Moratória da soja: AGU pede 120 dias ao STF para governo tentar acordo e evitar fim do pacto

Moratória da soja: AGU pede 120 dias ao STF para governo tentar acordo e evitar fim do pacto

A Advocacia-Geral da União (AGU) protocolou, nesta terça-feira (30), no Supremo Tribunal Federal (STF), pedido de prorrogação por 120 dias da suspensão do artigo 2º da Lei nº 12.709/2024, de Mato Grosso, que veda incentivos fiscais a signatárias da Moratória da Soja. O objetivo é abrir prazo para tentativa de conciliação no âmbito do governo federal antes da entrada em vigor da norma, prevista para amanhã, 1º de janeiro de 2026. O pedido foi dirigido ao ministro Flávio Dino, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7774.

A iniciativa atende a solicitação formal do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Em ofício de 8 de dezembro, o ministro substituto João Paulo Capobianco pediu à AGU que "requeira ao STF um prazo maior para que o Poder Público possa concluir o processo no âmbito da Sejan/AGU" - referência à Câmara de Promoção de Segurança Jurídica no Ambiente de Negócios, órgão da própria Advocacia-Geral.

No ofício, Capobianco solicita que a Sejan seja acionada para, "em consonância com os marcos legais pertinentes à adequada preservação dos direitos e responsabilidades que regem as partes interessadas, tratar da moratória da soja e balizas normativas de promoção de acordos entre privados que promovam a conservação ambiental". O documento afirma que o processo deve "considerar as preocupações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), relacionadas às práticas concorrenciais, e para balizar a discussão no âmbito do STF".

Na petição ao ministro Dino, a AGU sustenta que reportagens recentes indicam que empresas avaliam abandonar a Moratória para preservar benefícios fiscais em Mato Grosso. "O debate nesta ação de controle concentrado tem o mérito de buscar um marco jurídico seguro para todas as empresas do importante segmento do Agronegócio. É incompatível com essa virtude uma litigiosidade exagerada, com contendas múltiplas, transformando precocemente, para outras instâncias judiciais e administrativas, conflitos entre empresas envolvendo bilhões de reais", diz o documento.

A AGU classifica a situação como "hiperlitigiosidade" e menciona "ao menos 02 (duas) ações coletivas" em tramitação nas comarcas de Cuiabá (MT) e Santos (SP), além de investigações do Cade sobre suposto cartel e múltiplas ADIs no STF.

No mesmo dia, o Instituto Centro de Vida (ICV) e o Observatório Socioambiental de Mato Grosso protocolaram estudo econômico que aponta prejuízos ao próprio agronegócio caso a Moratória seja encerrada. A análise, coordenada pelo professor Joaquim Bento de Souza Ferreira Filho, da Esalq/USP, com apoio do Instituto Clima e Sociedade, projeta impactos até 2035 utilizando modelo de equilíbrio geral computável (TERM-BR).

O estudo aponta redução do Produto Interno Bruto real nacional entre 0,01% e 0,02%. Em Mato Grosso, porém, a retração pode alcançar 0,24%, dez vezes superior à média nacional. O Estado concentra grande parte da produção de soja da Amazônia Legal.

Segundo a análise, a expectativa de enfraquecimento das salvaguardas ambientais elevaria em 5% a 6% os custos operacionais da soja e derivados, em virtude da necessidade de certificações individuais de rastreabilidade exigidas por importadores europeus. Para manter a rentabilidade atual, seriam necessários prêmios de US$ 4 a US$ 5 por tonelada de soja e US$ 10 a US$ 11 por tonelada de farelo - "valores que excedem amplamente os prêmios pagos por certificações voluntárias existentes", afirma o documento.

O estudo conclui que "o mercado não absorve, no curto e médio prazo, os custos adicionais gerados pela perda de um mecanismo coletivo de garantia ambiental, o que reforça a probabilidade de dano econômico concreto e imediato".

O cenário mais adverso seria o desvio de comércio, com perda de acesso a mercados premium europeus e redirecionamento para a Ásia, onde preços são inferiores. "Trata-se, portanto, de perda objetiva de valor, e não de simples rearranjo comercial", afirma o ICV. O documento conclui que se busca evitar "não apenas um dano irreparável ao meio ambiente, mas também um efeito em cadeia absolutamente catastrófico para toda a estrutura agrícola do Estado".

Além da AGU e do ICV, o Greenpeace Brasil também protocolou um pedido de prorrogação da suspensão, citando risco de abandono do pacto para preservar R$ 4,7 bilhões em incentivos fiscais concedidos entre 2019 e 2024, segundo o Tribunal de Contas de Mato Grosso. Anteriormente, em 15 de dezembro, ICV, Greenpeace, WWF Brasil, Observatório do Clima e os partidos autores da ADI já haviam pedido a manutenção da suspensão integral.

A Aprosoja Brasil e a Aprosoja-MT, porém, pediram ao STF em 17 de dezembro a rejeição do pedido de prorrogação. Em petição, as entidades argumentam que o prazo de transição fixado em abril é suficiente e que o pedido de adiamento não apresenta fatos novos. As entidades defendem que a entrada em vigor do artigo 2º não interfere no julgamento de mérito e que a lei estadual não estimula desmatamento ilegal.

O governo de Mato Grosso publicou, na terça (30), decreto que regulamenta a aplicação da lei estadual. Em nota, o governador em exercício Otaviano Pivetta afirmou que "o Estado não interfere em decisões privadas das empresas, mas também não pode conceder benefícios públicos a quem adota restrições que vão além da legislação brasileira".

A Moratória da Soja é um pacto voluntário de 2006 entre cerca de 30 tradings, ONGs e governo federal que proíbe a compra de soja de áreas desmatadas na Amazônia após julho de 2008. Entre as signatárias estão ADM, Bunge, Cargill, Cofco e Amaggi. A decisão de abril do STF, referendada por 7 votos a 3, estabeleceu que o artigo 2º entraria em vigor em 1º de janeiro de 2026.

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