BA: Após ataque em escola, boatos sobre massacres assustam estudantes
Boatos assustaram estudantes e responsáveis em escola da Bahia
Era um dia de aula comum para Fábio* (nome fictício a pedido da fonte), de 15 anos, estudante do 1º ano do Ensino Médio do Colégio Antônio Vieira, até receber mensagens de colegas através de grupo de WhatsApp sobre ameaça de massacre na escola. Na manhã desta quinta-feira (29), uma parede do banheiro masculino do Ensino Médio foi encontrada com pichação da palavra blood (sangue, na tradução em português) acompanhada de um símbolo que aponta para massacre. A suposta ameaça causou desespero entre estudantes, que saíram mais cedo das aulas devido ao pânico.
A mãe de Fábio, que também pediu anonimato para evitar retaliação, conta que soube da ocorrência através de outra mãe por meio de mensagem em rede social. Minutos depois, o filho ligou em desespero. “Ele falou: ‘mãe tá tendo ameaça de massacre aqui na escola, vem me pegar?’ Essa ligação foi horrível porque era uma gritaria. Meninos gritando. Acredito que eles tiveram um pico de estresse até entender o que aconteceu, porque foi um enxame de informações. Eu tive taquicardia”, afirma.
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O desespero se alastrou nos grupos de pais e mães de estudantes do Vieira. Uma mãe que também pediu para falar em anonimato contou que conseguiu chegar mais rápido que outras no colégio e acabou levando para casa o filho e mais três colegas.
“As mães mais próximas me ligaram porque a maioria não estava conseguindo sair do trabalho. Foi quando peguei [os meninos]. Só no estacionamento que eles começaram a ficar mais tranquilos. A necessidade maior era sair daquele ambiente que não estavam se sentindo seguros porque estavam sem saber se era boato ou não”, recorda.
Ela diz que já se sentia receosa com a possibilidade de ataque, sobretudo, após repercussão de casos de ameaça que aconteceram nesta semana em escolas baianas. Por isso, diariamente alertava o filho.
“Fiquei desesperada, nervosa. A gente nunca fica calma, imagina seu filho ligando, você vendo mensagens pelo grupo. Uma situação dessa a gente não fica tranquila. Só respirei quando ele entrou no meu carro”, narra.
Apesar do episódio acontecer na área conhecida como “Vieirão”, destinada para alunos dos 8º ano do Ensino Fundamental até 3º ano do Ensino Médio, pais do “Vieirinha”, região para a partir do 1º do Fundamental, chegaram a receber mensagens e também adiantaram as buscas no colégio.
A mãe de uma aluna de 7 anos do 2º ano do Ensino Fundamental diz que a filha vai e volta de transporte e escolar, mas por causa da ameaça decidiu ir “correndo” buscar a criança. “Ela ficou super preocupada, chorando e disse para mim ‘mas mãe a escola é um lugar para ir segura’. […] Ela falou que queria sair da escola. Demorou para acalmar, estou muito assustada com essa história”.
Investigação
Segundo a Polícia Militar, a pichação encontrada trata-se de uma brincadeira. “Os militares mantiveram contato com a direção da escola e foi verificado que se tratou de uma brincadeira realizada há algum tempo entre alguns dos discentes, que acabou se espalhando entre os demais alunos através de uma foto, como se verdade fosse”, garante em nota.
A entidade informou que policiais militares do 18º BPM foram acionados e estiveram no local para averiguar uma denúncia de ameaça. A nota ainda esclarece que o colégio adotou procedimentos internos de segurança e para esclarecimento do episódio. O autor da pichação já foi identificado e os responsáveis pelo menor, comunicados.
O Colégio Antônio Vieira emitiu nota informando que “a unidade conta com equipe de vigilância, catracas liberadas por biometria e câmeras 24h distribuídas em diversos espaços da escola”. A direção disse que não encontrou nenhum risco efetivo à integridade física dos alunos que justifique a suspensão das aulas e não houve liberação oficial das aulas por parte da instituição de ensino.
A escola esclareceu que o ensino seguiu durante o turno vespertino e as aulas de hoje terminarão mais cedo, com suspensão pela tarde, somente porque a região é local de votação e o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) solicitou liberação do espaço a partir de 13h.
Colégios baianos receberam cinco ameaças só nesta semana
Desde o atentado que terminou com a morte de uma estudante da Escola Municipal Eurides Sant'anna, em Barreiras, na última segunda-feira (26), o clima de terror tem se instaurado entre outros colégios baianos. Em um período de apenas três dias, foram registradas ao menos quatro ameaças de ataques contra instituições de ensino por todo o estado.
Além da ameaça no colégio Antônio Vieira, nesta quinta-feira (29), o Colégio Resgate em Vitória da Conquista decidiu suspender todas as aulas após receber ser encontrado um caderno contendo mensagem de possível ataque à escola.
