Divisa CE/PE: pesquisadores da Assembleia iniciam estudo que visitará 99 localidades

Localidades na divisa entre Ceará e Pernambuco compõem região que vive impasse sobre as delimitações do que é de cada estado. Áreas não estão em litígio e os trabalhos são feitos em colaboração com o estado vizinho

10:45 | Ago. 18, 2025

Por: Júlia Duarte
Área na divisa entre CE e PE passará por estudos para solução amigável (foto: Candice Ballester/Iphan/DIVULGAÇÃO)

Os pesquisadores da Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) começam a visitar, nesta semana, 99 localidades na divisa entre Ceará e Pernambuco, em regiões que vivem impasse sobre as delimitações do que é cearense e o que é pernambucano. Reportagem do O POVO mostrou com detalhes a origem dos questionamentos e o desenrolar até esta etapa.

As áreas não estão em litígio ou em disputa, como acontece no caso entre o Ceará e o Piauí, e os trabalhos são feitos em colaboração com o estado vizinho. Com o eventual entendimento, a expectativa é de que se convertam em lei os pontos que definirão a divisa. A intenção é que apenas se adequem as linhas para manter o que já se encontra na realidade. Se existem escolas, postos de saúde que, historicamente, são ligados a um estado, a administração irá permanecer com aquele estado.

Diante da indefinição das linhas da divisa, estudos tem sido conduzidos para identificar o real posicionamento das delimitações, levando em consideração a administração histórica dos entes federativos e o sentimento de pertencimento das comunidades. 

Algumas informações técnicas já foram levantadas pelo Comitê de Estudos de Limites e Divisas Territoriais do Ceará (Celditec), vinculado à Alece. Os dados têm sido revisados com a entrada dos novos prefeitos para saber o que de fato existe e quais equipamentos são administrados nas áreas da divisa.

“A nossa preocupação é identificar os equipamentos públicos estaduais e municipais, quem os instalou e quem os mantém, comércios, igrejas, casas de farinhas e conversarmos com as comunidades para saber como elas se identificam, se cearenses ou pernambucanos”, explicou ao O POVO o coordenador do Comitê de Estudos de Limites e Divisas Territoriais do Ceará, Luiz Carlos Mourão.

A previsão é de que as equipes passem cerca de 15 dias em deslocamento pelas regiões, mas, pela extensão, há a possibilidade de novas visitas. “Queremos identificar, na divisa, até que áreas o Ceará administra e a partir de onde começa a administração de Pernambuco”, ressaltou.

Veja as regiões que serão visitadas

Limites entre:

  • Salitre com Araripina e Ipubi;
  • Araripe com Ipubi e Bodocó;
  • Santana do Cariri com Exu;
  • Crato com Exu e Moreilândia;
  • Jardim com Moreilândia e Serrita

Origem da dúvida

O imbróglio começou bem longe da Capital, onde é localizada a sede da Assembleia, de onde os pesquisadores vão partir. A 572,70 quilômetros de Fortaleza, parte dos moradores de Salitre vivem com a dúvida de saber onde moram. São pelo menos 15 anos com o questionamento, pois se identificam como cearenses, mas oficialmente estão em Pernambuco. A região leva o nome das famílias que moram na área, como Serra dos Nogueiras, dos Afonsos, dos Carlos, dos Gaudêncios, dos Felisminos e outros.

O então prefeito de Salitre, Dodó de Neoclides (PSB), na época da eleição presidencial, em 2022, recebeu a informação de que seções eleitorais dessa área seriam retiradas e deixariam de funcionar. Foi o estopim para tentar encontrar uma solução.

Dodó entrou com processo judicial na Justiça Federal (JFCE) reivindicando mudanças nas linhas e no entendimento de onde pertenceriam os moradores. Além dos equipamentos feitos por Salitre ficarem na conta de outro estado, o município também seria prejudicado em questões econômicas.

As áreas agregam grande parte da agricultura local, baseada no cultivo de mandioca. Além disso, o tamanho da população é critério de distribuição de recursos de transferências. Em dezembro de 2024, o magistrado Fabricio de Lima Borges se manifestou após ser noticiando, nos autos, a possível resolução extrajudicial da questão. Ele determinou a suspensão do feito por um ano. E é neste ponto que entraram as Assembleias estaduais.

Mudanças

Estudo do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece) confirmou ajustes na malha cartográfica utilizada pelo IBGE. Entre o Censo Demográfico de 2000 e a Contagem Populacional de 2007, houve alterações na representação cartográfica da divisa entre Ceará e Pernambuco.

Conforme o estudo do Ipece, a área territorial impactada pela alteração nas divisas censitárias foi de aproximadamente 773 km², sendo 429 km² em Pernambuco e 344 km² no Ceará. E não foi apenas em Salitre, mas em outros cinco municípios cearenses e seis município de Pernambuco.

O estudo apontou a existência de escolas do Ceará fora do limite estadual após a realização da mudança da divisa entre os anos de 2000 e 2007, especificamente no município de Salitre. O mesmo acontece com equipamentos de saúde. Foram mapeadas 28 localidades no trecho da divisa, todas vinculadas até aquele momento como sendo do Estado do Ceará. Do total, 21 passaram para Pernambuco no mapa do IBGE quando houve a alteração da divisa.

Assembleias

No Ceará, os trâmites começaram ainda na gestão de Evandro Leitão (PT) e, agora, segue no mandato de Romeu Aldigueri (PSB). Em vídeo na última semana, o presidente da Casa ressaltou o desejo de considerar o sentimento de pertencimento da população.

“Contem com a Assembleia Legislativa, contem com o trabalho do Parlamento cearense na defesa dos nossos interesses, dos nossos limites geográficos, do sentimento de pertencimento da cearensidade, do povo de Salitre. E nós estamos agora semana que vem determinando o envio de uma equipe técnica chefiada e coordenada pelo Dr. Mourão, que estará na região fazendo um trabalho”, destacou.

No registro, esteve também o presidente da Câmara de Salitre, vereador Silvio Pinto (PSB). “Salitre é o município que vai mais perder essas áreas, mas já nessa gestão do Dr. Romeu, deu o pontapé, logo iniciou, e a gente já está com a autorização do Dr. Mourão para concluir esse trabalho”, apontou.