Aumento de trabalho escravo na construção civil preocupa Ministério Público
"Na construção civil, certamente, a cada ano está ficando pior. Não existiam situações no passado, era quase inimaginável. Agora, está se tornando permanente, comum. Isso nos preocupa demais", diz o procurador da Coordenadoria Nacional de Erradicação de Trabalho Escravo do MPT, Rafael de Araújo Gomes.
Em abril, o Ministério do Trabalho e Emprego e o MPT em Bauru (SP) constataram que a construtora Croma mantinha 50 trabalhadores em situação análoga à escravidão em obras de um conjunto habitacional na cidade de Bofete (SP). A empresa foi contratada pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU).
Procurada, a construtora Croma disse que concordou em assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPT para quitar os débitos trabalhistas com os 50 funcionários. A empresa se comprometeu também a pagar todos os salários atrasados aos empregados, assim como indenizações individuais no valor de R$ 500 para cada migrante encontrado em situação irregular.
Em maio, fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagraram 90 trabalhadores em situação análoga à de escravidão em uma obra do Programa Minha Casa, Minha Vida, do governo federal, no município de Fernandópolis (SP). A empresa Geccom, responsável pelo empreendimento, foi autuada por diversas irregularidades, como jornada de trabalho até 15 horas, emprego de trabalhadores sem registro em carteira, alojamentos em situação precária e falta de equipamentos de segurança.
A empresa providenciou a rescisão de contrato dos empregados, pagou as verbas indenizatórias e os salários devidos. O advogado da Geccom, Shindy Teraoka, disse que a empresa irá comprovar ao MTE que os trabalhadores não estavam em condição análoga à escravidão e que já acertou todos os débitos com os empregados.
De acordo com o procurador Gomes, com a "explosão" do crédito imobiliário, especialmente devido a programas do governo federal como o Minha Casa, Minha Vida, algumas construtoras buscam firmar o maior número de contratos possível, sem ter condições de realizar as obras.
"(As empresas não sabem) como vão contratar, qualificar e dar andamento a essas obras. Se vão ter funcionários suficientes ou não. Aparentemente está ocorrendo isso. Uma ganância de fechar a maior parte de contratos, assegurar os recursos e só depois se preocupam se vão conseguir entregar o imóvel. E não conseguem", destaca.
De acordo com o vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP), Haruo Ishikawa, há falta de mão de obra no setor, o que leva empreiteiras a subcontratar empresas não qualificadas para fornecer os trabalhadores.
"São os subempreiteiros contratados que estão praticando isso. Estamos sugerindo para as empresas que, ao contratar o subempreiteiro, verifiquem realmente as condições de trabalho apresentadas", destaca. "A responsabilidade também é da empresa contratante, que é a empresa construtora principal", acrescenta.
De acordo com o vice-presidente, o Sinduscon está fazendo uma campanha com seus associados para coibir a situação análoga à escravidão, além de incluir a questão no acordo coletivo do setor. "Da nossa convenção coletiva de 2009 para frente, nós, preocupados com essas questões da contratação de mão de obra, colocamos na Cláusula 10 a maneira como as construtoras deverão contratar as subempreiteiras: verificando todos os itens regulares regidos pela CLT", destaca.
Segundo o MPT, no ano passado, em todo o país, foram resgatados 2.428 trabalhadores em situação análoga à escravidão. Até março deste ano, os fiscais resgataram 339 trabalhadores. O coordenador da Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, vinculado ao Ministério Público do Trabalho, frei Xavier Plassat, estima que, no país, haja de 20 mil a 50 mil pessoas exercendo atividades em condições análogas à escravidão.
Agência Brasil