Consumo de adoçantes artificiais podem acelerar perda de memória, sugere estudo da USP
Açúcar em excesso é reconhecidamente prejudicial à saúde metabólica e cognitiva. A ideia de que adoçantes seriam alternativa segura está cada vez mais questionada
20:33 | Set. 04, 2025
Um estudo realizado no Brasil apontou que o consumo frequente de adoçantes artificiais de baixa ou nenhuma caloria pode estar ligado a um declínio cognitivo mais rápido, afetando principalmente a memória e a fluência verbal.
A investigação, conduzida por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e publicada na revista Neurology, acompanhou mais de 12 mil voluntários ao longo de oito anos, tornando o estudo uma das análises mais abrangentes já feitas sobre o tema.
Os pesquisadores observaram que pessoas que ingeriram maiores quantidades de adoçantes como aspartame, sacarina, acessulfame-K, eritritol, sorbitol e xilitol apresentaram desempenho cognitivo pior do que aquelas que consumiam pouco ou nada. Em termos gerais, os grandes consumidores tiveram uma taxa 62% maior de declínio global da cognição.
Quando a análise foi feita por domínio, os resultados chamaram ainda mais atenção: na fluência verbal, a queda chegou a ser até 173% superior, enquanto na memória foi 32% maior. A única exceção encontrada foi a tagatose, que não mostrou associação significativa com piora cognitiva.
“Já sabemos que o envelhecimento traz, de forma natural, uma perda lenta e progressiva da cognição. O que encontramos é que o consumo de adoçantes acelera esse processo”, explica a geriatra e pesquisadora Claudia Suemoto, coordenadora do estudo.
O que explica a associação?
Ainda não há consenso sobre os mecanismos envolvidos, mas hipóteses levantadas incluem efeitos neurotóxicos e processos inflamatórios desencadeados pelos metabólitos dos adoçantes.
Pesquisas em animais também sugerem que esses compostos podem alterar a microbiota intestinal e comprometer a barreira hematoencefálica, considerada a estrutura que protege o cérebro contra agentes nocivos.
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Limitações e ressalvas
Os pesquisadores destacam que o estudo é observacional, ou seja, não permite afirmar uma relação de causa e efeito.
Além disso, os dados de consumo foram autorrelatados, o que pode trazer imprecisões.
Outro ponto é que a sucralose não entrou na análise, por não estar entre os adoçantes mais consumidos no Brasil em 2008, quando a pesquisa começou.
Mesmo com essas restrições, especialistas consideram os resultados relevantes.
A epidemiologista nutricional Renata Levy, da USP, lembra que a Organização Mundial da Saúde (OMS) já não recomenda o uso de adoçantes como estratégia de emagrecimento ou prevenção de doenças crônicas, com exceção de casos específicos em pessoas com diabetes.
O que a pesquisa diz sobre o dilema: açúcar ou adoçante
O açúcar em excesso é reconhecidamente prejudicial à saúde metabólica e cognitiva. A ideia de que os adoçantes seriam uma alternativa segura, no entanto, está cada vez mais questionada.
“Já havia evidências ligando esses produtos a doenças cardiovasculares e até a alguns tipos de câncer. Agora, vemos sinais também sobre a cognição. Isso reforça a necessidade de cautela”, afirma Claudia.
A pesquisadora, que destacou já ter sido consumidora assídua de refrigerantes zero e café adoçado artificialmente, acredita que o uso rotineiro desses produtos deve ser repensado.
“É cedo para mudanças em políticas públicas, mas é um sinal importante para a população e para a ciência: precisamos investigar mais, em especial com ensaios clínicos”, enfatiza.