Prefeitura de Caucaia derruba barraca de povo indígena no Cauípe e provoca manifestações

Grupo contesta que área onde equipamento estava instalado se encontra em processo de demarcação territorial. Órgão municipal alega que barraca era irregular

A Prefeitura de Caucaia, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), ordenou a derrubada, na manhã desta quinta-feira, 16, de uma barraca pertencente aos indígenas da etnia Anacé, que estava instalada próximo à Lagoa do Cauipe. Indígenas realizaram manifestações após ação ser concluída, frisando que área se encontra em processo de demarcação. Órgão municipal alegou ao O POVO que equipamento era irregular.

De acordo com Paulo França, liderança Anacé, agentes da Secretaria de Planejamento de Caucaia (Seplan) chegaram ao local por volta das 6 horas dessa quinta, 16. "Eles chegaram e retiraram tudo sem avisar, levando todo material que estava na barraca, sem aviso e sem informar para onde foram os objetos", relata o representante.

Seja assinante O POVO+

Tenha acesso a todos os conteúdos exclusivos, colunistas, acessos ilimitados e descontos em lojas, farmácias e muito mais.

Assine

Logo após derrubada do equipamento, os indígenas se reuniram e realizaram uma manifestação na sede da Seplan, contando com a presença de advogados. O ato de protesto aconteceu durante a tarde de ontem e foi reforçado por uma nota de repúdio emitida pelo povo originário.

LEIA MAIS | Ceará recebe mais dois lotes das vacinas Pfizer e AstraZeneca nesta quinta-feira, 16

"Repudiamos a ação da Prefeitura de Caucaia, que hoje em horário não comercial derrubou a barraca do nosso povo na barra do Cauípe. A Prefeitura ainda não entendeu e aceitou que somos um povo indígena que existe e mora em um território onde o Cauípe faz parte, e para que sejam feitas quaisquer alterações deve haver uma pesquisa prévia", dizia trecho da nota.

O documento ainda pede a intervenção de órgãos como a Fundação Nacional do Índio (Funai). Uma das reclamações principais dos indígenas é a de que barraca estava instalada em um território que se encontra atualmente em processo de demarcação, o que justificaria, segundo os indígenas, a necessidade de diálogo e consulta antes da ação de derrubada.

Grupo emitiu uma nota em protesto
Grupo emitiu uma nota em protesto (Foto: Reprodução/ WhatsApp)

"Temos que ser pré-consultados em qualquer atividade que ocorra no território. Prefeito não reconhece que a área é indígena e está em processo de demarcação, e quer transformar a região em um grande empreendimento turístico pra ricos", destacou Paulo.

Área de Proteção Ambiental

 

Procurada pelo O POVO, a Prefeitura de Caucaia, por meio da Seplan, informou que o território é uma Área de Proteção Ambiental (APA) que passa por um "processo de requalificação urbana e ambiental". Órgão frisou ainda que o perímetro da área "não é demarcado oficialmente como território indígena" e que a barraca não teria autorização federal, sendo uma "ocupação irregular".

Entidade também relatou que o responsável pelo equipamento estava sendo notificado desde o inicio deste ano e que havia chegado a desocupar a barraca em abril. No entanto, ele teria voltado a realizar uma outra edificação desse porte logo depois (veja nota na íntegra ao fim do texto). 

Ainda segundo a Seplan, o Instituto de Meio Ambiente (Imac) recebeu um dos representantes legais dos indígenas durante a tarde de ontem. "Ficou acordado que todo o material retirado será devolvido mediante solicitação e compromisso de não cometer novo crime ambiental", informou órgão. 

Processo de demarcação territorial 

 

O processo de demarcação de terra é regulamentado pelo Decreto nº 1775/96 e busca compreender e apontar os limites dos territórios ocupados pelos povos indígenas. Segundo Péricles Moreira, um dos advogados responsáveis pelo acompanhamento legal do povo Anacé, foi aberto um procedimento desse tipo na Funai para reconhecer o pertencimento do grupo ao território que compreende à Lagoa do Capuí.

Ainda em fase inicial, de "identificação e delimitação", o processo busca fazer um "levantamento do histórico dos povos na terra". Péricles relata também que, mesmo que não exista ainda uma demarcação documentada, a Prefeitura de Caucaia deveria ter estabelecido uma conversa prévia com o grupo.

"Não houve a comunicação dessa derrubada, para as pessoas se prepararem, saber o que vão fazer com suas coisas", destacou o advogado. No inicio deste ano, outra barraca dos povos indígenas havia sido retirada da área. Além do grupo, pescadores também mantém equipamentos desse porte na região. 

O representante esclarece que há, no Ministério Público, um inquérito para apurar se é recomendada a retirada das barracas instaladas naquela área litorânea, mas que não há uma decisão judicial que determine a derrubada. 

"Isso (projeto de requalificação) é em detrimento dos pequenos, enquanto existem empreendimentos gigantescos que não sofrem intervenção", critica o advogado. Conforme Moreira, a representação indígena vai buscar agora formar uma "grande articulação" com órgãos como o Ministério Público do Ceará (MPCE), em busca de uma fiscalização do projeto.

Veja nota da Prefeitura de Caucaia na íntegra:

A Prefeitura de Caucaia afirma que preservar o patrimônio natural e garantir o desenvolvimento ambiental e turístico do caucaiense é uma das prioridades da gestão municipal. Com o objetivo de proteger o meio ambiente, nesta quinta-feira (16), foi dada continuidade ao processo de requalificação urbana e ambiental da Área de Proteção Ambiental – APA do Lagamar do Cauipe, com a retirada de uma barraca irregular às margens da lagoa.

A ação foi conjunta entre a Secretaria de Patrimônio da União - SPU/CE e a Prefeitura de Caucaia. Ressalta ainda que o perímetro da APA não é demarcado oficialmente como território indígena, nem confronta com tais territórios. Além disso, a área havia sido ocupada recentemente sem qualquer autorização federal, estadual ou municipal.

O responsável pela ocupação havia sido notificado diversas vezes desde fevereiro deste ano, chegando a realizar a desocupação no dia 30 de abril de 2021, mas, em seguida, realizou nova edificação irregular.

 

Colunistas sempre disponíveis e acessos ilimitados. Assine O POVO+ clicando aqui

Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente

Os cookies nos ajudam a administrar este site. Ao usar nosso site, você concorda com nosso uso de cookies. Política de privacidade

Aceitar