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Irmã Dulce: símbolo do Estado social

01:30 | Mai. 16, 2019
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Em meio aos desencontros vividos pelos brasileiros na ordem política, social, econômica e até institucional, cresce a necessidade de a Nação inteira voltar-se para suas raízes, na tentativa de encontrar a própria alma para nela haurir as energias necessárias para o enfrentamento dos atuais desafios. E isso não poderá ser feito por uma sociedade passiva, sem voz. Do mesmo modo, um País dividido dificilmente conseguirá isso. O Brasil tem um povo generoso que nunca, anteriormente, teve no ódio o elemento impulsionador de seu projeto de sociedade apesar de sua elite já ter usado a escravidão e a ditadura para atingir seus propósitos. E tem referenciais históricos, na política, na ciência e na religião para respaldar essa assertiva. Coincidentemente, esta semana ganhou relevo a lembrança de uma dessas personalidades de acatamento unânime na sociedade brasileira e de grande força simbólica: a irmã Dulce, o jeito baiano e brasileiro de ser solidário, generoso e compromissado com o ser humano integral.

O anúncio de sua próxima canonização ultrapassa as fronteiras de uma denominação religiosa particular - a católica - e alcança a dimensão social e política, lembrando ao Brasil que já existiu outra forma de os brasileiros conviverem entre si, sem negar a identidade do outro. Dentro dos limites de seu universo cultural e social, ela encarnou o inconformismo com as desigualdades sociais, aceitas passivamente por uma elite política e econômica cega à realidade circundante. Para isso teve de enfrentar a indiferença dos ricos, a frieza da burocracia estatal e o formalismo eclesial sem alma.

Embora movida pelo amor e compaixão provindos de uma espiritualidade vívida não se limitou apenas à vivência da caridade em âmbito individual, mas percebeu a necessidade de uma ampla ação social, que incomodava os bem-pensantes, embora usasse a tática do envolvimento e não da ruptura. Nem por isso deixou de ser firme quando, para defender os párias sociais, teve de escolher entre a passividade conformista (sob o pretexto da obediência) e a exigência evangélica, enfrentando o poder político e o eclesiástico. Nesse afã, não hesitou em enfrentar as barreiras de classe, de ideologia, de cor e de religião.

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Seu legado social só tem condições de se sustentar num Estado de garantias sociais, pois tem no SUS seu principal sustento, sobretudo o grande hospital que se originou no galinheiro do seu convento e hoje é o maior da Bahia. E tantas outras obras sociais. Não espanta que o exemplo de Irmã Dulce inspire os defensores do Estado social e de uma sociedade tolerante e compassiva. Nada de se regressar aos anos 1930, quando a santa baiana enfrentava os maiores percalços pelo fato de o País não dispor de uma rede de seguridade social, que conquistaria depois e que hoje está seriamente ameaçada. 

 

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