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OAB declara "indignação e revolta" diante do assassinato de João Alberto em uma unidade do Carrefour

o homem negro foi espancado até a morte por dois seguranças brancos de um supermercado da rede Carrefour, em Porto Alegre
10:01 | Nov. 21, 2020
Autor Alan Magno
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Alan Magno Estagiário de jornalismo
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Tipo Notícia

“Indignação e revolta”, assim a Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB) se referiu ao caso do assassinato de João Alberto Silveira Freitas, homem negro espancado por seguranças brancos em uma unidade do supermercado Carrefour em Porto Alegre. A OAB destacou em seu posicionamento oficial que irá acompanhar as investigações do caso e que se portará como uma instituição legítima para “cobrar ações efetivas”, na resolução do caso e no julgamento dos responsáveis, dentro das medidas da lei.

O caso ocorreu em Porto Alegre, na noite de quinta-feira, 19, véspera do Dia da Consciência Negra. João tinha 40 anos e havia ido ao supermercado com a esposa, Milena Borges Alves, para comprar ingredientes para o jantar. Além dos dois seguranças que o agrediram, cerca de outros oito profissionais da rede de supermercados formaram um cerco para impedir que alguém interviesse na ação dos agentes.

A atitude dos seguranças foi classificada pela OAB como um caso brutal, “com requintes de raiva e crueldade”. A entidade pontuou ainda que: “Acompanhará todo o processo de investigação para que, obedecidos os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, com o devido processo legal, possam os responsáveis pela morte do João Alberto responder pelos seus atos, na forma da lei”.

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“A sociedade brasileira não compactuará com o silêncio revoltante dos que assistem uma morte de um negro sem gritar por Justiça”, completou a entidade, em um repúdio diante da omissão das pessoas que não tentaram socorrer João.

O homem, ainda segundo a nota, teve como causa mais provável da morte asfixia, já que além das agressões físicas, os seguranças imobilizaram João contra o chão, impedindo-o de respirar. 

O caso de agressão e racismo 

Em entrevista ao UOL, Milena, a cuidadora de idosos, esposa de João Alberto, contou que ela e o marido foram ao mercado, que fica a cerca de 600 metros do apartamento do casal, para comprar ingredientes do jantar e para cozinharem um pudim de pão, sobremesa que ele desejava comer.

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Ela relata que, ao chegar no caixa, João Alberto acenou para uma segurança mulher. De acordo com a esposa, a ação teria desencadeado as agressões que o marido viria a sofrer mais tarde naquela noite. "A segurança se sentiu ofendida e chamou os colegas. Mas ele sempre foi muito brincalhão", diz Milena.

Após o aceno, a esposa ficou no caixa e o marido foi para o estacionamento, onde outros seguranças passaram a segui-lo. Quando ela finalizou a compra e foi ao estacionamento, viu seguranças correndo e passando por ela. Ela não sabia que os homens estavam atrás de seu marido. Ao chegar na garagem, ela viu dois homens imobilizando João Alberto. Nesse momento, o homem já havia sido espancado.

“Quando fui tentar ajudar, o segurança me empurrou e aconteceu essa tragédia. A última coisa que ele falou para mim foi: 'Milena, me ajuda'”, relata a esposa.

Na entrevista, a mulher conta que só viu o vídeo das agressões minutos depois. "Não esperava aquilo ali, que acontecesse aquilo ali. É complicado. Achei muito forte a cena, o que fizeram com ele foi absurdo", disse.

Outro depoimento

Um vizinho da vítima, Paulão Paquetá, também contou ao UOL ter presenciado o momento da morte de João Alberto. O homem estava chegando no local na hora das agressões e diz que estava a mais ou menos 10 metros quando começou. “Tentamos intervir, mas não conseguimos”, relata.

Conforme diz Paquetá, cerca de oito seguranças ficaram no entorno da área impedindo a aproximação de pessoas que tentavam parar as agressões. “Não pararam. A gente gritava 'tão matando o cara', mas continuaram até ele parar de respirar, fizeram a imobilização com o joelho no pescoço do Beto, tipo como foi com o americano [George Floyd, morto por policiais neste ano nos Estados Unidos]."

Presidente da Associação de Moradores e Amigos do Obirici, Paquetá calcula que as agressões duraram cerca de sete minutos. Segundo ele, alguns motoboys que filmaram a violência tiveram os celulares tomados para não registrarem toda a ação. "Quando viram que ele parou de respirar, eles se apavoraram. Chamaram a Brigada [Militar], que isolou ali e o Samu tentou reanimar", relata.

De acordo com o líder comunitário, não é o primeiro relato de agressão no mercado. "Não é primeira ocorrência do tipo. É a primeira de óbito. Todo mundo sabe que são agressores [seguranças do local] mesmo. É muito difícil. Revolta pela maneira que ele foi morto brutalmente. Ser humano nenhum merece ser agredido daquela jeito, ter a vida ceifada de maneira tão brutal, tão animal.", comenta.

Os agressores

Os dois suspeitos de espancar João Alberto têm 24 e 30 anos e foram presos em flagrante. Um deles é policial militar e foi levado para um presídio militar. O outro é segurança da loja e está em um prédio da Polícia Civil. A investigação trata o crime como homicídio qualificado.

A Polícia Militar (PM) no Rio Grande do Sul apurou que o espancamento começou após um desentendimento entre a vítima e uma funcionária do supermercado, que fica na Zona Norte da capital gaúcha. Segundo a PM, a vítima teria ameaçado bater na funcionária, que chamou a segurança.

Em nota, o Carrefour informou que lamenta profundamente o caso, que iniciou rigorosa apuração interna e tomou providências para que os responsáveis sejam punidos legalmente. A rede também chamou o ato de criminoso e anunciou o rompimento do contrato com a empresa de segurança.

Brigada Militar informou, por meio de nota, que o PM é "temporário" e estava fora do horário de trabalho. Segundo o comunicado, as atribuições dele são limitadas à "execução de serviços internos, atividades administrativas e videomonitoramento" e "guarda externa de estabelecimentos penais e de prédios públicos". O órgão não explicou o que o homem fazia no mercado no momento do crime.




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