Esporte olímpico, escalada ganha espaço em Fortaleza e diverte crianças e adultos
O ginásio, chamado Café com Magnésio, foi criado neste ano com o intuito de fortalecer a comunidade de escalada no Ceará
Na avenida Eduardo Girão, nº 526, no bairro de Fátima, é comum ver gente curiosa diminuindo o passo para tentar entender o que está acontecendo ali: um grupo animado escalando paredes coloridas. O enorme galpão, que carrega o nome de Café com Magnésio, é um espaço que reúne pessoas apaixonadas por escalada — um esporte olímpico que vai muito além do esforço físico.
Por lá, cada subida é também um exercício de união, foco e, acima de tudo, superação pessoal. A história por trás do espaço começou em 2019, idealizado por Mário Henrique. Naquele ano, ele, que começou a praticar escalada em 2016, incentivado por amigos, resolveu criar um podcast chamado Café com Magnésio, com foco no universo que envolve a modalidade.
Mário Henrique se apaixonou tanto pela escalada que quis, de alguma forma, unir a comunidade cearense — que ainda não era tão grande na época. Usou suas economias e teve a ousada ideia de montar o espaço físico, onde outras pessoas pudessem praticar o esporte. A iniciativa deu certo e ampliou o número de adeptos em Fortaleza.
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“Começou em 2016, quando eu conheci a Fábrica de Monstrinhos, que era um clube de escalada feito por amigos. Então eu tive meu primeiro contato lá, fui bem recebido pela galera e comecei a escalar. Já praticava outros esportes antes, mas nada me deixou tão louco como a escalada. Foi amor à primeira vista, parei com todos os outros esportes. Na época, eu tinha 20 quilos a mais do que tenho hoje. Estava muito pesado para escalar. Fui atrás de perder alguns quilos para conseguir ficar mais leve e performar melhor”, relembrou Mário.
Segundo ele, a ideia do podcast veio junto de uma curiosidade pessoal: entender como os principais nomes da escalada conseguiram se tornar tão fortes na modalidade — o tipo de treinamento, as condições e o desenvolvimento. Consequentemente, também foi possível divulgar o esporte no Ceará, que tinha pouca visibilidade no cenário nacional e sul-americano.
“Tem quase 40 episódios gravados com os maiores atletas do nosso esporte pelo Brasil. Tem o melhor escalador do Brasil, o melhor da América Latina, tem os caras que mais desenvolveram o esporte no país — todos estão entrevistados e têm as suas histórias lá. Quando eu criei isso, foi mais para aprender o que esses caras fizeram, os locais onde moram, como desenvolveram a escalada lá”, contou.
“E o principal, que era algo que eu queria saber bastante, é como esses caras treinam, como se tornaram tão fortes nessa modalidade. Esse era o objetivo quando eu criei o podcast. Com o tempo, acabou servindo também para desenvolver e divulgar a escalada aqui no Ceará, que até então era pouco conhecida e pouco divulgada”, concluiu.
Escalada é esporte olímpico
A escalada foi introduzida no programa olímpico a partir da edição de Tóquio 2020. São três modalidades: boulder, speed e lead. No Café com Magnésio, os paredões — chamados de boulders — possuem diferentes níveis de dificuldade, categorizados de 1 (iniciante) até 6 (experiente), nomeados com tipos de cafés — uma brincadeira interna.
Em cada parede, existem diferentes rotas, com variados níveis de exigência. As regras são simples: o praticante só pode agarrar e apoiar os pés nos boulders referentes ao desafio que está realizando. Para completá-lo, é necessário tocar as duas mãos na última “pedra” do percurso e, então, retornar ao chão.
Eu, Mateus Moura, que vos escreve, fui desafiado a participar de uma noite de treino no ginásio. Os primeiros níveis de dificuldade podem ser feitos com tranquilidade, até mesmo por quem não pratica esporte há muito tempo. O problema começa, entretanto, já na categoria número dois — ali, a situação complica.
Me arrisquei. Completei alguns desafios e falhei em outros. Ao assistir atletas mais experientes, me impressionei com a complexidade de certos boulders. A força e a técnica necessárias ficam evidentes. Nada que o tempo — e muita prática — não resolva. O caminho natural é como em qualquer outro esporte: treinar, se dedicar e se superar. Existe um desafio no ginásio que nunca foi completado, nem por atletas que vieram de fora do Ceará.
