Praticantes do forró em Fortaleza transformam espaços públicos em palco
Grupos se reúnem em pontos turísticos e praças da Capital para celebrar o ritmo nordestino e compartilhar a experiência da dança com o público
08:00 | Ago. 16, 2025

Toda quinta-feira, a Ponte dos Ingleses, na Praia de Iracema, em Fortaleza, vira palco para a prática do forró. Reunido no espaço público, o grupo Forró na Ponte posiciona a caixa de som e compartilha o espaço com os turistas e moradores, que observam os movimentos dos dançarinos.
Esse é um dos vários grupos que levam a prática do forró estilizado para lugares como a Ponte dos Ingleses e o Parque Rachel de Queiroz, no bairro Presidente Kennedy, onde se reúnem os grupos Somos Mais Forró, Só Forrozão e Praça dos Forrozeiros.
Os praticantes saem de áreas variadas da Capital, muitos da Região Metropolitana, para "treinar" o forró estilizado. Os pontos de partida aos que chegam na Praia de Iracema, a partir das 19h30min, são diferentes, entre eles Maracanaú, Caucaia, Pacatuba e Horizonte. “É tanto canto que a gente ficou muito surpresa”, diz a organizadora do Forró na Ponte, Fabiany Oliveira, 45.
O ritmo e suas matrizes tradicionais, ambos associados à região Nordeste, foram reconhecidos como integrantes do Patrimônio Cultural do Brasil em 2021. Mas para o grupo Forró na Ponte, a ligação entre a expressão artística e o Estado do Ceará permanece atemporal.
“Olha, eu nem diria somente o forró, mas a dança em si, sabe? Esse movimento, essa conexão de pessoas, de alma, o movimento em si”, reflete a co-organizadora, Fabiany Oliveira, 45.
Para o professor e coreógrafo Edson Nobre, que atua há quase duas décadas no universo da dança a dois, a escolha da prática em espaços públicos de forma gratuita fortalece o forró estilizado e a dança.
Ao avaliar as reuniões dos grupos, Nobre ressalta que a prática representa um movimento de resistência cultural. "Para mim, a essência do forró estilizado é um pouco subjetiva de cada pessoa", comenta.
"As práticas não têm banda de forró. São as pessoas que levam as suas caixas de som e botam para tocar as músicas de 'forró das antigas'. Às vezes é um DJ que vai tocar, às vezes eles contratam algum cantor", diz.
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O surgimento do Forró na Ponte
Foi durante uma crise de depressão, seguindo o término de um relacionamento tóxico, que a organizadora encontrou um grupo de forró próximo de casa. O ritmo abriu espaço para que Fabiany iniciasse não apenas o desmame das medicações, mas que pudesse estabelecer as conexões que permitiram o estabelecimento do Forró na Ponte.
Ao lado da amiga, o organizador Diego Lima, 37, destaca que o grupo é aberto para todas as pessoas. “Não damos aula, porque não tem como se concentrar aqui, numa situação de vento forte, muitas pessoas passando. As pessoas vão pras academias, fazem as aulas, aprendem lá e aqui elas praticam”, explica.
É exatamente a diversidade dos participantes (incluindo alunos de escolas de dança variadas, e até praticantes solo), que transforma o projeto para Diego. Cada um aprendeu por meio de uma sistemática própria de ensino e, reunidos na Ponte dos Ingleses, as diferentes formas de praticar o forró são mescladas.
Parte do grupo Forró na Ponte há cerca de dois meses, a nail designer Gislane Paula, 21, decidiu conhecer o espaço por indicação dos amigos. “Eu comecei no forró há sete meses, procurando um ponto de refúgio mesmo, um momento de espairecer e esquecer todo o resto. A dança faz a gente esquecer de muitas coisas, é realmente uma terapia”, diz.
Outro participante, o servidor público Luiz Júnior, 50, ressalta que sai diretamente do trabalho na quinta-feira rumo à Praia. É se movimentando pela ponte, enquanto a música toca, que encontra um momento de descanso.
