Em crise, sistema de ônibus de Fortaleza pode deixar de atender áreas deficitárias, diz Sindiônibus

| TRANSPORTE PÚBLICO | Com a falência da Santa Cecília, cinco das 14 empresas vencedoras da concessão do transporte coletivo de Fortaleza já não operam mais

06:30 | Ago. 12, 2025

Por: Samuel Pimentel
DESDE a pandemia, empresas de ônibus enfrentam crise que ameaça o setor (foto: Samuel Setubal)

O encerramento das atividades da empresa de ônibus Santa Cecília ressalta uma crise que se arrasta há anos no sistema de transporte urbano de Fortaleza. Mas, para o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus), Dimas Barreira, caso a situação continue se deteriorando, soluções mais drásticas podem ser necessárias para preservar o sistema e as empresas, como a redução da área de atendimento na Cidade.

Com o fim das atividades da Santa Cecília após quase 80 anos de mercado, cinco das 14 empresas vencedoras da concessão pública do transporte coletivo de Fortaleza já não operam mais.

Dimas afirma que o problema é nacional e requer atuação do Governo Federal, já que a capacidade de financiamento de estados e municípios para o sistema de transporte não tem sido suficiente.

"Tem faltado capacidade de prefeituras e governos para sustentar a operação com a qualidade que a população demanda, com toda razão".

Enquanto esse "socorro" não chega, algumas cidades, como o Rio de Janeiro, implementaram soluções emergenciais para não colapsar seus sistemas de ônibus coletivos: deixar de atender áreas deficitárias na cidade.

Com mais uma empresa de transporte falida em Fortaleza, cresce a possibilidade de medida similar ser adotada.

"O que está acontecendo em várias cidades do Brasil, como em Teresina, Natal e no próprio Rio de Janeiro, é que partes da cidade já não são mais atendidas porque não se viabilizam", pontua.

Sobre a realidade de Fortaleza, ele comenta que das mais de 300 linhas de ônibus existentes, aproximadamente 80 são superavitárias, menos de 1/3.

Desde a pandemia, o número de passageiros do transporte coletivo reduziu mais de 50%. Em 2024, O POVO realizou levantamento que revelou que o número de viagens também diminuiu, sendo que mais da metade das linhas tiveram redução - aumentando o tempo de espera.

Outro fato que também está relacionado com essa crise foi o fim da função de cobradores de ônibus, com a adoção de catracas eletrônicas e com os motoristas assumindo a dupla função.

O presidente do Sindiônibus ainda detalha que a falta de financiamento sustentável para o sistema é refletida na qualidade do serviço. Segundo ele, a frota de ônibus de Fortaleza "nunca foi tão antiga" porque quase totalidade das empresas não tem condições de renovar a frota a contento.

"Essa é uma questão que a gente vem chamando a atenção. O que não queremos é que chegue ao caos no sistema".

Conforme O POVO apurou, outra empresa, a Siara Grande, também estaria em dificuldades - por enquanto não tão sérias quanto a que extinguiu a Santa Cecília.

Em meio às dificuldades financeiras das empresas que compõem o sistema, o rastro deixado pelo caminho é de precarização e dívidas.

No caso da Santa Cecília, um processo de reintegração de posse no início deste ano sacramentou o início do fim da empresa. Em dezembro de 2024, decisão do juízo da 2ª Vara da Comarca de Itaitinga autorizou a apreensão de ônibus da empresa por parte do Banco Volvo.

Ao todo, foram 14 ônibus apreendidos após a empresa não conseguir pagar parcelas do financiamento. E, segundo o Sindicato dos Trabalhadores do Transporte Rodoviário do Estado do Ceará (Sintro-CE), a medida motivou a demissão de 60 trabalhadores, em fevereiro.

O presidente do Sintro-CE, Domingos Neto, afirma que, apesar das promessas da empresa, esses profissionais seguem sem receber as parcelas das verbas rescisórias após acordo. Agora, com a dispensa de mais de 200 profissionais, o sindicato acionará mais uma vez o Ministério Público do Trabalho (MPT) para mediar a situação.

"A Santa Cecília descumpria suas obrigações há um bom tempo, mas de uns três anos para cá piorou. Já fizemos várias denúncias, mas a empresa deixava de pagar salários, férias", continua.

Ainda segundo Neto, a empresa só realizou o pagamento da primeira quinzena de junho. Desde então, os funcionários ficaram sem receber e, após 11 dias de trabalhos paralisados, a empresa anunciou sua falência na última sexta-feira, 8.

O POVO procurou a Prefeitura de Fortaleza para questionar sobre a crise no sistema. Quem respondeu foi a Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor), informando que acompanha a operação de 31 linhas que eram operadas pela Santa Cecília com cerca de 45 ônibus. Como solução inicial, dez ônibus reservas foram colocados no lugar para garantir o cumprimento das viagens.

Sobre a crise descrita no sistema de transportes de Fortaleza, a Etufor informou que a Prefeitura informou que "está em diálogo com o Sindiônibus para desenvolver soluções de apoio às empresas e melhorar a qualidade do transporte público ofertado na Cidade".

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