Megaoperação contra o CV no Rio de Janeiro provoca crise entre governo Lula e gestão estadual

Governador acusa Brasília de omissão no combate ao crime; após repercussão, governo federal divulga lista de ações e operações no estado para rebater críticas

16:55 | Out. 28, 2025

Por: Marcelo Bloc
Operação policial no Rio gerou tensão entre Governo Cláudio Castro, Palácio do Planalto e Ministério da Justiça (foto: Evaristo SA/AFP - Fernando Frazão/Agência Brasil - Rafa Neddermeyer/Agência Brasil - )

A megaoperação policial deflagrada nesta terça-feira, 28, nos Complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro, rapidamente deixou de ser apenas uma ação de segurança pública para se transformar em um novo foco de tensão política entre o governador Cláudio Castro (PL) e o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A ação, parte da Operação Contenção contra o avanço do Comando Vermelho (CV) em 26 comunidades da Zona Norte, resultou até o início da tarde na prisão de mais de 80 pessoas e na morte de mais de 60 indivíduos, incluindo policiais. Em retaliação, criminosos incendiaram barricadas e lançaram drones com explosivos, elevando o nível de alerta na cidade.

“O Rio está sozinho”, diz Castro

Ao comentar a ofensiva — que classificou como “a maior da história do Rio” desde 2010 —, Cláudio Castro acusou o governo federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) de deixarem o estado “sozinho” no enfrentamento ao crime organizado.

Segundo o governador, o Planalto negou três pedidos de apoio, incluindo o empréstimo de blindados, e apresentou “uma justificativa diferente a cada dia” para a recusa. Ele afirmou que um dos pedidos foi barrado sob o argumento de que a cessão dos veículos exigiria a decretação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), medida que Lula se opõe.

“O Rio de Janeiro não é responsável por fabricar armas nem drogas. O que está ao nosso alcance estamos fazendo. Isso não é briga política, é um pedido de ajuda”, disse Castro, ao lado do secretário de Segurança, Victor Santos, que confirmou que toda a logística da operação foi realizada pelo próprio estado, sem apoio federal.

Planalto rebate

Auxiliares do presidente Lula reagiram às declarações com irritação. Integrantes do governo federal interpretaram que o governador tenta transferir sua responsabilidade pela crise da segurança no estado para a União e criticaram a falta de comunicação prévia sobre a operação.

Fontes do Planalto explicaram ainda que não houve solicitação formal de blindados ao Exército, e que o uso desses equipamentos só poderia ocorrer em caso de GLO. Uma fonte militar criticou a hipótese de ceder blindados “sem saber o que será feito com eles”.

Lula mantém sua posição contrária ao uso das Forças Armadas em ações diretas contra o crime organizado, sustentando que “o Exército não deve subir morros”. Ainda assim, auxiliares destacam que o governo não se opõe à cooperação em operações conjuntas planejadas entre União e estados.

Governo reage e lista ações no Rio

No início da tarde, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) divulgou nota em que rebateu as críticas de Castro e listou uma série de ações federais em apoio ao Rio de Janeiro.

Segundo o texto, a Força Nacional de Segurança Pública atua de forma permanente no estado desde outubro de 2023, com autorização válida até dezembro de 2025 — e todos os pedidos de renovação feitos pelo governo foram atendidos.

O MJSP também destacou que, apenas em 2025, a Polícia Federal realizou 178 operações no estado, das quais 24 voltadas ao tráfico de drogas e armas, resultando em 210 prisões, dez toneladas de drogas e 190 armas apreendidas, incluindo 17 fuzis.

Entre as operações citadas estão a Forja, que desmantelou uma fábrica de fuzis do Comando Vermelho, e a Buzz Bomb e Libertatis, que prenderam operadores de drones usados por facções.

A Polícia Rodoviária Federal, segundo a nota, também mantém operações contínuas no Rio, com a recuperação de mais de 3 mil veículos e apreensão de 29 toneladas de maconha, 3,9 toneladas de cocaína e 72 fuzis desde 2023.

O governo federal ainda mencionou investimentos de mais de R$ 430 milhões em segurança e sistema penitenciário desde 2019, ressaltando que boa parte dos recursos permanece disponível, sem execução pelo estado.

Entre as medidas de cooperação, o ministério citou acordos para a criação de células integradas de inteligência e comitês de recuperação de ativos, além da oferta de dez vagas em presídios federais para abrigar líderes criminosos, após reunião entre Castro e o ministro Ricardo Lewandowski, em fevereiro deste ano.

“A missão é a cooperação total entre União e o Rio de Janeiro. Estamos empenhados em combater o crime de forma cooperativa e integrada”, afirmou o ministro Lewandowski na ocasião.

O MJSP concluiu reafirmando seu compromisso com a segurança pública no estado e dizendo que as ações federais visam “fortalecer o combate ao crime organizado, reduzir índices de criminalidade e garantir maior sensação de segurança à população”.

O embate expõe o clima de tensão entre o governo do Rio e o Planalto e reforça a falta de coordenação entre os dois lados em meio à piora da violência no estado.