antes disso, os avanços tecnológicos, por exemplo, o smartphone e o tablet no cotidiano das famílias, têm causado transtornos de ansiedade, de compulsão, de imaturidade relacional", elenca Jeannette, da Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

A tal "herança do ensino remoto" afetou a aprendizagem e a expressão oral e corporal, conforme pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal divulgada em março. Para 78% dos professores, os pequenos da pré-escola (4 a 5 anos) estão se desenvolvendo menos do que deveriam.

Além disso, há a importância da escola como espaço protetor para a criança e de acesso a serviços de alimentação e saúde. "Muitas vezes é a partir da escola que a criança é conectada com outros serviços como da área da assistência social e da saúde. Muitas crianças ficaram com uma menor cobertura vacinal. Inclusive a ausência do acesso à escola está relacionada com um menor número de notificações de violência contra as crianças. Ou seja, as crianças ficaram sem acesso a um dos contextos mais importante de proteção", frisa Elisa, que também é professora da Pós-Graduação em Saúde Mental da USP de Ribeirão Preto.

Mas sendo um ambiente de aprendizagem, é também na escola onde os especialistas concordam que está a chave para recuperar o desenvolvimento das crianças. Isso com o apoio das famílias no acompanhamento dos pequenos. "Contraditoriamente, a pandemia também despertou em muitas famílias a importância da relação direta pais-filhos e do brincar livre em espaços abertos. Por vezes, a educação das crianças vinha sendo, de forma equivocada, relegada aos professores e escolas", avalia Jeanette.

Para Elisa, a aprendizagem pode ser recuperada e o desenvolvimento das crianças, potencializado, desde que seja garantido o acesso às escolas para todas as crianças e também qualidade na educação infantil. "Precisamos ter políticas públicas efetivas principalmente voltadas para as famílias que vivenciam situações de vulnerabilidade e grande instabilidade A escola é um contexto que possibilita o contato da criança com a diversidade de perspectivas e é o caminho para combater as desigualdades existentes na nossa sociedade."

Como os pais podem ajudar os filhos?

Participar do cotidiano, de forma verdadeira e frequente, é a sugestão da professora Jeanette Ramos, também professora no Centro Integrado de Atenção ao Desenvolvimento Infantil (Ciadi) da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). Os familiares são capazes de despertar a autoconfiança e o sentimento de segurança nos pequenos.

"Os pais podem ajudar seus filhos se fazendo presentes na escuta afetiva, no diálogo sincero e verdadeiro, no sentar no chão para brincar juntos e na promoção de experiências das crianças junto à natureza, aos animais, e outras crianças e famílias", diz ela. Algumas atividades para serem realizadas em família são cozinhar, banhar, brincar, deixar e buscar na escola.

Quando procurar ajuda?

Aprendizagem, desenvolvimento motor e expressão corporal, comunicação e linguagem, saúde mental, comportamento e agressividade, regressão no comportamento e alimentação e nutrição. Esses foram algumas áreas prejudicadas no desenvolvimento das crianças durante a pandemia, de acordo com o estudo “Desigualdades e impactos da covid-19 na atenção à primeira infância”, da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e Itaú Social.

Segundo Elisa Altafim, as famílias devem estar atentas aos comportamentos das crianças, como: dificuldade de concentração, agitação, inquietude e brigas com outras crianças, tristeza, medo e preferência por brincar de forma isolada. A hora de procurar ajuda profissional especializada vai depender da frequência desses sentimentos.

“É importante que os pais conversem também com os professores das crianças nas escolas para compreender como está o desenvolvimento da criança e o aprendizado. A parceria entre escola e família é fundamental para garantir o desenvolvimento integral da criança”, conclui.

SERVIÇO

Primeira Infância em Pauta

O projeto “Primeira Infância em Pauta: desafios e oportunidades para o desenvolvimento saudável pós-pandemia” tem como foco a produção e veiculação de conteúdos de fácil assimilação sobre os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde emocional, mental e física de crianças de zero a seis anos de idade, apresentando possíveis caminhos para minimizar os efeitos negativos do prolongado isolamento social vivido nos últimos dois anos.

O principal objetivo do projeto é fomentar o debate qualificado, com participação de especialistas sobre a primeira infância, gestores públicos, educadores e sociedade civil, sobre os caminhos para propiciar o desenvolvimento sadio na primeira infância, já que é nesse período que que os vínculos e conexões afetivas mais importantes são estabelecidos, e o aspecto cognitivo tem seu crescimento mais acelerado.

Confira o calendário e todo o conteúdo do projeto no canal digital.

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