Bancos fazem corrida por cadastramento de clientes no Pix, que vai mudar hábitos de consumo

Especialistas apontam novas tendências no mercado financeiro, como a diminuição no uso de papel moeda. Em fase de operações restritas desde 3 de novembro, ferramenta do Banco Central já ultrapassa 60 milhões de chaves cadastradas

13:55 | Nov. 06, 2020

Transação será feita em até 10 segundos. (foto: Joelfotos/Pixabay)

Com a premissa de possibilitar transações financeiras 24 horas por dia, 7 dias por semana, em até 10 segundos, de banco para banco, sem cobrança de taxas adicionais para pessoas físicas, o Pix será lançado para todo o público em 16 de novembro pelo Banco Central (BC). A novidade gera expectativas no mercado e promete alterar drasticamente a cultura de consumo do brasileiro, conforme avaliação de especialistas. Em fase de operações restritas desde 3 de novembro, ferramenta do Banco Central já ultrapassa 60 milhões de chaves cadastradas

O efeito que já ocorre nos principais bancos em atividade no Brasil é o incentivo a clientes para cadastrarem chaves do Pix em suas contas já existentes. A disputa de atenção é feita por meio de estratégias diversas. Programas de fidelização e sorteios de prêmios de até R$ 1 milhão são alguns dos atrativos fornecidos pelas empresas. O cadastro da chave do consumidor, que pressupõe a indicação de dados importantes de clientes, é imprescindível aos bancos que quiserem aproveitar a tendência de popularização do novo serviço.

SAIBA MAIS | Fase restrita de pagamentos pelo Pix começa nesta terça-feira,3

Valor médio de transações do Pix foi R$ 90 no primeiro dia de teste

“A corrida pelo cadastramento dos clientes se deve às necessidades mercadológicas. Quem conseguir mais cadastramentos terá mais possibilidades de realizar transações no mercado e consequentemente poderá fidelizar melhor seus clientes ou até mesmo ampliar sua base”, afirma Juliano Pinheiro, especialista em mercado financeiro e autor do livro Mercado de Capitais, em entrevista ao O POVO.

O especialista ainda analisa que o novo sistema de pagamento tem potencial de dar mais independência aos clientes, além de aumentar a capacitação dos profissionais que lidam com a ponta final. “Acredito que essas mudanças resultarão em um cliente com mais poder de negociação, mais preparado e mais exigente. Ele espera mais transparência das instituições financeiras e, apesar de digitais, quer experiências mais personalizadas para usufruir dos serviços oferecidos”, afirma.

No entanto, Juliano alerta para o surgimento de instituições financeiras pouco qualificadas ou despreparadas para lidar com a segurança das informações fornecidas. Preocupação esta que deverá ser recorrente para os potenciais usuários do novo serviço, afirma Celso Sant'Ana, mestre em Finanças pela UFMG e fundador da empresa Psicologia Financeira.

"Em um primeiro momento, do ponto de vista psicológico, quando há uma inovação, ainda mais quando parte de um órgão do Governo, existe uma certa desconfiança. As pessoas podem não entender, mas isso vai se acomodando ao longo do tempo e mais pessoas devem passar a utilizar esse método, que vai incentivar modos de consumo”, aponta Celso. A chegada do Pix poderá incentivar o consumidor a ter mais tipos de relacionamentos financeiros, devido à amplitude de opções que se abrem com a inovação, tornando o mercado mais competitivo.

LEIA MAIS | Pix trará inovações e aumento de competitividade no mercado financeiro, afirmam especialistas

Com a estabilização dos serviços e o aumento da confiança popular, o sistema instantâneo deverá atrair usuários pela facilidade de acesso. “Grande parte da população brasileira já utiliza redes sociais e ferramentas digitais e, com o Pix, acredito que vai ser mais acessível para que essas pessoas saibam utilizar um método de pagamento, talvez até muito mais fácil do que outros, como cartão de crédito e sistemas online", avalia Celso.

Redução de custos 

 

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) estima que haverá uma economia de cerca de R$ 10 bilhões ao ano em custos logísticos, devido à tendência de redução do uso de dinheiro em espécie em transações comerciais. A instituição avalia que a iniciativa deverá reduzir a necessidade de saques em espécie nas agências e nos caixas eletrônicos, o que também traz maior conveniência aos clientes bancários.

“A economia tende a ganhar mais velocidade e ritmo, já que recursos entram e saem das contas de forma instantânea, podendo estimular mais investimentos e ganhos ao comércio. Há um grande potencial para auxiliar a economia num momento em que é importante a retomada do crescimento econômico”, avalia Isaac Sidney, presidente da Febraban, em nota à imprensa.

LEIA MAIS | Bancos digitais e fintechs buscam ganhos com Pix

O diretor de Organização do Sistema Financeiro do Banco Central do Brasil, João Manoel Pinho de Mello, reforça o benefício do novo serviço digital. Em webinar organizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Mello ressaltou que a digitalização dos meios de pagamento, como o Pix, deverá substituir gradualmente a emissão de papel moeda, que custa caro à sociedade brasileira, de acordo com informações da Agência Estado.

Diminuição da oferta de empregos 

 

O outro lado da moeda é posto por José Eduardo Marinho, presidente em exercício do Sindicato dos Bancários do Ceará (Seeb/CE), que não mantém o mesmo otimismo ao avaliar o contexto, principalmente, em relação aos impactos que deverão trazer aos funcionários de banco. O presidente reconhece a tendência de redução dos custos, mas afirma que este fenômeno, provocado pelas instituições patronais, deve provocar desemprego na área.

“Boa parte dos serviços de uma agência bancária, como troca de papel, troca de papel moeda, troca de títulos, tendem a reduzir cada vez mais. Então, existe um risco de que o emprego dos trabalhadores bancários seja reduzido. Pode ser que esse emprego seja transformado em alguma outra atividade, como o intermédio de transações financeiras? Sim, mas não necessariamente na mesma ordem”, afirma José Eduardo Marinho.

De acordo com ele, mais de 13 mil bancários perderam o emprego no Brasil no intervalo de um ano. “Quando uma quantidade de pessoas deixa de acessar determinado serviço, existe um encolhimento nas demandas. Se antes cerca de 5% ou 6% da população acessavam uma agência bancária durante um mês, agora esse número deve passar a 3% ou 4%. O serviço bancário mais tradicional tende a sofrer redução da quantidade de pessoas atendendo”, complementa o presidente do Sindicato.