Ministério da Saúde estaria pressionando até a Abin para maquiar dados sobre Covid-19, afirma jornal

O horário das atualização foi modificado, segundo fontes, para não ser apresentado em rede nacional

11:29 | Jun. 08, 2020

Os dados disponibilizados na nova versão do site não apresentam o histórico da doença. (foto: Reprodução/Ministério da Saúde)

Os militares que ocupam cargos fundamentais na cúpula da Saúde estariam pressionando técnicos da pasta para maquiar os dados relativos a casos e mortes de Covid-19 no país. Essa influência funcionaria até dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), responsável por produzir relatórios internos para o Centro de Coordenação de Operações (CCOP) da Casa Civil. Na sexta-feira, 5, os dados começaram a ser apresentados em horários bem mais tardio e de forma reduzida.

As informações são do Valor Econômico.

Esse horário seria uma ordem, segundo fontes, do presidente Jair Bolsonaro, por ser posterior ao Jornal Nacional, principal telejornal da emissora Globo. Além disso, os números passaram por alterações tanto no números de casos confirmados como de óbitos. No sábado, 6, o Ministério da Saúde apresentou uma nova versão do portal de coronavírus, dessa vez, com informações mais básicas e menos detalhadas. O site covid.saude.gov.br apresenta agora apenas a atualização de casos recuperados, novos casos da doença e óbitos, sem o histórico da doença no Brasil.

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Funcionários relatam que essa é uma insistência do coronel Elcio Franco Filho, secretário-executivo da pasta. Segundo eles, o general quer que passem a ser divulgadas apenas as mortes ocorridas e confirmadas no mesmo dia.

O Ministério da Saúde passou e vai continuar a publicar somente os registros de óbitos e casos confirmados a cada dia, sem o dado acumulado. As mudanças deixam os gestores da área sem capacidade de interpretar os dados ao longo do tempo e sem referência da curva da epidemia no país, como informaram os técnicos. 

“A epidemiologia básica é justamente olhar todos esses dados em conjunto. As apresentações preparadas para o público continham todos esses dados”, afirmou um servidor da pasta. Ele também afirma que a coronel Franco e o adjunto, Jorge Kormann, vêm insistindo, através de um aplicativo de mensagens, na mudança do método de contagem. O Valor teve acesso às mensagens, e em uma delas, Kormann encaminhou vídeo publicado pelo empresário Luciano Hang. “O vídeo acima é para refletirmos sobre o mapeamento de óbitos diários”, escreveu ele.

No vídeo, Hang promete fazer uma live e “mostrar o que está por trás dos números” recorde de mortes pela Covid-19. Ele pede também que o governo passe a publicar apenas as mortes confirmadas no mesmo dia. 

O Coronel Franco teria também solicitado no grupo para que a Abin “verifique a possibilidade de não trabalhar com dados acumulados”. Como os números da Abin são usados para consumo interno, são usadas por Bolsonaro e outros líderes para tomar medidas a respeito da pandemia. Sem as informações, o presidente vai tomar decisões sem dados científicos. 

Um boletim epidemiológico semanal elaborado pelos técnicos foi “censurado” pela cúpula do ministério. O documento teria 95 páginas de informações da doença e a tendência por Estado. Mas, por conter dados cumulativos, o material que seria divulgado na semana que vem foi barrado pelo coronel.

O Gabinete de Segurança Institucional (GSI), responsável pela Abin, não quis se pronunciar. Já o Ministério da Saúde disse em nota que “os debates ocorridos ao longo da semana tiveram o objetivo de qualificar a disponibilidade das informações e retratar de forma mais adequada os diversos cenários em território nacional”.

Acrescentou ainda que o uso da data de ocorrência (e não da data de registro) vai ajudar na criação de um panorama mais realista do que ocorre em nível nacional. Devendo ainda definir condições para a adoção de medidas mais adequadas para o enfrentamento da Covid-19.