Emanuel Freitas: O Brasil preso ao ontem

11:32 | Mar. 10, 2021

Emanuel Freitas da Silva, professor adjunto de Teoria Política (Uece/Facedi), professor permanente do programa pós-graduação em Políticas Públicas (Uece) e professor permanente do programa de pós-graduação em Sociologia (Uece) (foto: Acervo pessoal)

Passados cinco anos, o STF reconhece, por meio do ministro Edson Fachin, a incompetência do ex-juiz Sergio Moro nos processos que dizem respeito ao ex-presidente Lula e as possíveis relações com a Petrobras. Em uma canetada só, o ministro, lavajatista, resolveu anular as condenações do petista, tornando-o elegível (ao menos por enquanto) e transferindo os processos para a comarca de Brasília.

Lula, até o momento em que escrevo esse texto, resguardou-se de comemorações efusivas, apesar de nomes importantes de seu círculo, como a deputada Gleisi Hoffman, ter publicado em suas redes sociais uma singela comemoração com uma justiça feita cinco anos depois.

Supostos candidatos ao pleito de 2022, que se autonomeiam como “de centro”, lamentaram o ato de Fachin por “reanimar a polarização”. Embora alguns destes, como Ciro Gomes, tenham alertado para o fato como “justiça” aplicada a Lula, alguns, como os tucanos Dória e Leite, fizeram menção à polarização, a mesma em que eles estiveram presentes, juntos com o PT, desde 1994 (polarização ruim é a dos outros, não?).

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O fato, inegavelmente, deu fôlego às pretensões eleitorais de Lula, que ainda acumula um considerável capital político. Tem um legado político incontornável, e seu partido esteve presente entre os dois primeiros colocados em todas as eleições presidenciais desde 1989. E, também, incrementou ainda mais a narrativa alicerçada em fatos da suspeição de Moro, que agora observa, silenciosamente, a corrosão de seu (suposto) capital político.

Mas, o que me parece mais destacável a partir do caso é a observação do como o Brasil tende a ficar preso a um passado, embora recente, de fatos não-resolvidos no seu devido tempo, por escolha política na maioria das vezes.

Não tendo resolvido os problemas postos pelos protestos de 2013, chegamos a uma eleição de 2014 que daria o pontapé inicial dos radicalismos; a eleição de 2014, cujo resultado não foi aceito pelo perdedor Aécio Neves, arrastou-se por todo o ano de 2015, culminou com o impedimento de Dilma mas só se encerrou com a eleição de 2018; a questão da prisão em segunda instância arrastou-se de 2016, quando o PEN fez a arguição ao STF, até novembro de 2019; a suspeição de Moro, questionada em 2016, só agora entra em juízo.

Assim, o Brasil se arrasta em sua “história lenta”, como nos falou o mestre José de Souza Martins ainda nos anos 1990. Para tal lentidão, o Poder Judiciário dá sua contribuição ímpar, auxiliado pelo Legislativo, que acumula projetos de interesse nacional aos montes nas papeladas do Congresso. Jair Bolsonaro não poderia ficar de fora e ainda preso permanece ao palanque em que não compareceu em 2018, e comporta-se como candidato e nada mais que isso.

Cabe a Lula gozar, agora, do direito que tinha assegurado ainda em 2016, e não ver Moro meter-se, incompetentemente, em processos que não deveriam ser por ele julgados. O alívio do ex-presidente chega tarde, cinco anos depois, e com mais de 500 dias de encarceramento. Será salutar que Ciro desprenda-se de 2018, livre-se de seu ressentimento parisiense, ponha seu bloco na rua; e que Dória ou outro tucano finque-se como opção nacional já hoje, não importando a “polarização” de 2018.

A estes e a outros possíveis candidatos é necessário dizer: cabe somente a eles “tirar o país da polarização”; ou melhor, cabe somente a eles fazerem-se presentes à polarização de 2022, pois se nem lá chegarem a incompetência será tão somente devida a eles mesmos.