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Recomeço depois dos 60 anos

Os motivos para o aumento das separações em idosos nos últimos anos incluem mudanças na sociedade e na legislação. Entender sem interferir nas decisões pode ajudar no processo
13:15 | Mai. 06, 2017
Autor Ana Rute Ramires
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Ana Rute Ramires Repórter da editoria de Cidades
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Tipo Notícia

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Envelhecer não é sinônimo de finitude e, para muitos, o divórcio é uma nova chance de continuar. É crescente o número de pessoas que, apesar das dificuldades da decisão, abrem mão do “até que a morte os separe” após longos anos de relacionamento em busca de outra oportunidade de ser. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o divórcio de homens e mulheres de depois dos 60 anos, aumentou 79,9% e 83%, respectivamente, entre 2005 e 2015. Aumento da expectativa de vida, maior independência feminina e diminuição da burocracia são algumas das razões para esse aumento.

Filhos criados, vida profissional conquistada e desejo de enveredar por desejos não satisfeitos. Para João Macedo Filho, geriatra e coordenador do Núcleo de Estudos da Longevidade da Universidade Federal do Ceará (UFC), a melhor condição de saúde, devido aos avanços da medicina, faz com que o idoso vislumbre maior expectativa de vida. A pesquisa do IBGE revela que de 1940 a 2015, esse índice no Brasil para ambos os sexos passou de 45,5 anos para 75,5 anos.

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De acordo com a professora de sociologia e vice-líder do Observatório da Violência contra a Mulher da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Socorro Osterne, esse aumento ocorre no contexto de uma sociedade mais esclarecida sobre seus direitos individuais e sociais. “As pessoas estão mais resistentes a viver situações de infelicidade em nome de uma tradição meramente normativa onde se assentam grande parte dos casamentos. Mas isso ainda é tabu. Continua pairando no imaginário social a ideia de que o casamento deverá ser eterno mesmo que assentado em bases conflitivas”, avalia.

Francisco Mesquita, 63, viu diferenças de opinião causarem o fim do casamento de 37 anos. O início da nova fase após a mudança é considerado, pelo marceneiro, “esquisito”. “Ela tinha uma opinião muito forte com relação a algumas coisas. E eu prometia parar de beber e fumar, mas nunca parei”, reconhece.

Dificuldades do processo

O mundo que o relacionamento iniciou não é mais o atual. Como se preparar para começar de novo? Esse questionamento aflige quem passa por esse processo, relata a psicóloga e professora da UFC, Michelle Steiner. “Tem uma evolução nos costumes, como a revolução sexual, que fez com que homens e mulheres refletissem o seu papel na sociedade, nas relações humanas e nas escolhas afetivas”, explica.

Apesar das mudanças, terminar o que antes era considerado projeto de vida tem outro peso para o idoso. Além de uma dor diferente para homens e mulheres. “Elas utilizam muito essa expressão: ‘tô cansada, quero olhar mais para mim e para os meus projetos pessoais’. Para os homens é como se tivessem feito muito, mas quisessem mais”, exemplifica. Ela complementa que a mulher carrega expectativas em si própria. “Mas a falta de liberdade é comum aos dois”, pondera.

Além desses fatores, os trâmites para formalizar um divórcio foram simplificados e contribuem para esse crescimento. “Antes, os casais tinham que passar por um processo de separação judicial e depois de um ano entrar com o divórcio. Agora, se eu casar hoje e quiser me divorciar amanhã eu posso”, explica Roberta Vasquez, advogada e presidente da Comissão de Direito da Família da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Ceará.

O processo também pode ser feito extrajudicialmente, em cartórios. “Só não pode ser extrajudicial se o casal tiver filho com menos de 18 anos ou a mulher estiver grávida. Impedimentos que, geralmente, não afetam idosos”, detalha. Segundo a advogada, dessa forma, o processo pode ser finalizado em menos de 60 dias.

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