Equipe médica ucraniana tenta superar trauma em retiro nas montanhas
08:56 | Dez. 30, 2025
Roma Zukh, membro da equipe médica do exército ucraniano, aprendeu uma lição amarga após quase quatro anos da invasão russa: não se apegue demais aos seus colegas, pois eles podem morrer a qualquer momento.
Este ex-caminhoneiro de 37 anos, de olhos azuis e barba ruiva, perdeu muitos amigos.
"Você se lembra de cada um deles... daqueles com quem foi ferido, daqueles que se alistaram na mesma época... e daqueles que você jamais esquecerá", disse ele à AFP.
Para evitar mais traumas, Roma agora tenta manter distância após ter se juntado recentemente a um novo batalhão. "Por exemplo, não me sento à mesma mesa para almoçar", conta.
O alto custo da guerra é uma dura realidade diária para as centenas de profissionais de saúde ucranianos, cuja saúde mental é profundamente afetada pelas cenas, sons e cheiros da linha de frente.
- Retiro nos Cárpatos -
A mais de 1.000 quilômetros do campo de batalha, durante uma pausa de 10 dias nas montanhas para ajudá-lo a se recuperar das experiências vividas, Roma colocou sua regra de ouro à prova.
Alojado em uma cabana de madeira nos Montes Cárpatos, no oeste da Ucrânia, o programa RePower assemelha-se a um acampamento de verão infantil, com aulas de cerâmica, excursões e inclusive oficinas de culinária japonesa.
Para alguns, o alívio foi imediato.
Assim que o veículo que transportava Dmitro Kunytskiy começou a subir a montanha, o jovem de 20 anos foi tomado por uma sensação que há muito havia esquecido.
"Abrimos as janelas e o ar se encheu com o aroma dos pinheiros. Estávamos muito felizes, como crianças", contou à AFP.
Mesmo assim, deixar a linha de frente para trás não é fácil. Dmitro está frequentemente ao telefone, delegando tarefas à sua equipe que permaneceu no campo de batalha.
Nos últimos dois anos, ele ocupou um cargo que exige que recupere e examine os corpos de seus camaradas mortos em combate.
"Tenho flashbacks. O cheiro de sangue... você não consegue se lavar imediatamente, e a cada respiração você sente o cheiro de sangue", diz ele.
"Mas as mortes, os cheiros. Não é nada comparado à perda de tantos amigos", acrescenta, com os olhos vermelhos.
Os psicólogos que trabalham no acampamento reconhecem que enfrentam casos difíceis. E todos eles retornarão em breve à frente de batalha, o que complica qualquer terapia aprofundada.
"Precisamos de tempo para estabilizar as pessoas. É algo novo: trabalhar o trauma enquanto as condições traumáticas ainda estão presentes", explica o doutor Andrii Anpleiev.
Por isso, precisam recorrer a métodos criativos.
Por exemplo, em uma experiência de "cura sonora", uma dúzia de pessoas deita-se em colchonetes de ioga, relaxando ao som das ondas quebrando na praia e de florestas repletas de pássaros cantando.
Após as sessões noturnas com um psicólogo, eles jantam em um restaurante local decorado com pinturas de montanhas e cordões de luzes.
Em poucos dias, o grupo criou laços e um grupo no WhatsApp para se manterem em contato quando retornarem à frente de batalha. Roma também prometeu manter contato, embora não consiga se livrar da preocupação. "Como não vou me preocupar com eles? Claro que me preocupo, mas eles se sairão bem. Espero", afirma.
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