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"Intolerante e agressivo", diz delegada sobre barbeiro que matou mestre de capoeira

Paulo Sergio Ferreira de Santana, 36 anos, esfaqueou vítima que, segundo testemunhas, criticou Jair Bolsonaro
11:43 | Out. 09, 2018
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Com 1,80 m de altura, voz firme, careca e de cavanhaque, o barbeiro Paulo Sérgio Ferreira de Santana, 36 anos, tinha se mudado do bairro do Nordeste de Amaralina para a localidade do Dique Pequeno, no Engenho Velho de Brotas, em Salvador, há cerca de dois meses.
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Pai de dois filhos, foi morar em uma casa alugada ao lado da companheira, que já residia no bairro. Ele disse que não conhecia o homem que matou com 12 facadas pelas costas, o mestre de capoeira Romualdo Rosário da Costa, o Môa de Katendê, após uma discussão política. O caso foi na madrugada desta segunda-feira, 8. 

A delegada Milena Calmon, do Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa da Bahia (DHPP), que investiga o crime, descreve o barbeiro como sendo uma pessoa intolerante e agressiva. Por ser novo na região, nenhum morador mais velho o conhecia. Em depoimento à Polícia, Paulo Sérgio disse que nunca havido ouvido falar sobre o capoeirista, que exercia forte influência cultural no bairro, promovendo atividades e sendo, inclusive, uma das principais lideranças do bloco de afoxé Badauê. 

Mas essa não foi a primeira vez que ele foi parar na delegacia. Depois de ser detido, a delegada  encontrou duas ocorrências envolvendo o nome do barbeiro. A primeira, de 2009, quando ele foi vítima de agressão por parte de quatro homens após uma discussão. De acordo com a delegada, à época, ele deu entrada no Hospital Geral Roberto Santos para cuidar de ferimentos. Não se sabe, no entanto, o motivo da briga, nem se ele teria provocado a confusão.

Já em 2014, o barbeiro foi acusado por um adolescente de 14 anos de ameaçá-lo com uma tesoura depois de o jovem pedir R$ 0,50. A vítima procurou a Delegacia de Repressão a Crimes Contra a Criança e o Adolescente (Dercca) para formalizar a denúncia. Mesmo depois de o caso ser registrado, Paulo Sérgio não foi preso. O registro, explica a delegada, não apresenta muito detalhes sobre o caso.

“No registro temos apenas: o garoto de 14 anos teria sido vítima de agressão física e verbal por parte de Paulo Sérgio. O adolescente teria pedido a quantia de R$ 0,50 para completar o valor do corte cabelo e que isso teria irritado o autor, que passou a agredir verbalmente. O mesmo teria quebrado o seu relógio dizendo ser uma ‘peça barata’ e que ainda teria colocado uma tesoura no seu pescoço. No entanto, não diz, o local onde ocorreu”, diz Milena. 

Já sobre a morte de Môa, para a polícia, Paulo Sérgio disse que, antes de cometer o crime, começou a beber os primeiros copos de cerveja durante a tarde, por volta das 15 horas, quando o cenário político do segundo turno ainda estava sendo decidido nas urnas.

A bebedeira foi até a noite, quando resolveu ir ao Bar do João, estabelecimento que fica nas proximidades do Dique do Tororó. Lá, já por volta da meia-noite, o barbeiro resolveu pôr em discussão com o dono do estabelecimento as propostas do candidato do PSL, Jair Bolsonaro, segundo testemunhas que estavam no local. 
 
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De acordo com a delegada, o barbeiro argumentava com o dono do estabelecimento que era preciso haver mudanças no Brasil, quando o capoeirista interrompeu a conversa se mostrando contrário às suas ideais.

Prisão
Paulo Sérgio chegou por volta das 11h30min de segunda-feira na sede do DHPP, no bairro da Pituba, ao lado de dois policiais. Ao avistar a presença da imprensa, cabisbaixo, tentou esconder o rosto utilizando uma das mãos ferida por uma faca tipo peixeira usada para cortar carne em casa.

A mesma arma branca foi usada para desferir 12 golpes no Mestre Môa, com quem teve uma discussão acalorada por causa das divergências políticas.

Durante a sua apresentação à imprensa, o barbeiro negou as acusações. Disse não se lembrar de quantos golpes desferiu contra a vítima que, de acordo com a família, era eleitor e simpatizante do Partido dos Trabalhadores (PT).

Negou também que a motivação do crime tenha sido por política – entrando em contradição já que, durante interrogação policial, minutos antes de ser apresentado a jornalistas, ele confessou o verdadeiro motivo do homicídio à delegada.

“Eu estava conversando com o dono do bar sobre futebol quando esse senhor aí, o que veio a óbito, levantou e me chamou de negro e ‘viado’. O dono do bar viu e separou. Ele (dono do bar) viu tudo, outros (clientes) também. Já pedi desculpas à família e peço mais uma vez, momento nenhum foi a minha intenção (de matar). Me entreguei”, contou.

Ao chegar na sede do DHPP, além de apresentar a mão esquerda enfaixada com gases, o acusado estava sem camisa, vestindo um short - ainda ensanguentado - e calçando apenas uma única sandália. 

O dono do bar, conhecido como João, foi procurado pelo CORREIO. Ele mora logo em cima do estabelecimento, mas, abalado, resolveu não receber a imprensa. Ele foi intimado no final da manhã desta segunda a prestar depoimento na sede do DHPP. 

Fuga e apreensão
Após esfaquear a vítima até morte, o barbeiro, durante a confusão, acabou esfaqueando também o primo do capoeirista. Germínio do Amor Divino Pereira, 51, foi atingido com um golpe de faca no braço direito. Ele foi socorrido para o Hospital Geral do Estado (HGE), onde passou por uma cirurgia. Ele não corre risco de morte, continua em observação e, segundo a família, sem previsão de ser ouvido pela Polícia. 

Logo depois de matar o capoeirista, o barbeiro fugiu do local em direção à própria residência. Alguns moradores seguiram atrás dele, mas a Polícia, minutos depois, conseguiu arrombar a casa e o prendeu dentro do banheiro. A arma utilizada no crime, no entanto, não foi localizada até a tarde desta segunda. "Quando chegou em casa ele contou para a companheira o que tinha feito, a socilitando trancar toda a casa", acrescenta Milena.

A polícia encaminhou o acusado para o HGE para cuidar de um corte na mão esquerda feito durante o crime. Na unidade de saúde, Paulo Sérgio disse ter tido a oportunidade de encontrar com os familiares das vítimas, a quem pediu desculpas.

Crime
A delegada aponta o crime como sendo uma tentativa de homicídio (contra o primo) e um homicídio qualificado – quando a vítima não tem chances de defesa, quando há requinte de crueldade ou por motivo fútil.

O suspeito foi encaminhado para audiência de custódia ainda nesta segunda-feira. 
 
Nilson Marinho
Via Rede Nordeste 

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