Uma noite, três exemplos de você-sabe-o-quê na Paralimpíada
Nove letras, uma cedilha e um til formam uma espécie de 'palavra non-grata' no movimento paralímpico (na língua portuguesa, é claro). O uso dela, evitado, por exemplo, em textos do Comitê Paralímpico Brasileiro, pode levar o leitor ou espectador a achar que os atletas devem receber um olhar de pena ou ser enaltecidos apenas pelo fato de que conseguem ter uma vida normal e competir mesmo tendo uma deficiência. 

Essa palavra é integrante de longa data do léxico da mídia esportiva, que vive (com alguma razão) de destacar os feitos que parecem inalcançáveis para nós meros mortais, muitas vezes sob intensa adversidade.
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Foi o que aconteceu com três medalhistas do Brasil na primeira noite do atletismo na Paralimpíada de Tóquio.
Ao primeiro olhar, não parece que a vitória de Petrúcio Ferreira nos 100m classe T47, repetindo o resultado de 2016 no Rio e coroando o atual campeão e recordista mundial, tenha sido fruto da ideia representada por esta palavra. Porém, ele revelou que correu ainda se recuperando de uma lesão na coxa esquerda, que colocou em dúvida a participação dele na prova mais importante da modalidade.
Outro medalhista de ouro, Wallace Santos, do arremesso de peso F55, teve que lidar recentemente com as mortes da primeira treinadora - com quem trabalhou por muitos anos - e do tio, de quem era muito próximo.
Por último, João Victor Teixeira, também do arremesso de peso mas na classe F37, saiu com o bronze. O último teste que ele precisava fazer antes do voo para o Japão teve resultado positivo para Covid-19. Além da incerteza sobre a viagem, a doença afetou os treinamentos do atleta na reta final de preparação para a principal competição da vida dele. João permaneceu em casa, se preparando em condições longe das ideais e dias depois testou novamente. Desta vez não havia mais traços do coronavírus em seu organismo. Ele foi para o Japão, fez a melhor marca da carreira na prova e, ao conseguir alcançar o pódio, não pôde fugir da felicidade que só uma boa surpresa pode causar. E também não fugiu da palavra que tentei evitar por todo este texto.
"Agora eu posso dizer que sou um exemplo de superação. Quando você 'supera' a deficiência, algo que depende unicamente de você, é uma obrigação. Mas quando você supera algo que não está no seu controle, na sua mão, isso sim é superação para mim. Eu superei essa doença. Essa medalha vale ouro para mim", disse o medalhista de bronze.
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