Astrônomos usam Lua como espelho para observar atmosfera da Terra, em pesquisa para identificar exoplanetas habitáveis

Ao analisar a atmosfera da Terra durante um eclipse lunar, os astrônomos identificaram visualmente o ozônio - molécula pode ser um dos indicativos de vida em outros planetas

14:18 | Ago. 07, 2020

Astrônomos usam Lua como espelho para observar atmosfera da Terra (foto: ESA/Hubble, M. Kornmesser)

A procura por exoplanetas habitáveis (aqueles que compõem outros sistemas solares) pode parecer um objetivo de ficção científica, mas diversos cientistas estão focados nesta missão. Astrônomos estimam que poderia haver até um bilhão de outros planetas como a Terra apenas na Via Láctea. Para encontrá-los, é preciso definir aspectos que os caracterizam como possivelmente habitáveis, permitindo que pesquisadores tenham uma ideia de o quê procurar.

Foi o que os astrônomos da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês) desejavam ao se utilizar de um eclipse lunar total para observar a atmosfera da Terra. Usando o telescópio espacial Hubble e a Lua como um espelho, eles puderam detectar visualmente o ozônio na atmosfera terrestre.

Isso foi possível porque os produtos químicos na atmosfera deixam uma “assinatura reveladora” ao filtrar determinadas cores da luz das estrelas, afirma comunicado da pesquisa. “Encontrar o ozônio no espectro de uma exo-Terra [um exoplaneta parecido com a Terra] seria significativo porque é um subproduto fotoquímico do oxigênio molecular, que é um subproduto da vida”, explica, em nota, Allison Youngblood, pesquisador principal das observações do Hubble.

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Ou seja, a existência de ozônio nas atmosferas poderia indicar a possibilidade de vida nos exoplanetas. No entanto, a presença única da molécula é insuficiente para garantir a hipótese. “Você precisaria de outras assinaturas espectrais além do ozônio para concluir que havia vida no planeta, e essas assinaturas não podem ser vistas sob luz ultravioleta", alerta o astrônomo.

Como a observação funcionou

A melhor forma de entender como detectar vida em outros planetas é estudando o único planeta habitável que se conhece: a Terra. Portanto, os astrônomos decidiram analisar a atmosfera terrestre no momento de alinhamento perfeito da Terra com o Sol e a Lua durante um eclipse lunar total. Veja a posição dos corpos celestes durante o eclipse lunar:

No entanto, em vez de apontar o Hubble para a Terra, os pesquisadores usaram a Lua como um espelho refletindo a luz do Sol, filtrada pela atmosfera terrestre. Assim, foi possível detectar as cores das assinaturas dos produtos químicos, como o ozônio. “O uso de um telescópio espacial para observações de eclipses é mais limpo do que os estudos baseados no solo, porque os dados não são contaminados pela observação da atmosfera da Terra”, explica a nota.

Ilustração do telescópio espacial Hubble direcionado para a Lua durante um eclipse lunar total (Foto: ESA/Hubble, M. Kornmesser)

Mesmo assim, o processo não foi fácil. A Lua não é um refletor perfeito, por ter áreas mais escuras e outras mais brilhantes. Além disso, o satélite natural está tão perto do planeta Terra que o telescópio Hubble precisou focar em apenas uma região lunar “para rastrear com precisão o movimento da Lua em relação ao observatório espacial”.

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Por essas condições, o Hubble raramente é apontado para a Lua. De fato, esta é a primeira vez que um eclipse lunar total foi capturado por um telescópio espacial, além de ser a primeira vez que esse tipo de eclipse foi estudado em comprimentos de onda ultravioleta.

“Esta investigação destaca claramente os benefícios da espectroscopia ultravioleta na caracterização de exoplanetas. Também demonstra a importância de testar ideias e metodologias inovadoras com o único planeta habitável que conhecemos até o momento!”, comemora o membro da equipe Antonio Garcia Muñoz, professor da Universidade Técnica de Berlim, na Alemanha.

A pesquisa foi publicada na revista científica The Astronomical Journal, nessa quinta-feira, 6 de agosto.  Assista ao vídeo do Hubblecast, com legendas em Português, sobre o que se pode aprender por meio dos trânsitos de exoplanetas: