São Paulo anuncia que vai romper contrato com Enel: o que se sabe e o que falta esclarecer?
Autoridades anunciaram nesta terça-feira (16/12) que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) dará início a rompimento de contrato. Decisão teve participação do governo Lula.
O Estado de São Paulo vai romper o contrato com a concessionária Enel, segundo anunciaram nesta terça-feira (16/12) o governador Tarcísio de Freitas, o prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes, e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
A decisão vem após mais uma sequência de dias em que parte da população de São Paulo sofreu com a falta de luz na maior cidade do país, depois da passagem de um ciclone extratropical e rajadas de vento que chegaram a quase 100 km/h na semana passada.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) dará início, a pedido do ministério, ao chamado processo de caducidade, que dá partida ao rompimento de contrato com a multinacional italiana.
Ainda não se sabe se há um prazo determinado para esse processo ser finalizado.
A caducidade é a sanção mais grave a que uma concessionária pode ser submetida — normalmente, em caso de descumprimento grave das obrigações contratuais pela prestadora de serviço, por exemplo com problemas severos e reincidência em falhas.
É comum que, antes de chegar na caducidade, a empresa já tenha sido sancionada com multas. É o caso da Enel em São Paulo.
Segundo levantamento da CNN Brasil, a Enel já foi multada cinco vezes pela Aneel por problemas na região metropolitana, com valor chegando a R$ 374 milhões — mas o efetivamente pago corresponde a 7,7% desse total (cerca de R$ 29 milhões).
Algumas dessas penalidades estão sendo questionadas pela concessionária na Justiça e com recursos dentro da Aneel.
A caducidade exige a comprovação da culpa da concessionária, que pode se defender no procedimento. Ao fim do trâmite, a Aneel deverá recomendar ou não a extinção do contrato.
Caso essa seja a orientação, a extinção seria feita com um decreto do presidente da República.
Em nota enviada à reportagem na quarta-feira (17/12), a Enel afirmou defender a realização de "uma avaliação ampla para enfrentar de forma estrutural os desafios relacionados ao fornecimento de energia em uma cidade densamente populosa como São Paulo".
"Com as mudanças climáticas, a Grande São Paulo está cada vez mais exposta a eventos meteorológicos extremos. Essa avaliação deve ocorrer em um ambiente técnico adequado para garantir que as necessidades da população sejam efetivamente priorizadas", argumentou a empresa.
A concessionária defendeu ainda "investimentos maciços" em digitalização e na implementação de uma rede de distribuição de energia subterrânea, com enterramento de fios.
"A empresa está disposta a realizar esses investimentos como parte de uma estratégia compartilhada com todas as instituições envolvidas", afirmou a Enel em nota.
A multinacional acrescentou que, desde que assumiu a concessão, em 2018, até 2024, investiu mais de R$ 10 bilhões em São Paulo. Para o período de 2025 a 2027, o plano de investimentos seria recorde, no valor de R$ 10,4 bilhões.
Assegurou também ter tomado várias medidas para lidar com as consequências do ciclone extratropical que atingiu a região na semana passada.
Tarcísio, Nunes e Silveira participaram na terça-feira de uma reunião no Palácio dos Bandeirantes que durou 3h, segundo o prefeito de São Paulo.
De acordo com o ministro Alexandre Silveira, sua presença na reunião em São Paulo foi determinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
"Como o governador disse, a Enel perdeu, inclusive do ponto de vista operacional, as condições para continuar à frente do serviço de concessão em São Paulo", disse o ministro.
Durante a reunião, segundo Nunes, foram apresentados documentos que demonstram "a ineficiência da Enel" na cidade de São Paulo e em outros 23 municípios paulistas atendidos pela concessionária.
"Se identificou claramente que a Enel não tem a estrutura e o compromisso para fazer frente às necessidades, principalmente quando tem alguma situação adversa por conta das mudanças climáticas", afirmou o prefeito.
Ele acrescentou que a decisão vai abrir caminho para "uma empresa que tenha condições de atender bem a população de São Paulo".
Na segunda-feira (15/12) à noite, cerca de uma semana após as fortes rajadas de vento, ainda havia 50 mil domicílios sem energia, de acordo com Nunes.
No auge da crise, 1,5 milhão de imóveis chegaram a ficar sem luz na Grande São Paulo, segundo informações da própria Enel em 11 de dezembro.
Cidades como Embu-Guaçu, Cotia, Osasco e São Caetano do Sul foram fortemente afetadas.
Houve protestos de moradores contra a Enel na região metropolitana.
Segundo estimativa da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), o setor de comércio e serviços na capital teve prejuízo de ao menos R$ 2,1 bilhões em faturamento de quarta-feira (10) até domingo (14) por conta da falta de energia em São Paulo.
De acordo com a prefeitura de São Paulo, a Enel havia se comprometido com o município a realizar 282.271 podas de árvores, mas apenas 11% desse plano foi executado.
Em 2023 e 2024, São Paulo já havia tido problemas com o fornecimento de energia elétrica, e o prefeito Ricardo Nunes pediu na ocasião o rompimento de contrato.
A Enel afirma ter, apenas com a distribuição de energia nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará, 15 milhões de clientes — do setor residencial ao industrial.
A multinacional italiana também tem instalações de energia eólica e solar espalhadas pelo Brasil.
*Com informações de Rute Pina, da BBC News Brasil em São Paulo
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