Trabalhador em situação análoga à escravidão é resgatado em Juazeiro do Norte

Homem vivia há 3 anos dentro de uma pedreira de extração manual de granito, em um barraco de lona. Ele era remunerado por produção, sem registro e direitos trabalhistas

15:58 | Nov. 06, 2025

Por: Alice Barbosa
Estima-se que serão lavrados 26 autos de infração nas duas pedreiras que foram fiscalizadas em Juazeiro do Norte (foto: Reprodução/ Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT))

Um homem de 61 anos foi resgatado de um trabalho em situação análoga à escravidão, em uma pedreira de extração manual de granito, no município de Juazeiro do Norte, na região do Cariri cearense.

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O resgate do trabalhador ocorreu no dia 27 de outubro deste ano, durante a operação dos Auditores-Fiscais do Trabalho em combate à exploração laboral em empresas de extração manual de pedras.

A ação integra o conjunto de inspeções interestaduais realizadas entre o dia 26 de outubro e quarta-feira, 5, nos estados do Ceará, Piauí e Pernambuco, coordenadas pela Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Há cerca de três anos, o trabalhador vivia dentro da pedreira, em um barraco de lona sustentado por galhos sobre o chão batido.

Ele dormia em uma rede, em meio a materiais de trabalho, alimentos e pertences pessoais espalhados ou pendurados em cordões.

Sem instalações sanitárias, as necessidades fisiológicas eram realizadas no mato, e o banho tomava-se com baldes e canecas, atrás do barraco. Tampouco havia local adequado para alimentação ou acesso a água potável.

O trabalhador preparava e cozinhava a comida em uma fogueira acesa diretamente sobre o chão. Para isso, ele usava uma grelha improvisada, e consumia o alimento no mesmo ambiente.

A água levada pelo empregador era armazenada em vasilhas sem higienização e e consumida sem qualquer tipo de filtragem ou tratamento, sendo utilizada para beber e preparar as refeições.

Além das condições degradantes de trabalho e moradia na pedreira inspecionada, a equipe constatou a ausência total de registro e direitos trabalhistas.

O homem era remunerado por produção, sendo o material extraído aproveitado exclusivamente pelo proprietário da pedreira.

“Há uma generalizada não valorização e exploração da situação de vulnerabilidade dos trabalhadores de pedreiras da região do Cariri. Os trabalhadores recebem muito pouco pelo milheiro de pedras cortadas, o que os mantém em situação de pobreza”, afirma o auditor-fiscal do trabalho, Maurício Krepsky, que participou dessa operação.

No lugar também havia riscos graves à integridade física de um trabalhador idoso. Ele não utilizava Equipamentos de Proteção Individual (EPI), nem havia sido submetido a exame médico e não possuía qualquer vínculo formal de emprego.

O trabalhador em idade avançada relatou sentir fortes dores nas costas. À equipe, ele afirmou que “não conseguia mais produzir o suficiente para garantir seu próprio sustento, dependendo de auxílio externo para sobreviver".

Os auditores-fiscais identificaram atividade de corte e desmonte manual de rochas, com uso de ferramentas rudimentares como marretas, ponteiros e picaretas.

A equipe também encontrou “explosivos artesanais compostos por pólvora negra, salitre e carvão, detonados de forma empírica por meio de fio elétrico descascado conectado a uma bateria de automóvel, prática que representa grave risco de mutilação e morte”.

A Secretaria de Inspeção do Trabalha (SIT) trabalhador será encaminhado para acompanhamento médico e avaliação de nexo causal.

Quem é o empregador?

Todas as pessoas e empresas autuadas por trabalho análogo à escravidão são divulgadas na Lista Suja, após os processos legais previstos.

Estima-se que serão lavrados 26 autos de infração nas duas pedreiras que foram fiscalizadas em Juazeiro do Norte, no Ceará, de acordo com o auditor-fiscal Maurício Krepsky.

Ele informa que as atividades foram interditadas e relatórios técnicos entregues às empresas com as orientações do que fazer para suspender a interdição e promover um ambiente de trabalho sem grave e iminente risco de doenças ou acidentes do trabalho.

“Esse cenário tende a normalizar a situação de condições degradantes de trabalho, que é uma das modalidade de trabalho análogo à escravidão. Muitos são analfabetos, como o trabalhador resgatado, que tinha 61 anos”, completa.

Como denunciar?

Por meio do Sistema Ipê disponível no site, casos de trabalho análogo à escravidão podem ser denunciados de forma anônima e segura.