Pelo menos oito tragédias foram causadas por negligência nos últimos doze anos

O POVO Online apura a situação atual de grandes desastres na história recente do País. A maioria segue sem punições
Autor Marcela Tosi e Leonardo Maia
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O início do ano de 2019 é marcado por "desastres evitáveis e preveníveis", como afirmou na última sexta-feira, 8, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Ela se referia ao rompimento da barragem em Brumadinho (MG), que vitimou 160 pessoas até o momento; às mortes causadas após as fortes chuvas no Rio de Janeiro, em áreas consideradas de risco pelas autoridades públicas; e ao incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo, que funcionava sem alvará e já havia sido multado mais de 30 vezes pela Prefeitura do Rio de Janeiro.

A negligência em tragédias no País, entretanto, não é um fato novo. O POVO Online fez uma retrospectiva de desastres que poderiam ter sido evitados nos últimos doze anos.

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Queda do avião da TAM (SP)

O inquérito da Polícia Federal acerca do avião que caiu no aeroporto de Congonhas não apontou culpados.
O inquérito da Polícia Federal acerca do avião que caiu no aeroporto de Congonhas não apontou culpados. (Foto: Agência Brasil)

Acidente com um voo que saiu de Porto Alegre com destino a capital paulista resultou no total de 199 vítimas fatais, em julho de 2007: todos os passageiros e a tripulação, além de pessoas que estavam no solo. Doze anos depois, ninguém foi responsabilizado pela tragédia.

A aeronave, um Airbus A320, chocou-se contra o prédio da própria companhia aérea no aeroporto de Congonhas. O impacto aconteceu após o piloto receber a orientação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para pousar em uma pista sem ranhuras (que evitariam derrapagens) em um dia de chuva.

O inquérito da Polícia Federal acerca do caso não apontou culpados. O Ministério Público Federal (MPF), por sua vez, denunciou o então diretor da TAM, Marco Castro, e a então diretora da Anac, Denise Abreu. Ambos foram considerados inocentes.

Incêndio na Boate Kiss (RS)

Um ano após o incêndio na Boate Kiss durante show na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013.
Um ano após o incêndio na Boate Kiss durante show na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013. (Foto: Wilson Dias/Agência Brasil)

Em 27 de janeiro 2013, o incêndio da boate Kiss, em Santa Maria (RS), matou 242 pessoas e deixou outras 636 feridas. Lotada, a casa tinha apenas uma saída, sem sinalização de emergência ou chuveiros automáticos; além disso, o teto era inflamável, em desacordo com a lei municipal.

O Ministério Público denunciou os sócios da boate e os integrantes da banda que tocavam no momento do incêndio por homicídio culposo (quando não há intenção de matar). Os quatro foram presos, preventivamente, dias depois do ocorrido e liberados em março do mesmo ano. Houve uma série de recursos judiciais e o caso segue sem ser julgado. A discussão foi parar no Supremo Tribunal de Justiça, que ainda não se pronunciou.

Naufrágio em Itaparica (BA)

Um dos motivos do naufrágio teria sido a saída da embarcação em clima adverso.
Um dos motivos do naufrágio teria sido a saída da embarcação em clima adverso. (Foto: Agência Brasil)

Também foi negligência, segundo conclusão da Marinha, que levou 19 pessoas à morte e feriu outras 89 em agosto de 2014 no naufrágio da lancha Cavalo Marinho I, há menos de 200 metros da costa da Ilha de Itaparica (BA). A embarcação seguiria para Salvador. A investigação culpou o engenheiro técnico, o dono e o comandante da lancha por alterarem pesos usados para manobras e por terem deixado a embarcação sair em clima adverso. O caso segue sem julgamento.

Rompimento da Barragem em Mariana (MG)

Passagem da lama pelo Rio Doce, por causa do rompimento de duas barragens em Mariana, Minas Gerais, causou desastre ambiental.
Passagem da lama pelo Rio Doce, por causa do rompimento de duas barragens em Mariana, Minas Gerais, causou desastre ambiental. (Foto: Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios/Divulgação)

Na tarde de 5 de novembro de 2015, a 35 km da cidade mineira, rompeu-se uma barragem de rejeitos de mineração. O rompimento da barragem de Fundão é considerado o desastre industrial que causou o maior impacto ambiental da história brasileira, com um volume de 50 milhões de m3 de rejeitos chegando à bacia do Rio Doce.

Segundo relatório da Polícia Federal (PF) sobre o desastre, a mineradora Samarco, empresa controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, não tomou providências em relação a problemas na barragem que já haviam sido identificados em 2014. Sete pessoas foram indiciadas pela PF, entre executivos e engenheiros.

Mais de três anos depois, o processo tramita na Vara Federal de Ponte Nova, ainda sem data para julgamento. Das 68 multas aplicadas por órgãos ambientais, apenas uma está sendo paga (em 59 parcelas).