“Eu sempre tive problemas de coordenação motora. Quando eu comecei a praticar as aulas de forró, aí notei que melhorou muito nessa parte, sabe? Então, estou continuando”, afirma.
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Grupos em Fortaleza: os primeiros passos do forró
O forró estilizado, segundo o professor Edson Nobre, pode ser musicalmente diferente do forró tradicional, ou “pé de serra”, partindo de outros ritmos, como a lambada e o forró de gafieira.
“O forró de gafieira é uma dança que tem mais de 100 anos aqui, muito característica do Ceará”, detalha. “Falando da dança, a gente vê muitos movimentos do forró estilizado que vêm do forró de gafieira. O estilizado veio surgir nos anos 1990”.
Em outro espaço público da Capital, a música parece preencher a distância entre o bairro Presidente Kennedy e a Praia de Iracema. Cerca de nove quilômetros separam os dançarinos no parque Rachel de Queiroz de suas contrapartidas na Ponte dos Ingleses, mas é o forró que os aproxima — toda terça e quinta-feira, o grupo se reúne das 20 às 22 horas.
“Esse projeto acontece há nove anos. Antes de ser no parque Rachel de Queiroz, era na praça do North Shopping (ao lado do parque), e quando o parque inaugurou, a gente veio”, explica o instrutor Henrique Braga, 32. “É gratuito, só ir pra aula mesmo no horário e dançar”.
Apesar do carinho por outros estilos de dança, a prática do forró entrou na vida de Braga em meados de 2012, ao participar de festas ao lado da ex-namorada: “Ela dançava (forró) com todo mundo e eu ficava ‘chupando o dedo’. Aí eu disse: ‘esse negócio está muito errado, vou atrás de aprender’”.
A interação proporcionada pelo ritmo também foi benéfica para Aurilúcia “Lu” Soares, 36, que iniciou como praticante e agora é uma das instrutoras do forró no parque. Ela acompanhava as amigas e pretendia apenas assistir, até que a chamaram para dançar.
“Eu fico encantada com os meus alunos, com os olhos cheios de lágrimas, porque eu ensinei e eles estão arrasando agora. Cada um que passa pela minha mão, me dedico muito”, confessa.
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Nos passos da dançarina Gleisi Silva, 37, o forró tem um sinônimo: liberdade. “Eu era muito presa em questão de timidez, nem falava. Então, trouxe a liberdade de poder me expressar na dança, em movimento, nos passos… Ainda me tremo um pouquinho, mas bem menos”, sorri.
Para o professor Edson Nobre, a presença do forró estilizado no Ceará passou pelos avanços concedidos ao ritmo, como o título de patrimônio cultural. Por outro lado, a informalidade na área ainda é uma questão a ser debatida.
“Existem muitos profissionais que não são bem remunerados para trabalhar com forró estilizado. A pessoa tem vontade de trabalhar com aquilo, mas não ganha o suficiente”, lamenta. “E geralmente é assim: o professor de dança tem que ser empreendedor, social media, designer… Tem que ser tudo para se dar bem no universo do forró, e outra: persistência”.
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Grupos em Fortaleza: conheça três práticas de forró
Confira os horários e datas de grupos que praticam forró em espaços públicos de Fortaleza.
Forró na Ponte
- Quando: toda quinta-feira
- Horário: a partir de 19h30min
- Onde: Ponte dos Ingleses (Rua dos Cariris, S/N - Praia de Iracema)
- Contato: @forronaponte (Instagram)
Somos Mais Forró
- Quando: todo domingo
- Horário: a partir das 18 horas
- Onde: Parque Rachel de Queiroz (Rua Edgar Falcão, S/N - Presidente Kennedy)
- Contato: @somos_mais_forro (Instagram)
Só Forrozão - Praça dos Forrozeiros
- Quando: terça-feira
- Horário: das 20 às 22 horas
- Onde: Parque Rachel de Queiroz (Rua Edgar Falcão, S/N - Presidente Kennedy)
- Contato: @soforrozao_grupodedanca (Instagram) e @praca_dos_forrozeiros (Instagram)
Atualizado em 17/08/25 às 15h