Psol não descarta hipótese de crime político em morte de vereadora

"Ela já vinha denunciando diversos abusos e atrocidades", diz Ailton Lopes, presidente estadual do Psol. Socióloga e professora da Uece citou o impeachment de Dilma como pretexto da elite brasileira para modificar a maneira de enfrentar os problemas. "A primeira coisa é a criação de inimigos externos para justificar um extermínio"

21:31 | Mar. 15, 2018

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O Partido Socialismo e Liberdade (Psol) manifestou pesar diante da morte da vereadora carioca Marielle Franco e do motorista Anderson Pedro Gomes. Em nota, o Psol afirmou que não descarta a hipótese de crime político devido às denúncias que a vereadora vinha fazendo nos últimos dias.

"Não podemos descartar a hipótese de crime político, ou seja, uma execução. Marielle tinha acabado de denunciar a ação brutal e truculenta da PM na região do Irajá, na comunidade de Acari", diz o texto do partido.

"Além disso, as características do crime com um carro emparelhando com o veículo onde estava a vereadora, efetuando muitos disparos e fugindo em seguida reforçam essa possibilidade. Por isso, exigimos apuração imediata e rigorosa desse crime hediondo. Não nos calaremos", continua.

[SAIBAMAIS]

Marielle vinha denunciando publicamente a violência policial no Rio de Janeiro e a intervenção federal. "Mais um homicídio de um jovem que pode estar entrando para a conta da PM. Matheus Melo estava saindo da igreja. Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?", escreveu à época no Twitter. O comentário fazia referência à morte de Matheus Melo, um jovem da periferia que foi morto na favela do Jacarezinho ao sair de uma igreja.

A denúncia que mais chamou atenção nas redes sociais foi ao 41° Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro, que ela chamou de "Batalhão da morte". "O que está acontecendo agora em Acari é um absurdo e acontece desde sempre. O 41° Batalhão da PM é conhecido como Batalhão da morte. Chega de esculachar a população. Chega de matarem nossos jovens", havia publicado a vereadora.

De acordo com um ranking publicado pelo jornal Folha de S.Paulo, o Batalhão denunciado por Marielle é o que mais mata no Rio de Janeiro. Foram 567 mortes atribuídas ao Batalhão entre 2011 e 2018, conforme cálculo baseado em informações do Instituto de Segurança Pública do Estado. Ainda conforme o jornal, de todas as mortes violentas na região que o Batalhão opera, 41% foram de autoria dos policiais do 41º BPM.

"Uma mulher negra, de luta"

A socióloga e professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Mônica Dias Martins, diz que ficou "chocada" com a morte da vereadora. "A gente tinha apresentado na manhã de ontem (quarta-feira, 14) na universidade um trabalho que fala da nova face da ditadura militar no Brasil e o fato só constatou essa avaliação", afirmou.

"Me parece que o golpe de 2016, o impeachment de Dilma, foi um pretexto da elite brasileira para modificar nossa maneira de enfrentar os problemas", avalia. "A primeira coisa é a criação de inimigos externos para justificar um extermínio, a exemplo de Marielle e de tantos outros jovens negros, moradores de favelas, militantes sociais".

"A morte da Marielle me deixa profundamente triste. Uma mulher negra, de luta, combativa, que tive o prazer de ouvi-la e muito me impressinou a juventude dela e o espirito", continua a socióloga. "Ela veio da Maré, uma favela, sem a menor condição e conseguiu se formar na PUC, uma faculdade de elite".

Presidente do Psol no Ceará, Ailton Lopes disse que o crime "deixou todos arrasados". "Não é só com a Marielle. Ela já vinha denunciando diversos abusos e atrocidades nesse momento que a gente tá vivendo", afirmou. "Essa intervenção, a gente percebe que não tem planejamento, não resolve nada".

Relação com Freixo

O deputado estadual Marcelo Freixo (Psol-RJ), que também é presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, se encontrou com o chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, nesta manhã. Ele afirmou que o posicionamento crítico contra a Polícia não a impedia de manter diálogo com as forças de segurança.

"Quem matou a Marielle tentou matar a possibilidade de uma mulher negra, que nasceu na Favela da Maré, que era feminista, estar na política. É um crime contra a democracia", declarou. Freixo era próximo da vereadora. Ela foi assessora parlamentar dele antes de ser eleita com 46,5 mil votos, em 2016. No encontro com Barbosa, Freixo disse que a família de Marielle não tinha nenhuma informação de que a vereadora tenha recebido ameaças.

"A resposta virá. Quem matou achando que ia calar a Marielle, transformou a Marielle em um símbolo que vai fazer com que muitas Marielles brotem nas praças públicas a partir de hoje. Isso não vai ficar impune e não vai ficar em silêncio", afirmou Freixo.

ONU cobra investigação

O Sistema das Nações Unidas no Brasil (ONU Brasil) e organizações interncaionais de direitos humanos cobraram, por meio de nota, apuração do caso. A ONU Brasil afirmou que "tem expectativa de rigor na investigação do caso e breve elucidação dos fatos pelas autoridades, aguardando a responsabilização da autoria do crime".

Outros deputados de vários países homenagearam a vereadora em plenária do Parlamento Europeu em Estrasburgo. %u200BO deputado Miguel %u200BUrban (Podemos, Espanha) destacou a atuação da parlamentar em defesa dos direitos humanos e das mulheres.

Já o movimento feminista Por Todas Nós, de Portugal anuncia por meio das redes sociais que fará uma vigília para homenagear Marielle Franco no próximo dia 19 de março, na Praça da Figueira, em Lisboa.

Em nota, a Presidência da República afirmou que "o governo federal acompanhará toda a apuração do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista que a acompanhava na noite desta quarta-feira, no Rio de Janeiro".

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção Rio, Felipe Santa Cruz, contatou a chefia da Polícia Civil para cobrar apuração do crime. "A OAB/RJ não vai descansar enquanto os culpados não forem devidamente punidos. Os tiros contra uma parlamentar eleita e em pleno cumprimento do mandato atingem o próprio Estado Democrático de Direito", afirmou.

O Instituto dos Advogados Brasileiros também repudiou o crime: "Manifestamos profunda preocupação com a ousadia demonstrada por grupos criminosos, que empregam métodos semelhantes aos utilizados pela repressão no período da ditadura militar”, disse , também em nota.