Uso da verba emergencial para setor do turismo apresenta irregularidades

Parte do orçamento federal direcionado à recuperação do setor de turismo frente aos impactos da Covid-19 teria sido utilizada para outros fins, segundo denúncia do O Estado de S.Paulo desse sábado, 4; entenda

Parte do orçamento federal direcionado à recuperação do setor de turismo frente aos impactos da Covid-19 teria sido utilizada para outros fins, de empreendimentos a um museu de futebol do Flamengo. A denúncia foi feita pelo jornal O Estado de S.Paulo em reportagem publicada nesse sábado, 4. Outra parcela do dinheiro teria sido enviada a políticos investigados, associados a acusações de peculato e corrupção.

Os recursos em questão, no valor total de R$ 5 bilhões, deveriam impedir recuperações judiciais e falências de empresas do setor durante a pandemia. Além disso, o Tribunal de Contas da União (TCU) havia determinado que as quantias deveriam ser entregues a pequenas e médias empresas e servir apenas em obras civis para adaptação de estabelecimentos às necessidades surgidas com a pandemia.

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O dinheiro é custeado pelo Fundo Geral do Turismo (Fungetur), ligado ao Ministério do Turismo, e foi encaminhado a bancos públicos credenciados espalhados pelo Brasil. Nesse sistema, eram as instituições financeiras as responsáveis por repassar operações de crédito aos empresários de turismo. Dados de uso da verba estão nas prestações de contas dos bancos. Especialistas consultados pelo Estadão confirmaram a existência de irregularidade e desvio na execução do orçamento.

Empréstimos milionários

Um dos casos destacados pelo Estadão está ligado ao Banco do Estado de Sergipe (Banese). A instituição recebeu R$ 17 milhões de ajuda emergencial. 76% desse valor foi repassado, em junho deste ano, para a empresa Vista Xingó Empreendimento Ltda, aberta pelo desembargador Aldo de Albuquerque Melo; o repasse foi direcionado a um resort na cidade de Piranhas, em Alagoas, na Rota do Cangaço.

O pedido de empréstimo desse caso, feito em dezembro de 2020, foi atendido com R$ 13 milhões. Dois diretores do Banese, Olga Carvalhaes e Renato Cruz Dantas, se demitiram naquele mês e se tornaram sócios da Xingó em maio, um mês antes da liberação do dinheiro para o resort. As obras do empreendimento já receberam alvarás e licenças. Operações do Banese eram acompanhadas pelo TCU desde 2018 devido ao fechamento de empréstimos com empresas de grande porte.

Outro caso notório é o da construção do museu do Flamengo, anunciado em novembro passado ao custo de R$ 18 milhões. Do valor total, R$ 3,7 milhões vieram de empréstimo realizado pela Agência Estadual de Fomento do Rio (Agerio), que recebeu R$ 67 milhões da verba emergencial para o setor de turismo. A operação de crédito foi feita em parceria com a Mude Brasil, que também será responsável pela construção do museu juntamente com o clube.

Acompanhamento da verba

Em processo de acompanhamento das despesas federais durante a pandemia, o TCU solicitou explicações, em junho de 2020, sobre o uso do dinheiro do Fungetur. O relator do processo, ministro Bruno Dantas, afirmou que “obras civis e empreendimentos turísticos não parecem atender a requisitos de urgência”. Outro julgamento em movimento prevê a análise do uso da verba emergencial liberada pelo governo.

A Corte decidiu, neste julgamento, que o dinheiro pode ser usado para três fins: empréstimos de capital de giro, para que hotéis, agências de turismo, transportadoras, entre outros do setor, pudessem manter as contas em dia e pagar funcionários; a manutenção de obras paralisadas em razão da crise; e adequações da estrutura dos locais para as necessidades que surgiram com a pandemia. A liberação dos R$ 5 bilhões continua sendo assistido pelo TCU.

O órgão também questionou os critérios de liberação, por parte do governo federal, de R$ 500 milhões ao Banco de Brasília (BRB) e outros R$ 500 milhões ao Banco do Nordeste, visto que essas instituições “nunca operaram com linhas de crédito” do fundo. Os bancos liberaram apenas R$ 33 milhões. Um dos favorecidos foi um restaurante erguido em área de preservação ambiental do Ceará.

O BRB liberou R$ 17 milhões, segundo as prestações de conta consultadas pelo Estadão. Mais da metade desse dinheiro foi parar em empresas conectadas a políticos investigados. Um deles é o ex-governador Paulo Octavio, hoje presidente do PSD-Brasília, que recebeu R$ 3 milhões. Com patrimônio de R$ 300 milhões, ele é réu na Operação Caixa de Pandora; o Ministério Público já pediu para ele, nas alegações finais, 24 anos de prisão por corrupção.

Envolvidos comentam

Alguns dos personagens envolvidos nos repasses da verba emergencial do setor de turismo foram contatados pelo Estadão. O Ministério do Turismo declarou que a legislação “prevê que o risco da operação é 100% da instituição financeira credenciada” e que o orçamento pode ser devolvido caso fique parado nos bancos.

“Caso o recurso extraordinário não seja utilizado, este deverá ser devolvido futuramente aos cofres do Tesouro Nacional e, em hipótese alguma, poderá ter desviada a sua finalidade, podendo a instituição financeira sofrer sanções de acordo com as cláusulas previstas em contrato e a legislação pertinente”, informou.

Paralelamente, o Banese declarou que “obras civis e implantação de empreendimentos turísticos” são os destinos de seu contrato com o Fungetur. Já a Vista Xingó afirmou ter recebido apenas R$ 4,6 milhões; em nota, também disse que os ex-diretores do Banese “não participaram ou participam de qualquer tratativa sobre a operação de crédito”.

Administradora do Museu do Flamengo, a Muse Brasil destacou que as obras do empreendimento permitirão “a melhor aplicação das normas sanitárias de prevenção à Covid-19” e “também preveem a geração de mais de 3.600 empregos diretos”. A Agerio adicionou que “o cronograma de execução do projeto de ampliação do museu foi significativamente impactado pelos efeitos da pandemia da Covid-19”, sustentando que a obra “está em linha” com as orientações do TCU.

Enquanto o BRB pontuou que suas operações de crédito “seguem as normas do programa do Ministério do Turismo”, o BNB explicou que a operação associada do dinheiro do Fungetur não envolvia crédito extraordinário.

Com informações de Estadão

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