Da periferia à COP30: Marcele Oliveira leva justiça climática ao centro das negociações globais

Da periferia à COP30: Marcele Oliveira leva justiça climática ao centro das negociações globais

Confira entrevista exclusiva do O POVO com a brasileira Marcele Oliveira, que atua como Jovem Campeã do Clima
Atualizado às Autor Carol Kossling Tipo Notícia

Uma das principais vozes da juventude brasileira na luta por justiça climática, Marcele Oliveira, 26, é de Realengo, no Rio de Janeiro, e representou o Brasil, sendo escolhida como Jovem Campeã do Clima da Presidência da COP30 (PYCC), após um edital público inédito da Secretaria Nacional de Juventude que recebeu 154 candidaturas.

A nomeação, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), marcou a primeira vez que o Brasil selecionou uma representante jovem para o cargo, garantindo que as demandas e perspectivas das juventudes, especialmente das periferias, estivessem presentes nas decisões da cúpula do clima da ONU.

A trajetória de Marcele é vinculada ao ativismo comunitário e ao combate ao racismo ambiental. Formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), produtora cultural e cofundadora da coalizão “O Clima é de Mudança”, ela é também diretora-executiva do Perifalab.

Sua atuação começou ao observar desigualdades ambientais em bairros periféricos, menos árvores, mais concreto e maiores ondas de calor, o que a levou a compreender, na prática, os efeitos do racismo ambiental. Essa mobilização resultou em uma das conquistas mais simbólicas da sua trajetória, a criação do Parque Realengo Susana Naspolini, em uma área que antes abrigava uma fábrica de munição, transformando um território de risco em espaço de convivência e arborização.

Como Jovem Campeã do Clima, Marcele defende que a resposta global à crise climática precisa partir das periferias, territórios onde os impactos com enchentes, secas e calor extremo, são mais imediatos e intensos.

Com experiência nas COPs desde a edição de 2022, no Egito, ela lançou o Mutirão das Juventudes, plataforma que mapeia iniciativas de jovens do Sul Global, com foco em meninas, jovens negras, indígenas e comunidades tradicionais.

Da periferia à COP 30: confira entrevista exclusiva

O POVO - Qual é a maior urgência que a juventude brasileira traz para a mesa nesta COP30, considerando os biomas e a realidade local do Brasil?

Marcele Oliveira - As juventudes do Brasil, mas também as juventudes do mundo, pedem ação e implementação dos acordos internacionais. Se não tiver impacto e resultado nos nossos territórios, nos nossos biomas, para gente não funciona.

Portanto, é importante o mapa do caminho para o financiamento, triplicar os valores que são investidos em adaptação e também fazer a transição para longe dos combustíveis fósseis.

No caso do Brasil e de outros países onde há florestas, também é muito importante a demarcação das terras indígenas e o respeito às tecnologias e saberes ancestrais, com a valorização das soluções baseadas na natureza.

São palavras um pouco técnicas, mas que na verdade falam sobre proteção da vida, respeito aos povos.

O POVO - Como sua formação e trajetória influenciam o modo como você aborda as negociações climáticas?

Marcele - As salas de negociações são repletas de representação dos países que têm a mão na caneta, mas não têm a mão na terra. É importante e essencial para conduzir os processos multilaterais que nós tenhamos a participação de quem de fato está nos territórios.

E para isso é necessária articulação do local para o global, considerando os processos burocráticos e metodológicos que foram feitos até aqui, dentro dos acordos da ONU, mas também o dia a dia e a realidade da emergência climática que impacta a vida das pessoas.

É necessário termos mais Marceles, é necessário termos mais juventudes e é necessário que existam mais programas de formação, de apoio e de valorização do importante trabalho que as juventudes exercem na proteção da natureza.

O POVO - Como o programa jovens negociadores te ajudou?

Marcele - Ele me ajudou a compreender o que são os processos multilaterais e a importância do trabalho que eu já realizei em Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, na luta pelo Parque Verde.

O POVO - O que o Brasil pode fazer de diferente ou de mais ambicioso nesta COP para realmente avançar no enfrentamento das mudanças climáticas; não só em discurso, mas em ação?

Marcele - Com o Brasil na presidência da COP30, isso quer dizer que o Brasil é um facilitador para que as melhores decisões climáticas saiam desse espaço.

A partir do que já foi acordado e conversando nesses últimos 30 anos de conferência de clima, a gente entende que o que o Brasil pode fazer de mais ambicioso é olhar para aquilo que é tão importante para valorizar o conhecimento que vem dos territórios e proteger à vida, combatendo as desigualdades, o racismo ambiental e olhando para a questão da justiça climática como uma prioridade.

O POVO - Na prática, o que isso quer dizer?

Marcele - Quer dizer, liderar a transição para longe dos combustíveis fósseis, liderar o financiamento para a proteção das florestas e para a adaptação, combater o negacionismo e garantir a integridade da informação sobre o clima e, também, valorizar aquilo que existe nos territórios.

Ou seja, a solução baseada na natureza, na cultura, e a partir desta lógica conduzir, sempre, negociações que puxem outros países para que estejam na articulação para que o planeta possa continuar sendo habitado por nós de uma forma não exploratória e sim resiliente.

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