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A relação entre prática esportiva, desenvolvimento social e o desafio dos governos

Quando o esporte é prática consolidada, a sociedade se fortalece. Criar uma nova consciência social pautada no respeito exige a implementação de políticas públicas sólidas em esporte

Palavras como companheirismo, fraternidade, respeito, cooperação e solidariedade vêm sumindo do vocabulário social nas últimas décadas. A opinião é de Adriano César, professor de Educação Física da Universidade Estadual do Ceará (Uece), que associa o fenômeno à consequência de um modo de vida capitalista, mas também a uma população carente de acesso ao desporto, seja no consumo, como espectadora, ou na própria práxis esportiva. “Hoje é mais ou menos cada um por si”, lamenta.

Felizmente, o incentivo à prática esportiva pode estimular na sociedade a formação de indivíduos mais integrados, cooperativos e respeitosos, independentemente da faixa etária. A relação de práticas desportivas com o desenvolvimento social está na própria natureza da atividade. “O esporte, principalmente o esporte coletivo, tem uma característica muito importante: você sempre precisa de um outro”, conclui Adriano César.

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Duda Carvalho, 15, é estudante do ensino médio e frequenta aulas de handebol gratuitas semanalmente.
Duda Carvalho, 15, é estudante do ensino médio e frequenta aulas de handebol gratuitas semanalmente. Crédito: Mariana Parente/SPS

Duda Carvalho, 15, sabe bem disso. Há quatro meses, a estudante do primeiro ano do ensino médio ingressou em um dos times de handebol do Complexo Social Mais Infância João XXIII, em Fortaleza, e se admira com as relações que desenvolve no time, em que assume a posição de pivô. “Eu comecei a me apaixonar pelo esporte, que eu acho muito coletivo. A família que a gente cria no handebol é muito linda. A gente cria novas amizades, novos ciclos”, relata.

O professor de Educação Física da Uece destaca que o esporte estimula o confronto com adversários e a competição, mas de forma saudável, promovendo valores muito característicos e que conversam com as demandas sociais.

Mas quando a prática desportiva não acompanha o crescimento populacional, se fala menos sobre coletividade. Então as pessoas lembram menos. Praticam menos. E a sociedade inteira perde. Em um cenário como esse, políticas públicas bem estruturadas na área do esporte tornam-se imperativas.

É o caso do Complexo Social Mais Infância, equipamento que Duda frequenta. Vinculado à Secretaria da Proteção Social (SPS) do Estado do Ceará, o espaço proporciona oportunidades para crianças e suas famílias em áreas como convivência, integração familiar e desenvolvimento profissional. Atualmente, o Governo opera quatro unidades do Complexo, sendo três em Fortaleza e uma em Barbalha.

Duda participa dos treinos de handebol no contraturno. Ela sai da escola meio-dia e meia, descansa pela tarde e “fica mais preparada para jogar de noite”, quando joga duas vezes por semana. A turma é composta por 30 alunos, divididos em dois times, abrangendo crianças e adolescentes com idades entre 9 e 17 anos.

Além do handebol, a adolescente também participa do Jiu-Jitsu. “É um ótimo preparador para as pessoas, porque precisa de muita força, muita dedicação. É um esporte muito voltado para o mundo masculino, e nós, mulheres, também precisamos entrar mais nesses esportes de corpo, que são muito sexualizados”, reivindica.

Resiliência

De acordo com o fisiologista do Cruzeiro Lucas Oaks, que já passou por clubes como Ceará, Ferroviário e pela seleção brasileira sub-17, o esporte tem grande influência sobre aspectos comportamentais, como sobre as formas de lidar com a frustração da derrota e o exercício do controle emocional. “A prática esportiva libera diversas endorfinas, diversas substâncias que dão prazer e que favorecem e mantêm a adesão da prática”, explica.

O adolescente Cristian Silva,15, há dois anos é atendido pela Secretaria de Proteção Social do Ceará, que oferece diversas modalidades esportivas como fator. inclusão social.
O adolescente Cristian Silva,15, há dois anos é atendido pela Secretaria de Proteção Social do Ceará, que oferece diversas modalidades esportivas como fator. inclusão social. Crédito: Mariana Parente/SPS

Cristian Silva, 15, conheceu o handebol por estímulo do pai, que atualmente pratica hand beach, e de lá para cá já são dois anos ininterruptos de treinos no Complexo Social Mais Infância João XXIII.

"Eu gostei muito, porque tem todos os meus amigos aqui e me incentiva a jogar mais", diz o jovem, que avalia como "muito boa" a experiência. "Quando não tem handebol eu fico ansioso para jogar de novo", confessa, explicando que a atividade contribui "para desestressar a mente".

"Perder um jogo vai fazer com que a criança desenvolva uma saúde emocional, de saber entender que a derrota faz parte e que ela deve seguir em frente e deve seguir trabalhando, seguir desenvolvendo e aprimorando a sua prática", exemplifica o Lucas Oaks, apontando que a experiência traz implicações positivas no futuro, gerando ganhos sociais.

“Isso vai fazer com que a vida profissional dessa criança, depois com seus 22, 23 anos, seja muito mais saudável, já que ela vai conseguir lidar com essa frustração no emprego, de nem sempre ser a melhor do seu setor, de nem sempre conseguir fechar os melhores negócios, mas de entender que isso faz parte de um processo e que é o nosso dever seguir trabalhando e seguir aprimorando".

Inclusão social

A prática esportiva emerge como uma ferramenta de integração social e ascensão econômica para muitos que vivem em um contexto de desigualdade social. Além de promover valores como trabalho em equipe, respeito e fair play, o esporte contribui para a construção de uma sociedade mais inclusiva e saudável, gerando oportunidades de profissionalização.

"O esporte é um meio de mudar a vida das pessoas tanto pelos benefícios biológicos e sociais, mas também com os benefícios financeiros e econômicos disso. O esporte hoje é um meio, é uma indústria onde movimenta bilhões de reais por ano e os seus participantes, os seus praticantes que se profissionalizam e têm um destaque, também têm nessa remuneração um forte fator de integração e ascensão social", diz o fisiologista Lucas Oaks.

Ainda na perspectiva econômica, um país que possui sua população com hábitos saudáveis gera menos gastos com saúde pública, elevando a qualidade de vida coletiva e promovendo desenvolvimento socioeconômico.

Para o professor Adriano César, da Uece, o desafio dos governos brasileiros, seja nas esferas municipais, estaduais ou federal, é promover acesso ao esporte através de políticas públicas, apesar da desigualdade social brasileira.

"A grande maioria da nossa população tem outra preocupação, que é com o emprego, com a renda da população para sua família, então um assalariado não vai ter recurso para pagar uma mensalidade esportiva para o seu filho praticar esporte", equaciona o professor.

"No Brasil, sendo um país que depende muito do governo para o desenvolvimento de políticas públicas, as pessoas que fazem parte do esporte precisam ter representantes fortes e que lutem pelo esporte para implementar todas essas políticas públicas e transformar toda essa sociedade", opina Adriano César.

 

Saiba mais sobre este assunto

O que: transmissão ao livo (live)
Tema: O esporte como fator de inclusão social: a importância da implantação de políticas públicas para incentivo à prática esportiva
Onde: Canal do O POVO no YouTube
Quando: terça-feira, 7 de maio, às 11h

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