Queda do avião de Eduardo Campos (SP)

O trabalho de buscas dos corpos das vítimas do acidente com o avião Cessna, que matou o candidato à Presidência da República pelo PSB, Eduardo Campos.
O trabalho de buscas dos corpos das vítimas do acidente com o avião Cessna, que matou o candidato à Presidência da República pelo PSB, Eduardo Campos. (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

A queda do avião que matou Eduardo Campos, na época candidato à Presidência da República, e outras seis pessoas continua como um mistério para as investigações. O inquérito aberto pela Polícia Federal foi encerrado sem apontar uma pessoa ou empresa culpada pelo crime, indicando apenas a causa principal como uma falha mecânica ou humana para a tragédia, que aconteceu há quatro anos. Os investigadores, entretanto, descartaram a possibilidade de sabotagem, assim como de suicídio da tripulação.

Queda do avião da Chapecoense (Colômbia)

Arena Condá se transformou no ponto de reunião de torcedores, jogadores e parentes das vítimas que com cartazes, fotos e flores fazem homenagem a equipe que morreu no acidente.
Arena Condá se transformou no ponto de reunião de torcedores, jogadores e parentes das vítimas que com cartazes, fotos e flores fazem homenagem a equipe que morreu no acidente. (Foto: Daniel Isaia/Agência Brasil)

Um avião que levava a delegação da Chapecoense, time de futebol do interior de Santa Catarina, para Medellín caiu a poucos quilômetros da cidade colombiana. Lá o clube disputaria a final da Copa Sul-Americana 2016, feito nunca alcançado pela equipe até então.

A aeronave, Avro RJ85, traçou um plano de voo com combustível exatamente igual ao necessário para o tempo de deslocamento de um destino ao outro. Isso não acontece costumeiramente na aviação, a qual sempre conta com uma margem de segurança para possíveis imprevistos durante o trajeto. A companhia aérea que fazia o transporte do clube, a LaMia, oferecia voos 40% mais baratos que a concorrência e optou por não fazer uma escala para abastecimento antes de chegar ao destino final.

A queda provocou a morte de 71 pessoas, jogadores, jornalistas e funcionários da LaMia. Sobreviveram seis pessoas, entre elas apenas três jogadores: o goleiro Jackson Follman, o zagueiro Hélio Zampier Neto e o lateral Alan Ruschel. Também saíram com vida o radialista da cidade de Chapecó (SC), Rafael Henzel, a comissária de bordo Ximena Suaréz e o técnico de voo Erwin Tumiri.

As famílias dos jogadores ainda travam batalhas na Justiça tanto contra o clube como contra a LaMia. Até hoje a seguradora da empresa não pagou as indenizações e apenas as famílias que aceitaram as propostas da Chapecoense, como a do volante Josimar, receberam o seguro de vida previsto em contrato seguindo cálculo feito com base nos salários dos jogadores.

Desabamento no Largo do Paissandu (SP)

Busca pelos desaparecidos e retirada dos destroços do prédio que desabou após incêndio em São Paulo, no Largo do Paissandu.
Busca pelos desaparecidos e retirada dos destroços do prédio que desabou após incêndio em São Paulo, no Largo do Paissandu. (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Um desastre de grandes proporções ocorrido na madrugada do primeiro dia de maio de 2018, na região do Largo do Paissandu, em São Paulo, resultou no desabamento do Edifício Wilton Paes de Almeida. Abandonado desde 2003, o local abrigava ao menos 146 famílias. Outros dois prédios e uma igreja também foram parcialmente atingidos pelo fogo.

Tombado desde 1992 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (CONPRESP), o edifício parecia esquecido pelo poder público. Em 2015, os bombeiros relataram irregularidades no prédio e o Ministério Público abriu inquérito. No entanto, a prefeitura permitiu a ocupação irregular e o MP não levou adiante a investigação pedida pelos bombeiros. Os responsáveis pela ocupação, ainda que irregular, não tomaram os cuidados de segurança. Até o momento, não houve qualquer punição.

Incêndio no Museu Nacional (RJ)

Um incêndio atingiu o Museu Nacional do Rio de Janeiro, na Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, na zona norte da capital fluminense.
Um incêndio atingiu o Museu Nacional do Rio de Janeiro, na Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, na zona norte da capital fluminense. (Foto: Tânia Rego/Agência Brasil)

Poucos meses depois, outro incêndio de grandes proporções chamou a atenção de todo o País. Em uma noite de domingo, assistimos a queima do Museu Nacional, maior museu de história natural do Brasil, com um acervo de 20 milhões de itens de grande importância histórica e cultural.

Bombeiros buscaram água de lago e precisaram pedir caminhões-pipa, pois os dois hidrantes próximos ao Museu não tinham pressão suficiente. Três dias após o incidente, a corporação confirmou que o local não tinha um Certificado de Aprovação atualizado. O documento atesta a conformidade das condições arquitetônicas da edificação bem como as medidas de segurança exigidas pela legislação (extintores, caixas de incêndio, iluminação e sinalização de segurança, portas corta-fogo).

A instituição vinha sofrendo com falta de recursos e tinha sinais de má conservação, como fios elétricos aparentes, cupins e paredes descascadas. As condições precárias já estavam sendo investigadas pelo Ministério Público Federal havia dois anos.

Para apurar as condições de conservação dos bens tombados, o Ministério Público Federal instaurou um inquérito civil para investigar inúmeras irregularidades no funcionamento de museus vinculados ao Ibram, autarquia federal responsável pelas unidades museológicas. Não há qualquer decisão oficial até o momento.

Marcela Tosi e Leonardo Maia

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