A cada subida, fosse eu — o mais inexperiente da noite — ou Mário Henrique, referência na escalada, o clima de felicidade e exaltação era o mesmo. A união e o companheirismo da comunidade da escalada são elementos muito valorizados. A receptividade com novos praticantes também é acolhedora. Vale ressaltar que crianças a partir de sete anos podem praticar o esporte no ginásio.
“No mundo inteiro foi um boom depois que a escalada foi anunciada nos Jogos Olímpicos, né? A procura pela escalada se tornou muito maior, a visibilidade também, o patrocínio, tudo isso. E com certeza, no futuro, isso tende a refletir aqui também, no Nordeste e no Ceará. A Confederação, a Associação Brasileira de Escalada, está com mais recursos agora, investindo mais no esporte”, avaliou Mário sobre o impacto da modalidade nas Olimpíadas.
Japão é potência, enquanto Brasil ainda engatinha
Quando o assunto é o cenário competitivo da escalada, existe um país dominante atualmente: o Japão. Segundo Mário, os japoneses são uma potência na modalidade e sempre figuram entre os primeiros colocados dos torneios, com pelo menos dois vencedores. Alguns países da Europa também se destacam. O Brasil, por sua vez, ainda engatinha.
“Os competidores aqui ainda estão engatinhando bastante. As potências são o Japão e alguns países europeus. Mas cada país europeu tem um atleta que se sobressai. No Japão, todos eles são muito acima da média, acabam se destacando. O Brasil ainda está ficando para trás”, disse.
“Mas estamos chegando cada vez mais perto. Com esse investimento que está sendo feito agora na escalada no Brasil, a tendência é que essa diferença em relação aos japoneses e europeus diminua. Quem sabe o meu neto consiga? (brincou)”, concluiu.
Pra que medo?
Embora o pessoal do Café com Magnésio também se aventure em rochas na natureza — seguindo todos os protocolos de segurança —, não existem limitações para que qualquer pessoa pratique a escalada no ginásio. O local conta com professores que auxiliam e ensinam os alunos, independentemente do nível. Para além das questões físicas — e bote força nos dedos, viu? —, há três pilares fundamentais nesse esporte.
“Tem uns três pilares principais da escalada. O primeiro é o desenvolvimento pessoal — é a capacidade da pessoa, por meio dessas vias, desses boulders, dessas brincadeiras que a gente faz no muro, de desenvolver e resolver esses quebra-cabeças, vencer as dificuldades que a gente tem na vida. Todo mundo tem dificuldade. A escalada ensina uma maneira de sair do outro lado, de vencer aquilo ali, de passar por cima daquela barreira”, ressaltou.
“O segundo, que eu vejo também, principalmente num muro como esse, da modalidade boulder, é que todo mundo consegue brincar ao mesmo tempo. É diferente: se eu levo uma galera para jogar futebol, vai ter um momento em que um está com a bola e outros 21 sem. Aqui não. Aqui todo mundo consegue estar ‘com a bola’ ao mesmo tempo, cada um tentando algo diferente, rindo da cara do outro, brincando. Essa socialização que a escalada proporciona é muito massa”, destacou.
“E o terceiro pilar é estar mais próximo da natureza — não aqui no ginásio, claro, que é um ambiente fechado. Mas o treinamento aqui possibilita que a gente vá para o meio do mato e faça a mesma coisa lá, cercado de plantas, sol e pedra. Não vejo isso em nenhum outro esporte. Já pratiquei surfe, parkour, várias artes marciais, mas nunca senti o que sinto aqui na escalada”, finalizou.
Por que Café com Magnésio?
É simples: o pessoal lá gosta de café - ou quase todos. Já o magnésio é um pó usado para absorver o suor das mãos, aumentar a aderência e melhorar o desempenho na escalada.
Escalada esportiva: tipos e regras
Como modalidade olímpica, a escalada esportiva recebeu a estipulação de regras aos seus participantes:
Speed (velocidade)
A prova de velocidade (speed) apresenta uma parede de 15 metros com inclinação de cinco graus para que os homens possam realizar a escalada em seis segundos e as mulheres, em sete. Na competição, uma das mais rápidas nos Jogos, dois competidores disputam para definir quem chega primeiro ao topo.
Boulder
No boulder, os atletas devem escalar paredes de 4,5 metros de altura. Tudo isso sem utilizar cordas, com um tempo limitado e poucas tentativas.
Lead (guiada)
Na prova guiada (lead), os atletas devem subir o mais alto possível dentro de seu tempo limite, em seis minutos, sem ter visto o percurso antes. A parede tem mais de 15 metros de altura e os percursos vão se tornando mais complexos em cada prova, como destacam as regras apresentadas pelos Jogos Olímpicos.