"Ao tomar conhecimento do fato, nossa equipe rapidamente iniciou uma investigação interna e entendeu, sobretudo pelo modo como a mensagem foi deixada, que se tratava de uma brincadeira de extremo mau gosto, considerando, inclusive, o mal-estar coletivo que gerou", declarou em nota. Ainda assim, o fato foi comunicado às autoridades e foi solicitado proteção nos arredores da escola.
A direção triplicou o contingente de segurança na área interna da instituição e orientou toda a equipe técnica, de professores e disciplinar no sentido de diminuir o fluxo de estudantes nas áreas de convivência, monitorando corredores, pátios, salas e banheiros.
Na manhã da terça-feira (27), um adolescente de 13 anos tentou atacar colegas e atear fogo em uma sala de aula da Escola Municipal Yêda Barradas Carneiro, no município de Morro do Chapéu, região da Chapada Diamantina.
Segundo a Prefeitura de Morro do Chapéu, o aluno supostamente entrou em surto. A direção escolar informou que, após iniciada as aulas do período da manhã, por volta das 7h30, um aluno de 13 anos, do 8º ano, se dirigiu ao banheiro, trocou a farda por uma roupa preta com capuz e retornou para a sala de aula portando materiais inflamáveis e armado com uma faca, tentando em seguida colocar fogo nas dependências da escola.
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Rapidamente, os professores e demais funcionários da escola retiraram todos os alunos. Não houve nenhum ferido, mas a escola acabou com pequenos danos na estrutura. O adolescente foi apreendido e apresentado ao conselho tutelar para adoção das medidas cabíveis.
Já as outras duas ameaças ocorreram no mesmo dia do ataque em Barreiras. No Colégio Anchieta, no bairro da Pituba, pais, alunos, professores e outros funcionários receberam a informação de que um aluno estaria ameaçando se deslocar para a escola com uma arma.
Uma das suspeitas é que um adolescente do terceiro ano do ensino médio estaria sofrendo bullying por parte de outro estudante porque o pai morreu recentemente. Diversos alunos não foram para a aula na segunda (26) com medo de que algo fosse acontecer. Em nota, o Colégio Anchieta informou que não há informações verdadeiras referente ao boato.
Um caso semelhante ocorreu no Colégio Pirâmide, localizado na Rua Tereza Nogueira de Souza, em Lauro de Freitas. Na manhã da segunda, policiais militares da 52ª CIPM receberam informações através de um aplicativo de mensagens sobre uma suposta ameaça à unidade escolar. No local, os militares mantiveram contato com a diretora do colégio, e nenhuma anormalidade foi constatada.
A 23ª Delegacia Territorial (DT) de Lauro de Freitas apura a denúncia de ameaça, registrada pela diretora de escola. Segundo relato em ocorrência, um ex-aluno do estabelecimento de ensino estaria enviando mensagens, através de aplicativo nos grupos de alunos, informando que haveria um massacre. Diligências estão sendo realizadas para apurar as circunstâncias do caso.
Quanto ao caso de Barreiras, a Polícia Civil identificou dois policiais militares à paisana como responsáveis por atirar no adolescente de 14 anos que praticou o atentado.
Gerente de projetos da Safernet, associação civil de proteção aos crimes contra os Direitos Humanos, Guilherme Alves analisa que visibilidade na mídia é o que os agressores querem. Ele preconiza, portanto, a importância dos meios de comunicação não divulgarem na íntegra o conteúdo e motivação de quem ameaça. Assim como orienta comunicação entre autoridades policiais e gestão escolar.
“Isso pode ser feito pelo reforço policial nos próximos dias para que pais, familiares e estudantes se sintam mais seguros. Mas também vale na gestão das escolas entenderem se já houve casos como esse. Via de regra essas ameaças são apenas ameaças, mas não se pode ignorá-las de nenhuma forma”, afirma.
Psiquiatra, doutora em medicina e coordenadora do Centro de Estudos da Holiste Psiquiatria, Fabiana Nery explica que é difícil definir o caso concreto sem avaliação direta do indivíduo. Contudo, a especialista ressalta que nem todos casos de violência acontecem por questão patológica, podendo acontecer também devido a traços da personalidade do indivíduo, ou seja, nem todo ato de violência vai ser secundário a transtornos psiquiátricos.
“Uma dica é, se houve mudança do padrão de comportamento, seja porque ficou mais isolado, irritado, ríspido com a família, é sinal de alerta para entender o que está acontecendo com o indivíduo. É prestar atenção nas pessoas que estão ao nosso redor e oferecer ajuda, […] fazer intervenção precoce”, alerta.
Do Correio para a Rede Nordeste
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